quarta-feira, setembro 24, 2014

O GAITISTA PAUL LAMB SE AFIRMA MAIS UMA VEZ COMO UM GRANDE ESTILISTA DO BLUES


Não existe instrumento mais emblemático do blues do que esse aí.

Desde sempre, músicos de blues costumam usar a guitarra acústica para prover a base melódica e percussiva das canções, e então acrescentam a gaita diatônica para dar uma harmonia adicional a essas canções -- não foi à toa que a gaita diatônica acabou ganhando o nome "harmonica".

Poucos artistas de blues usam a gaita cromática, mais complexa que a diatônica, e menos ainda usam a gaita tremolo.

Só mesmo Charlie Musselwhite, Magic Dick, Jerry Portnoy e um ou outro bluesman mais sofisticado as usam.

A harmonica, ao menos em princípio, é um instrumento pouco complexo e de fácil acesso a músicos instintivos e pouco gabaritados.

Mas, mesmo assim, sempre acontece de algum músico mais talentoso começar a explorar potenciais insuspeitos do instrumento e, eventualmente ir onde nenhum outro gaitista jamais esteve.



Paul Lamb é talvez o gaitista mais importante da cena inglesa hoje.

Com 59 anos de idade e uma carreira de quatro décadas, é no mínimo curioso que só agora ele comece a ser descoberto pelos americanos como um grande estilista do blues.

Durante os anos 70 e 80, Lamb cansou de acompanhar músicos americanos de passagem por Londres, ficou amigo deles todos, mas várias dificuldades de mercado o impediam de tentar emplacar um trabalho próprio.

Só no início dos anos 90, a muito custo, ele conseguiu gravar um disco com uma banda chamada The Blues Burgulars -- que, já no disco seguinte, mudaria o nome para The King Snakes.

De lá para cá, Paul Lamb e os King Snakes já gravaram nada menos que 17 discos, sempre mesclando blues, baladas e rock and roll com uma maestria invejável, sempre com seu jeito de cantar bem intenso e sua harmonica personalíssima sempre onipresente.



Esse recém-lançado "Hole In The Wall" (Secret Records) com certeza vai fazer alguns amigos na América na próxima temporada de Festivais, mas é endereçado mesmo ao mercado europeu, que conhece e prestigia o trabalho de Lamb há muitos anos.

É um disco delicioso, talvez o melhor que Paul Lamb gravou até hoje, repleto de truques que vão deixar gaitistas experientes com a pulga atrás da orelha e se perguntando:

Como é que esse cara consegue fazer isso?



WEBSITE PESSOAL
http://paullamb.com/

DISCOGRAFIA
http://www.allmusic.com/artist/paul-lamb-mn0000749410/discography

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ROD PIAZZA & THE MIGHTY FLYERS: QUASE 50 ANOS FIÉIS AO ESPÍRITO DO WEST COAST BLUES


Rod Piazza é uma das figuras mais emblemáticas da cena do blues da California desde meados dos anos 60.

Desenvolveu um estilo que mescla o som encorpado e meio truculento do Chicago Blues com a suavidade do West Coast Blues -- tudo isso mesclado com toques de jazz bastante incomuns em gaitistas de blues.

Aluno muito aplicado de George 'Harmonica" Smith -- ex-sideman de Muddy Waters, que mudou de Chicago para Los Angeles por não aguentar mais o frio glacial da Capital do Blues --, Rod Piazza acabou virando seu aluno, e depois amigo e parceiro musical.

Primeiro no lendário grupo Bacon Fat -- talvez a única banda com dois gaitistas na história do blues -- que, sob a supervisão do grande produtor Mike Vernon, marcou época na cena do blues da Costa Oeste no final dos Anos 1960.

Depois, em diversas parcerias musicais ao longo dos Anos 1970, ao lado de grandes ícones do blues ainda na ativa

Não desgrudaram um do outro até o início dos anos 80, quando a saúde de Smith começou a falhar.

Piazza cuidou de seu amigo e professor até ele falecer, em 1983.


Foi mais ou menos por aí que Rod Piazza montou os Mighty Flyers com sua mulher, a pianista Honey Piazza, e uma penca de amigos -- entre eles os superguitarristas Kid Ramos e Rick Holstrom.

Com apenas dois discos para a Black Top Records, Rod, Honey e os Mighty Flyers se transformaram rapidamente na banda de blues mais badalada dos nightclubs de Los Angeles, recebendo eventualmente o amigo e fã Bruce Willis como crooner convidado.

