Responda rápido: o que Norah Jones, Billie Joe Armstrong, Pearl Jam e Elton John tem em comum?
Em princípio, nada.
No entanto, todos esses artistas lançaram discos mais ou menos na mesma época -- meados do Outono no Hemisfério Norte --, provavelmente torcendo para que virem presentes de Natal -- e isso, com certeza, indica que são artistas com públicos assemelhados.
O caso é que, após toda a crise que assolou a Indústria Fonográfica nos últimos 10 ou 15 anos, algumas lições os executivos da música aprenderam. Por exemplo: nunca menosprezar o poder de fogo de um artista com público cativo, mesmo que esse artista insista muito em lançar um "produto" meio fora dos padrões da Indústria.
É (mais ou menos) o caso de todos os mencionados acima.
Um disco de Norah Jones voltado para os fãs dos Everly Brothers não é uma aposta fácil, nem mesmo para os ecléticos admiradores dela -- e menos ainda para os fãs do Green Day de Billie Joe Armstrong.
O mesmo vale para um cd de Elton John com vários temas instrumentais e sem um single grudento tocando o dia inteiro nas emissoras de rádio para puxar as vendas.
E quem conhece o Pearl Jam sabe que há muitos anos a banda exige de sua gravadora liberdade criativa total, e não aceita fazer concessões nesse sentido, grava o que quer e pronto..
Quinze anos atrás, talvez esses artistas tivessem "projetos fora do padrão" -- como esses que acabam de lançar no mercado -- arquivados por suas gravadoras, sob a alegação de que seriam investimentos muito arriscados e que provavelmente não dariam retorno.
Mas hoje, depois dessas mesmas gravadoras terem finalmente sentido a água bater em suas nádegas, elas não fazem mais isso.
Ao contrário: hoje elas agradecem aos céus por esses artistas veteranos -- que dispensam apresentações e maiores esforços de divulgação -- existirem, e ainda seguirem gravando e abastecendo o mercado com seus novos "produtos".
NORAH JONES E BILLIE LEE ARMSTRONG
FOREVERLY
Reprise (Warner Brasil)
Discos tributo a LPs clássicos raramente resultam em projetos bem resolvidos. Na maioria das vezes, acabam virando homenagens duvidosas envolvendo vários artistas -- vide o que aconteceu com os tributos a "Tapestry" de Carole King e "Rumours" do Fleetwood Mac, para citar apenas dois exemplos. Até por isso, quando a graciosa Norah Jones e o áspero Billie Joe Armstrong decidiram refazer faixa a faixa o clássico LP dos Everly Brothers "Songs Our Daddy Taught Us", de 1958, não chamaram ninguém para dividir a cena com eles, com receio de que o espírito da homenagem se diluísse numa super produção. Fizeram tudo sozinhos, em poucos dias, bem "low profile", para tentar resgatar o mesmo clima intimista que os irmãos Phil e Don Everly conseguiram imprimir na gravação do disco original. Claro que os dois cometem algumas ousadias aqui e acolá, até porque a idéia por trás de "Foreverly", o nome do disco, é não permitir que a homenagem seja reverente demais. São 12 canções tradicionais americanas que Norah e Billie Joe cantam em uníssono à moda dos Everlys. Os arranjos são discretos e delicados, e não seguem o mesmo padrão de instrumentação do LP original, como pode-se perceber em "Oh So Many Years" e "I’m Just Here to Get My Baby Out of Jail". Mas o mais legal de tudo é que tanto Phil Everly quanto Don Everly estão bem vivos -- ainda que meio aposentados, com 75 anos de idade. E homenagem legal é aquela que se recebe em vida.
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PEARL JAM
LIGHTNING BOLT
Monkeywrench-Virgin (Universal Brasil)
Recentemente, uma reportagem da BBC apresentava o Pearl Jam como um novo Grateful Dead, por ter conseguido em 22 anos de carreira imprimir uma marca musical muito forte num repertório extremamente variado em performances ao vivo nunca menos que espetaculares. Realmente, é meio difícil reconhecer no Pearl Jam de hoje aquela banda truculenta de Seattle que virou ícone da cena grunge em seus dois primeiros discos, do início dos anos 1990, e que lutou arduamente para que seus discos seguintes conseguissem sobreviver àquele modismo. Tanto que depois de dois discos quase experimentais -- "Vitalogy" e "No Code" -- o Pearl Jam deixou tanto a fúria quanto a latargia um pouco de lado e mergulhou de cabeça no Mainstream do Rock Americano -- só que com uma atitude bem aventuresca, em que toda e qualquer proposta musical se justifica contanto que não sirva apenas aos discos, mas principalmente aos palcos. Prova disso é que, de "Yield" (1998) para cá, a música do Pearl Jam ganhou uma organicidade que não tinha antes. Maturidade musical? Tesão de Palco? Sintonia fina entre companheiros de banda? Todos esses fatores certaamente contribuíram para a sedimentação do estilo musical da banda. "Lightning Bolt" é o 10º disco de estúdio deles, e quem se der ao trabalho de ouvir vai descobrir um Pearl Jam cada vez mais plural em termos musicais, em composições sempre grudentas e arranjos vigorosos. E fiquem tranquilos quanto ao ukelele de Eddie Vedder: dessa vez ele ficou em casa. Eddie comparece apenas tocando guitarra, piano e soltando a voz. E que voz....! E que banda....!
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ELTON JOHN
THE DIVING BOARD
Capitol (Universal Brasil)
Desde "Songs From The West Coast" (2002), Elton John e Bernie Taupin parecem determinados a resgatar uma atitude que eles cultivavam em seus primeiros trabalhos juntos, quando gravavam álbuns magníficos como "Tumbleweed Connection" e 'Madman Across The Water" sem se preocupar com as paradas de sucessos, que eram supridas por singles desconectados desses LPs. 'Peachtree Road" (2004) e "The Captain & The Kid" (2006), seus discos seguintes, deram sequência a essa tendência vitoriosa em termos artísticos, mas decepcionante (para Elton) em termos comerciais. E então, depois de um projeto em colaboração com Leon Russell, 'The Union", produzido por T-Bone Burnett 3 anos atrás, Elton concluiu que só iria conseguir resgatar o frescor de seu trabalho nos anos 70 de forma plena se resgatasse também a urgência de seu modus operandi de compor e gravar na época, fazendo tudo rapidamente, utilizando poucos músicos, e sem se preocupar em deixar que as canções maturassem antes. "The Diving Board" é o resultado dessa experiência guiada por T-Bone Burnett. São 19 canções, sendo três delas interlúdios instrumentais, metade delas composta ou finalizada em 3 dias em 2012 e a outra metade em outros dois dias no início deste ano. São canções delicadas, vez ou outra auto-confessionais, sempre "no osso", que trazem saídas musicais bem distintas e parecem ter sido criadas para compor um mesmo contexto. Apesar disso, não dá para dizer que "The Diving Board" seja um disco conceitual. É, isso sim, uma espécie de prova de fogo pessoal. Elton John precisa, a essa altura da vida, achar razões para continuar produzindo discos novos -- até porque ele poderia viver tranquilamente fazendo tournées só com seu repertório clássico. Quer fazer isso da maneira menos complicada possível. Sob esse aspecto, "The Diving Board" é um triunfo. Mas eu, pessoalmente, acho que fica um pouco aquém dos 3 belos álbuns que ele compôs com seu parceiro Bernie na primeira década desse novo século.
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