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domingo, março 08, 2020

CHICO MARQUES COMENTA EM ALTO&CLARO 3 ÓTIMOS DISCOS QUE ACABAM DE CHEGAR ÀS LOJAS (FÍSICAS OU VIRTUAIS)



Robert Cray Band
That’s What I Heard
(Nozzle 2020)

Já se vão 40 anos desde que Robert Cray estreou com "Who's Been Talkin'", e arrancou os cabelos em desespero ao ver sua gravadora Tomato Records quebrar financeiramente na semana em que seu LP chegava às lojas. Parecia um péssimo presságio para uma carreira recém-iniciada. Mas Mr. Cray insistiu com seu blend de Memphis Soul e West Coast Blues em uma série de LPs impecáveis para a Hightone Records, sempre combinando um timbre vocal que evocava Sam Cooke e Al Green com o ataque de Magic Sam e o groove de Grant Green na guitarra. E foi assim até emplacar mundialmente, em 1986, o single "Smokin' Gun", tirado do LP "Strong Persuader", que o lançou para o estrelato. Estrelato que, diga-se de passagem, durou apenas dois ou três anos. Mas Mr. Cray soube aproveitá-lo, mantendo um low profile mesmo nos tempos das vacas gordas, e depois disso passou a administar sua carreira fonográfica através de produções independentes em gravadoras pequenas, fugindo de fórmulas de sucesso fácil, mas sempre mantendo-se fiel ao blend musical personalíssimo que esboçara ao longo dos anos. "That's What I Heard", seu mais novo trabalho, produzido por seu parceiro de longa data Steve Jordan, é mais um passo na aprimoração desse blend musical, mais um mergulho fundo no "lado soul do blues", que mais uma vez passa longe do blues rock cheio de excessos de Buddy Guy, Johnny Winter e Stevie Ray Vaughan. Aqui, ao mesclar originais poderosos com covers fulminantes de Kim Wilson e Tony Joe White (entre outros), Mr. Cray se revela, curiosamente, tanto aquém do seu tempo quanto além do seu tempo, pois sua música, irremediavelmente atemporal, pode apontar tanto pra frente quanto pra trás, depende do momento. Ao ouvinte mais apressado, pode parecer que Mr. Cray vem gravando o mesmo disco há 40 anos. Mas ouvintes mais atentos não tem a menor dúvida de que o "body of work" de Robert Cray só cresce e ganha vulto a cada novo disco. "That's What I Heard" pode não ser um disco obrigatório, caso você já tenha em casa outros LPs de Mr. Cray. Mas... E daí? Já que Robert Cray nunca peca pelo excesso, então peque você.



James Taylor
American Standard
(Fantasy 2020)

Tenho visto pela web um monte de saudosistas estranhando esse novo trabalho de James Taylor. Bobagem. Não há o que estranhar. Desde o início de sua carreira, no final dos Anos 60, Mr. Taylor nunca escondeu que, apesar de seu jeitão folkie e de sua serenidade pop, tudo o que ele sempre quis ser quando crescesse é o grande cantor, pianista, compositor e também ator Hoagy Carmichael. Para quem não sabe quem é Mr. CarmichaeI, talvez baste dizer que é o autor de canções magníficas como "Stardust", "Georgia On My Mind", "Skylark" e "Get Along Without You Very Well", entre muitos outros sucessos dos Anos 30, 40 e 50. Pode ser visto cantando e tocando piano em muitos filmes, como, por exemplo, "Uma Aventura na Martinica" (1943), com Humphrey Bogart e Lauren Bacall, e foi uma figura marcante em shows de TV nos Anos 50 e 60. Muito provavelmente, foi o primeiro singer-songwriter da história da música popular americana, e gravou muitos discos como artista solo, às vezes cantando canções de outros compositores. Como faz Mr. Taylor aqui nesse "American Standard". Das 14 canções do Great American Songbook que ele escolheu para compor este LP, apenas uma é autoria de seu mestre Hoagy Carmichael: "The Nearness Of You". As outras 13 são canções bastante conhecidas, como "Moon River" (de Henry Mancini e Johnny Mercer), "Teach Me Tonight" (de Sammy Cahn & Gene DePaul), "God Bless The Child" (de Billie Holiday & Arthur Herzog Jr), "Old Man River" (de Jerome Kern & Oscar Hammerstein) e "It's Only A Paper Moon" (de Harold Arlen). Todas elas recebem de Mr. Taylor arranjos delicados e vocalizações deliciosas, e se transformam imediatamente em "canções de James Taylor". Personalidade musical forte é isso aí. Só nos resta torcer para que seja um sucesso de vendas, e que ele nos presenteie com outros "American Standards" nos próximos anos.  




Charles Lloyd 8
Kindred Spirits Live at The Lobero
(Blue Note 2020)