De lá para cá, já gravaram quinze discos deliciosos que, se por um lado não trazem grandes novidades, servem para afirmar Rod Piazza cada vez mais como um bom cantor e compositor e um excelente band-leader que sempre consegue extrair performances inspiradíssimas de seus bandmates.



"Emergency Situation", novo disco de Rod Piazza & The Mighty Flyers,, traz duas novidades.

Uma deles é seu retorno ao selo Blind Pig depois de uma longa temporada na Delta Groove Records.

E outra é a frequência com que suas diversas gaitas dividem a cena com os saxofones de Ron Dziubla e Jim Jedekin.

Convenhamos: poucos gaitistas ousam enfrentar um saxofone como receio de levar a pior.

Dois saxofones então... é loucura.

Mas o caso é que estamos falando de Rod Piazza, não de um gaitista qualquer.

Ele é uma fera do West Coast Blues -- um grande craque tanto nas gaitas cromáticas quanto nas gaitas diatônicas, o que não é comum --, e a julgar por "Emergency Call", continua perigosíssimo.

O mesmo pode-se dizer dos implacáveis e rápidos no gatilho The Mighty Flyers, cuja formação atual conta com Honey Piazza (piano & Vocal), Henry Carvajal (guitarra e vocal), Norm Gonzales (baixo acústico) e David Kida (bateria).


A essa altura do campeonato, Rod Piazza já é mais veterano que a maioria de seus ídolos musicais.

São 66 anos de vida -- 48 deles de vida profissional dedicada ao blues

Mesmo assim, alguns puristas do blues ainda insistem em tratá-lo como um jovem artista desvinculado das tradições do blues.

Alguns mais despeitados até o acusam de ter crescido na sombra do prestígio de George Harmonica Smith.

Tudo bobagem.

Basta sentir o sopro forte de qualquer uma de suas gaitas para constatar que Rod Piazza não só é um grande mestre do blues moderno, mas também é, provavelmente, a maior autoridade em seu instrumento em todo o Sul da California.

Não é pouca coisa.








WEBSITE OFICIAL
http://www.themightyflyers.com/index2.htm

DISCOGRAFIA
http://www.allmusic.com/artist/rod-piazza-mn0000293614/discography

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O SUINGUE RASGADO DO WEST COAST BLUES DE RICK ESTRIN & THE NIGHTCATS


Rick Estrin é uma figuraça.

Está à frente dos Nightcats desde 1976.

Compondo, cantando, soprando sua gaita e fazendo o blues mais suingado e bem-humorado da Área da Baía de San Francisco, na California.

Detalhe: a banda se chamou Little Charlie & The Nightcats por 30 anos e 9 álbuns, devido ao grande guitarrista Little Charlie Baty, com quem Estrin dividia o comando da banda.


Sete anos atrás, no entanto, Little Charlie teve um enfarto violento.

Ficou impossibilitado de seguir em frente com a agenda da banda lotada de compromissos o ano inteiro.

Daí, se aposentou.

E passou o bastão para seu parceiro Estrin -- que imediatamente chamou o superguitarrista Kid Andersen para unir forças à banda, e seguiu em frente.

Desde então, Rick Estrin & the Nightcats já gravou dois excelentes discos de estúdio para a Alligator Records.

Tão bons ou melhores que os discos clássicos do Little Charlie & The Nightcats, gravados também para a Alligator.


Agora eles chegam com esse disco ao vivo, "You Asked For It... Live!", que dá a dimensão exata do poder de fogo e do jogo de cintura de Rick Estrin & The Nightcats sempre que sobe num palco.

É blues suingado pra ninguém botar defeito.

Com um pé no Texas, outro em Kansas City e o coração no West Coast Blues.

Para quem nunca teve a chance de vê-los ao vivo em suas apresentações anuais no Bourbon Street, em São Paulo, esse disco serve como consolo.

Já para quem teve a chance de vê-los ao vivo, fica apenas uma ressalva:

Estrin podia ter incluído no setlist deste disco alguns números menos ortodoxos de seus dois últimos trabalhos de estúdio, só para sentir a reação do público.

Em vez disso, preferiu apostar no certo e ir para a galera dando exatamente o que ela quer: o blend habitual de West Coast Blues e Jump Blues, sem surpresas.

O nome do disco entrega a intenção, e não dá para censurá-lo por fazer essa opção.

Na verdade, a idéia aqui em "You Asked For It... Live!" não é outra senão se esbaldar.

E isso Estrin e os rapazes fazem muito, muito bem.








WEBSITE OFICIAL
http://rickestrin.com/

DISCOGRAFIA
http://www.allmusic.com/artist/little-charlie-the-nightcats-mn0000257147/discography
http://www.allmusic.com/artist/rick-estrin-mn0000357622/discography

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terça-feira, setembro 09, 2014

AS AVENTURAS MUSICAIS PELA ESPANHA DO INCANSÁVEL CALIFORNIANO STEVE WYNN


Steve Wynn é um losangeleño da gema, que sempre foi fascinado pelos novaiorquinos do Velvet Underground.

Tanto que, na hora de batizar o que viria a ser a banda de sua vida, ele escolheu o nome de um projeto musical bem antigo do velvet John Cale: The Dream Syndicate.

O nome trouxe sorte, e o Dream Syndicate brilhou forte na cena Paisley Underground -- um pouco mais intensamente que outras bandas contemporâneas em Los Angeles como as Bangles, os Long Ryders, o Rain Parade e o Green On Red.

Entre 1982 e 1989, The Dream Syndicate gravou uma série de discos muito densos e muito festejados na cena alternativa.

Seu disco de estréia, "The Days Of Wine And Roses", já é tido como um clássico, e fez deles uma das bandas influentes dos Anos 80, deixando suas marcas em grupos tão díspares quanto The Black Crowes e The Killers.

Verdade seja dita: desde The Doors uma banda não mergulhava tão fundo no imaginário psicodélico sombrio da cidade.



Mas então, depois de sete LPs muito bons, The Dream Syndicate começou a passar por turbulências internas e dar sinais claros de esgotamento criativo.

E o sempre inquieto e desgarrado Steve Wynn ao invés de esperar pelo pior, dissolveu a banda e partiu logo para uma carreira solo.

Uma carreira solo tão aventuresca em termos musicais quanto bem sucedida comercialmente, diga-se de passagem.

Desde 1990, Steve vem alternando discos solo bem elétricos, à moda de Neil Young, como "Kerosene Man" (1990) e "Dazzling Display" (1992), com trabalhos mais acústicos e reflexivos como "Fluorescent" (1994), sempre surpreendendo e contrariando as expectativas de seu público.

Mas o caso é que Steve Wynn adora fazer parte de bandas e, depois da dissolução do Dream Syndicate, nunca negou fogo sempre foi convidado a participar de alguma.

Tanto que, nesses últimos 25 anos, sempre nas férias de sua carreira solo, já embarcou em 3 bandas diferentes: Gutterball, Miracle 3 e Baseball Project.


Em 2000, durante uma excursão pela Europa ao lado do amigo Paco Loco e da banda Australian Crawl,  Steve acabou indo parar num estúdio de gravação em Andaluzia e gravou um disco ao lado dessa gente toda, chamado "Memento".

Esse disco, curiosamente, permaneceu inédito nos Estados Unidos, assim como um segundo chamado "Smack Dab", que ele e Paco gravaram em 2006 para uma gravadora espanhola.

Pois agora, agora a Omnivorous Records americana decidiu lançar os dois juntos num álbum só, chamado "Sketches Of Spain", e o resultado final é muito interessante.

Talvez por estar longe de casa, e liberto dos compromissos habituais de sua carreira solo, Steve Wynn ficou mais à vontade para fazer experiências musicais bem pouco ortodoxas, colocando sua voz encorpada sobre harmonias pop bem delicadas, só para ver se elas se sustentam em pé com tanto peso em cima delas.

O resultado é extremamente bem resolvido, ousado e divertido.

O caso é que "Sketches Of Spain" não é um disco fácil, e nem é endereçado a qualquer público.

É um trabalho extremamente honesto, concebido na estrada e gravado rapidamente, para que a essência dele não se perdesse numa gravação minuciosa e prolongada demais.

Corre à boca pequena que Steve e Paco acabam de gravar um terceiro disco juntos nos intervalos de sua recente Tournée de Verão pela Europa -- e quem ouviu as gravações afirma que a dobradinha dos dois nunca foi tão bem resolvida quanto agora.



2014 tem sido um ano está bem movimentado para Steve Wynn.

Começou com o lançamento de um belo disco ao vivo, bem folk, com releituras de suas canções favoritas de Bob Dylan.