Charles Lloyd jamais seguiu cartilha alguma em seus mais de 60 anos de carreira musical. É um verdadeiro original americano. O único dos grandes saxofonistas tenor da história do jazz que também toca flauta brilhantemente -- o que é muito estranho, pois as embocaduras dos dois instrumentos são extremamente diferentes. Um dos poucos artistas de jazz da sua geração com formação universitária em música clássica. Apesar de ter surgido na cena do free-jazz contracenando com Ornette Coleman e Eric Dolphy, sempre foi fascinado pelo Rhythm And Blues dos artistas de sua Memphis natal e não sossegou enquanto não trocou o meio do jazz pelo dos roqueiros psicodélicos de Los Angeles e San Francisco, desenvolvendo fusões de jazz com rock, pop e música oriental jamais sonhadas por Miles Davis e seus seguidores. Seus mais recente trabalho, "8: Kindred Spirits (Live At The Lobero)" é mais uma demonstração brilhante do conceito de música sem fronteiras que ele sempre perseguiu. Gravado ao vivo no aniversário de 150 anos do Lobero Theatre, em Santa Barbara, California, traz Mr. Lloyd em grande forma aos 80 anos de idade à frente de um quinteto sensacional no primeiro set, e no segundo set acompanhado por Booker T Jones ao piano e Don Was no contrabaixo. São quatro temas bem distintos -- três deles bem conhecidos de seu público. O primeiro é "Dreamweaver", releitura de um número clássico de meados dos Anos 60, que passeia por sonoridades do mundo inteiro de forma delicada e pacífica ao longo de seus 21 minutos de duração. Quando se recobrar de "Dreamweaver", prepare-se para "Requiem", outra revisão para um número clássico de seu repertório, uma viagem musical pelo útero da civilização com ecos musicais do Grateful Dead, numa jam quase caótica, mas de uma beleza extrema. A seguir, em "La Llorona", temos uma inusitada canção mexicana que abre alas para uma improvisação barroca adorável. E tudo termina com "Part 5 Ruminations", outra jam magnífica, bastante longa (17 minutos) onde Mr. Lloyd mais uma vez nos leva para dimensões musicais absolutamente encantadoras, onde ecos de várias canções muito conhecidas se entrelaçam -- entre elas, "Green Onions", clássico de Booker T Jones. Fãs de longa data de Mr. Lloyd vão cair em êxtase com essa performance contundente desses músicos soberbos. Se você nunca ouviu Charles Lloyd antes, e não sabe por onde começar, recomendo este álbum duplo. Tem também em DVD.


Chico Marques é um iconoclasta
desde a mais tenra idade.
Nascido em Santos em 1960,
estudou Literatura Inglesa
na Universidade de Brasília,
atuou como publicitário
e foi produtor musical
em emissoras de rádio e TV.
Vive na Polinésia Francesa,
onde trabalha como editor
de THE BORA BORA REVIEW
e ALTO&CLARO.

terça-feira, maio 12, 2015

PREPAREM SEUS CORAÇÕES: J. D. SOUTHER, O PRÍNCIPE DA CALIFÓRNIA, ESTÁ DE VOLTA.

John David Souther é um príncipe da cena do bittersweet country rock californiano.

Nunca teve a projeção de seus amigos Jackson Browne e James Taylor. Não quis permanecer coadjuvante de Linda Ronstadt, sua ex-namorada e melhor intérprete, com quem gravou duetos lindíssimos. Podia ter sido um dos Eagles, mas permaneceu aguardando seu momento, que quase chegou em 1972. E quase chegou novamente em 1974. E quase chegou em 1978 e 1984, até que, endividado com gravadoras, ele cansou, e seguiu por outros caminhos.

Sumiu do mapa musical pop americano por nada menos que 25 anos.

Voltou oito anos atrás, já sessentão, com um trabalho classudo e jazzificado, totalmente diferente do que fazia antes, onde além de se reinventar como compositor, passou a explorar seu belo timbre vocal de forma ampla e inusitada, deixando no ar a pergunta: 

Será que é dessa vez que a carreira musical de J. D. Souther vai finalmente deslanchar para valer?
A julgar por seu novo disco, "Tenderness" (um lançamento Sony Masterworks), credenciais não faltam para isso.

Dessa vez ele uniu forças ao grande produtor Larry Klein -- parceiro de Joni Mitchell em seus discos derradeiros --, que montou uma banda impecável com Dean Parks (guitarras), David Pilch (baixo), Jay Bellerose (bateria), Patrick Warren (teclados) e Till Bronner (trompete) para por a prova os arranjos que preparou para as novas canções de Mr. Souther.

Canções ótimas, diga-se de passagem. Algumas com um sotaque mais jazzístico, outras com um sotaque mais folk, outras mais pop -- gêneros musicais pelos quais ele trafega tranquila e delicadamente desde sempre.

O conceito do "Tenderness", que batiza o disco, vem da canção "Dance Real Slow", uma balada lindíssima, de partir o coração. 

Igualmente linda é "This House", só que ainda mais intimista, e mais em sintonia com o trabalho que ele desenvolvia nos anos 1970. 

"Horses In Blue" vai pelo mesmo caminho, e lembra suas inspiradíssimas colaborações com Linda Ronstadt. 

E o que dizer de "Come What May", um número que já nasce com jeitão de stardard para qualquer cantor ou cantora que se habilite?

É bom lembrar que o jazz dá a luz de sua graça em várias faixas do disco. "Downtown (Before The War)" é um número intrincadíssimo, desde a composição ao arranjo. 

E "Show Me What You Mean", num uptempo extremamente perigoso, como o próprio título já indica, traz a voz de Mr. Souther se entrelaçando com uma trama de piano e trompete propositadamente desalinhados, proporcionando resultados sensacionais.

Eu, se tiver que escolher um número favorito, fico com "Need Somebody", uma balada adoravelmente melancólica, que lembra vagamente "The Sad Cafe", dos Eagles -- mas infinitamente superior.
Como eu disse lá atrás, credenciais não faltam a John David Souther para que sua carreira decole afinal, e ele deixe de ser exclusividade de uns poucos que ainda lembram de seu início de carreira nos anos 1970, à frente do Lonesome Pennywhistle e da Souther Hillman Furay Band, e de seus notáveis primeiros discos solo.

Só nos resta torcer para que, aos 69 anos de idade, o tão esperado reconhecimento ao trabalho deste californiano da gema, requintado e talentoso, venha finalmente dessa vez.

"Tenderness" merece a sua atenção. 

Não deixe esse belo disco passar desapercebido em sua vida. 



AMOSTRAS GRÁTIS