Agora, chega este ótimos "Sketches Of Spain", e ainda este ano teremos o terceiro disco de Steve ao lado de seus comparsas do Baseball Project.

Como se tudo isso não bastasse, ele está saindo em tournée agora em Setembro com seus velhos comparsas do Dream Syndicate, para a alegria de seus velhos fãs -- e isso deve render, no mínimo, um DVD ao vivo.

Vida de artista independente é assim mesmo, bastante corrida.

Não existe na cena indie aquela manha de artista mainstream que grava um disco a cada três anos, alegando dificuldades para compor, trabalhando pouco.

Artista independente nunca para de fazer tournées, tem que ter disco novo todo ano para estar sempre em voga e ter sempre as portas abertas dos meios de divulgação sem ter que gastar fortunas em assessoria de imprensa e promoção.

Não é uma vida fácil.

Mas para gente inquieta como Steve Wynn é a única vida possível.



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http://stevewynn.net/

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http://www.allmusic.com/artist/steve-wynn-mn0000040969/discography

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segunda-feira, setembro 08, 2014

EM APENAS 4 DIAS, SID GRIFFIN GRAVA UM BELO LP COUNTRY À MODA ANTIGA EM NASHVILLE


Na música de qualquer país, existem sempre aqueles artistas geniais, com uma capacidade criativa enorme, mas que, por algum motivo difícil de explicar, nunca conseguiram emplacar com o grande público.

São artistas que permanecem confortavelmente na cena alternativa por 20, 30, 40 anos amparados por um público cativo para quem gravam discos com material novo de tempos em tempos.

Alguns conseguem conquistar algumas fatias mais jovens de público. Outros não. Mas todos, sem execessão, brigam ano após ano para manter-se ativos e relevantes numa cena sempre em constante renovação.


Quando Sid Griffin apareceu com sua banda seminal The Long Ryders na cena musical da California tocando country-rock com uma atitude punk bem no início dos Anos 80, ninguém podia imaginar que ele iria tão longe, e muito menos que sua carreira tomaria rumos tão tortuosos e interessantes.

Não é nenhum exagero afirmar que ele é o "Pai Fundador" de vários gêneros musicais em voga nos dias de hoje, como "Americana", "Alt-Country" e "Cowpunk", já que eles surgiram das inúmeras tentativas do pessoal da Billboard em tentar rotular seus discos e suas bandas.

Curiosamente, os americanos nunca souberam valorizar The Long Ryders como eles mereciam -- ao contrário dos ingleses e australianos, que empatizaram com a banda logo de imediato.


No início dos Anos 90, os Long Ryders encerraram atividades e Griffin montou uma nova banda, mais acústica, chamada The Coal Porters, que emplacou logo de cara um disco muito divertido que alcançou prestígio mundial: "Land Of Hope And Crosby".

Cansado da indiferença do mercado americano ao seu trabalho, Sid Griffin mudou de mala e cuia para Londres 20 anos atrás, e volta à América muito de vez em quando, sempre para fazer shows com os Coal Porters -- que permanecem ativos até hoje, gravando discos a cada dois anos.

Hoje, está casado com Kate St. John do grupo Dream Academy, tem sua própria gravadora, Prima Records, e trabalha como pesquisador musical, tendo escrito vários livros sobre música country, folk e celta -- inclusive dois muito festejados sobre Bob Dylan e outro, mais festejado ainda, sobre seu grande herói musical Gram Parsons.



Esse novo disco, "The Trick Is To Breathe", é o primeiro solo que ele grava em 9 anos, e foi gravado em Nashville com músicos de lá, em apenas 4 dias, com produção de Thomm Jutz -- que acertou todo o meio de campo com os músicos antes de Sid desembarcar na América e colocar voz, guitarra e mandolin nas 12 faixas.

Griffin comenta que, pela primeira vez em sua carreira, não quis se envolver na produção, nem nos arranjos do disco, colocando-se inteiramente nas mãos de terceiros, como se fosse um crooner -- daí mesclou novas canções com números clássicos como "Blue Yodel 12 & 35" de Jimmie Rodgers e "Get Together" dos Youngbloods, só para ver se dava certo.

Pois deu certo até demais.

"The Trick Is To Breathe" é primoroso, country music da gema com aquela mesma atitude roqueira diferenciada que Gram Parsons imprimia aos seus discos solo ou com The Flying Burrito Brothers.

Marca um recomeço para Sid Griffin como artista solo, já que ele pretende promover o disco em tournées pela Europa, Japão e Austrália com uma banda mínima.

Só que agora não mais como um band leader, e sim como um "troubadour" americano globetrotter, feliz em seu exílio voluntário.


WEBSITE PESSOAL
http://www.sidgriffin.com/

DISCOGRAFIA
http://www.allmusic.com/artist/the-long-ryders-mn0000082091/discography
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A EXCELENTE FORMA DOS VETERANOS DO NRBQ: 45 ANOS DE CARREIRA NUM CORPINHO DE 25.


Em 1967, dois músicos de Louisville, Kentucky uniram forças num projeto musical com uma sonoridade bastante inusitada, mas estranhamente agradável, que combinava uma atitude musical extremamente aventuresca com uma postura enganosamente despretensiosa.

Eram eles o pianista Terry Adams e o guitarrista Steve Ferguson, duas criaturas absolutamente ecléticas que decidiram homenagear o grupo Modern Jazz Quartet -- que assinava MJQ -- batizando sua banda como NRBQ, sigla para New Rhythm & Blues Quartet.

Logo no primeiro disco para a Epic, já deixaram claro no repertório de covers -- que incluía números de artistas tão díspares quanto Eddie Cochran, Carla Bley, Sony Terry & Brownie McGhee e Sun Ra -- que não pretendiam facilitar muito as coisas, mas estavam abertos a qualquer bricadeira musical.

Esse espírito criativo e brincalhão no NRBQ, somado às performances cativantes que promoviam em pequenas casas noturnas por todos os cantos dos EUA e do Canadá, acabaram  rendendo a eles um "cult status" invejável e um público cativo, apesar de seus discos jamais terem tido vendagens muito expressivas.

Passaram toda a década de 70 pulando de galho em galho -- da Columbia Records para a Mercury, e depois para a Bearsville --, até que, nos Anos 80, decidiram partir para a cena independente, onde se sentiam bem mais à vontade, e de onde nunca mais saíram.

(na verdade, saíram sim, uma única vez, em 1989, e gravaram um belo disco para a Virgin Records, 'Wild Weekend", que vendeu muito pouco e deve ter gerado a demissão de alguns executivos da gravadora -- mas o importante é que o NRBQ sobreviveu bem a tudo isso)

Vários de seus integrantes foram saindo ao longo dessa longa jornada -- o primeiro foi o guitarrista Steve Ferguson em meados dos 70, e o segundo foi seu substituto, Big Al Anderson, que pulou fora em meados dos 90 para seguir carreira como compositor em Nashville, pois não aguentava mais o ritmo alucinado das tournées da banda e precisava de um pouco de sossego.

Até que em 2004, depois de uma série de shows comemorativos de 35 anos de carreira, a banda encerrou atividades.



Mas não por muito tempo.

Sete anos mais tarde, com uma formação totalmente nova, Terry Adams retomou as atividades do NRBQ, e desde então já gravaram nada menos que 3 LPs.

Esse recém-lançado "Brass Tacks", da Big Notes Records,  é disparado o melhor deles até agora.

Com a banda totalmente azeitada depois de shows e mais shows pelo mundo afora, e seguindo um padrão sonoro muito semelhante ao do NRBQ nos anos 80 e 90, Terry Adams toca o barco em frente com composições muito divertidas, às vezes surreais, mas sempre pontuadas por sua voz amalucada e seus teclados com som de pianolas de crianças.

Se eu tiver que escolher uma favorita nesse disco, fico com "Greetings From Delaware", um número que já nasce clássico, onde Terry homenageia os cartões de crédito e faz a defesa apaixonada do endividamento sem controle.

Mas o caso é que tem muito, muito mais de onde veio essa, e o disco é simplesmente uma delícia, da primeira à última faixa.



Com 45 anos de carreira, o NRBQ segue firme e forte.

Com o mesmo vigor e o mesmo frescor de 20, 30, 40 anos atrás.

Sempre desdenhando o mainstream que nunca soube acolher bem a banda e debochando de tudo e de todos da maneira mais positiva possível.

É sempre bom lembrar que a formação atual do NRBQ traz, além do genial Terry Adams, o guitarrista Scott Ligon, o baixista Casey McDonough e o baterista Conrad Chouchon, todos correndo atrás daquelas mesmas saídas sonoras inusitadas que a banda persegue desde o início.


Segundo Terry Adams, o motivo pelo qual o NRBQ nunca emplacou com o grande público é que eles estavam sempre no momento certo, mas no lugar errado.

E cita o fato deles terem tocado num clube de cadetes na cidade de Woodstock no mesmo fim de semana de 1969 em que, alguns quilômetros adiante, rolava o emblemático Festival.

Faz sentido.





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http://www.nrbq.com/

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sexta-feira, setembro 05, 2014

CHEGA ÀS LOJAS "STEP BACK", O ADEUS FESTIVO E EMOCIONANTE DE JOHNNY WINTER

A morte do guitarrista texano Johnny Winter dois meses atrás, em meio às festividades de seus 70 anos de carreira, foi um choque terrível para seus admiradores espalhados pelo mundo inteiro.

Winter era, sem sombra de dúvidas, o legítimo herdeiro de Jimi Hendrix.

Os dois eram os únicos guitarristas da Geração Woodstock capazes de reinventar o modo de usar a guitarra num número de rock and roll.

Difícil dizer qual dos dois era mais inusitado ou original.

Ambos eram selvagens e inclassificáveis..


Johnny Winter era um assombro.

O som e a fúria do blues e do rock and roll transmutados na figura de um albino chiquérrimo com cabelos longos, inúmeras tatuagens espalhadas pelo corpo, voz ríspida e um ataque sempre surpreendente na sua Gibson Firebird.

Brilhou de forma contundente tanto nos palcos quanto em LPs memoráveis, e foi uma das estrelas mais emblemáticas do rock americano na primeira metade dos anos 70.

Mas, depois de muitos problemas com heroína, ele se encheu do estrelato na cena roqueira e, bem no auge de sua popularidade, decidiu voltar às suas origens blueseiras em discos soberbos ao lado de alguns de seus heróis musicais, que ainda estavam vivos e menos ativos do que gostariam.

Eram eles: Muddy Waters, James Cotton, Pinetop Perkins, Big Walter Horton e Willie Dixon.


Johnny gravou os melhores discos de sua carreira com eles e se divertiu um bocado como patrão e produtor deles todos.

Mas pagou caro por isso.

Sua gravadora quebrou, ele perdeu seu contrato com a Columbia e foi obrigado a migrar da cena mainstream para a cena alternativa para conseguir sobreviver -- isso enquanto via guitarristas jovens como Stevie Ray Vaughan surgirem e tomarem o lugar que era seu por direito.

O caso é que, infelizmente, sua figura, que era considerada exótica dos desbundados anos 70, passou a ser considerada bizarra nos caretésimos Anos 80. Sinal dos tempos.

Mas Johnny seguiu em frente mesmo assim.

Apesar de ter Inverno no sobrenome, não havia tempo ruim para Johnny Winter.

Aceitou sua sina e retomou sua carreira de forma não menos que espetacular em discos excelentes para a independente Alligator Records, do amigo Bruce Iglauer. e depois para o selo Point Blank, do Grupo Virgin.


Passou a gravar discos cada mais mais esporádicos, mas nunca parou de excursionar.

Todos sabiam que ele estava longe de sua melhor forma: sua voz não era mais a mesma, seu ataque na guitarra não era mais tão truculento e inusitado como antes, e muitas vezes ele só conseguia se apresentar sentado, pois a osteoporose -- doença comum entre albinos, agravada pelos anos em que fez uso de heroína -- não permitia que ele permanecesse em pé por muito tempo sem sentir dor.

Mesmo assim, nem mesmo nos momentos mais difíceis, ele nunca cogitou parar.

Nesses últimos dois anos, gravou dois discos muito bons para o selo Megaforce.

O primeiro deles foi "Roots", repleto de participações especiais estelares, onde Johnny parecia ter redescoberto o prazer de tocar e gravar em estúdio.

E o segundo, "Step Back", que Johnny finalizou pouco antes de morrer, está chegando agora às lojas.



"Step Back" não traz nenhuma grande surpresa, soa como uma continuação de seu disco anterior, o que, por si só, já é um excelente ponto de partida.

Traz Johnny Winter nitidamente feliz e satisfeito, passeando por um repertório clássico de blues e rhythm and blues que é a cara dele, tocando surpreendentemente rápido e cantando bem melhor que vinha cantando nos últimos tempos.

"Step Back" deixa transparecer que todos os convidados sabiam que Johnny não iria permanecer aqui por muito mais tempo, daí fizeram questão de contracenar com ele da forma mais festiva e positiva possível antes que tivesse que saír de cena em definitivo.

Daí, é muito importante saudar a presença de espírito de Eric Clapton, Billy Gibbons, Brian Setzer, Leslie West, Ben Harper, Joe Bonamassa e Joe Perry, que não negaram fogo a essa empreitada final de Johnny Winter, e ajudaram a fazer desse 'Step Back" uma despedida em altíssimo astral para esse guitarrista fabuloso.

Que, dois meses depois de ter partido, já faz uma falta enorme.





WEBSITE OFICIAL
http://www.johnnywinter.net/

DISCOGRAFIA
http://www.allmusic.com/artist/johnny-winter-mn0000819983/discography

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quinta-feira, setembro 04, 2014

RYAN ADAMS DEIXA OS EXAGEROS DE LADO E VOLTA ECONÔMICO, PRECISO E INSPIRADO.


Por muitos anos, correu na cena alt-country americana uma piadinha que apontava o cantor, compositor e roqueiro de garagem Ryan Adams como o único "workaholic alcooholic" do show business.

O motivo da piada -- além de suas constantes bebedeiras públicas -- é o volume impressionante de composições que ele publicava e gravava todo ano, em discos sempre muito longos e, vez ou outra, cansativos.

Ryan é exagerado desde sempre.

Sempre produziu com facilidade desde que começou a compor aos 14 anos, e graças a isso nunca teve dificuldades em liderar e abastecer com novas canções suas primeiras bandas na década de 90: The Patty Duke Syndrome e a lendária Whiskeytown, que era tido como uma espécie de "Nirvana Alt-Country".

Mas ele sempre teve dificuldade em escolher entre as muitas canções que compunha.

Na dúvida, gravava e publicava todas, e isso às vezes virava um problemaço. Para se ter uma idéia, houve um ano em que Ryan lançou nada menos que 3 discos com canções inéditas.

Ecomo quantidade e qualidade raramente andam juntas, logo ficou claro que o que Ryan tinha de de prolífico, seu trabalho tinha de irregular.


Verdade seja dita, não era bem assim no início de sua carreira solo.

Ele já foi mais comedido, prova disso são os discos que ele gravou entre 2000 e 2003.

Mas começou a errar a mão, pecar pelo exagero e nunca mais conseguiu produzir discos tão gabaritados quanto os que gravou no início de sua carreira solo.

E então, de três anos para cá, vários problemas pessoais obrigaram Ryan Adams a sair de cena: um divórcio litigioso, saúde debilitada, abstinência alcoólica compulsória e uma infecção nos ouvidos que quase o deixou surdo.

Sua vida pessoal virou um inferno.

Com isso, ele deixou sua carreira meio de lado e passou a produzir discos para alguns artistas amigos


Mas sobreviveu.

E agora, recuperado de tudo isso -- inclusive do alcoolismo -- Ryan está de volta, e com o melhor disco de sua carreira até agora

O nome do disco sinaliza um recomeço: é apenas "Ryan Adams".

É um trabalho primoroso, produzido por Ryan e seu velho parceiro Mike Viola, que teve um histórico bastante acidentado, mas felizmente resultou num triunfo artístico.

(esse disco teve uma versão anterior gravada ano passado produzida pelo veterano Glyn Johns -- que também produziu seu disco anterior, "Ashes & Fire" --, mas Ryan detestou o produto final a ponto de vetar o lançamento do disco, alegando ser "slow, adult shit", isso apesar de ter custado a "bagatela" de 100 mil dólares)

Os arranjos das 11 canções de "Ryan Adams" são extremamente delicados e de um bom gosto a toda prova, graças ao alto calibre dos músicos envolvidos no projeto -- Benmont Tench nos teclados, Jeremy Stacey na bateria, Cindy Cashdollar no pedal steel guitar, Ethan Johns na guitarra e Don Was no baixo.

A orientação musical oscila entre o rock and roll rasgado e o power pop bem melódico que seus fãs de Adams conhecem muito bem.

Não é um disco que vá provocar qualquer tipo de estranhamento em seus ouvintes.

A grande novidade aqui é a falta de urgência da maioria das canções, e também a diversidade de tons ao longo do disco -- além, é claro, de ser sua estréia na Blue Note Records, gravadora tradicionalmente jazzística.

As 11 canções desse "Ryan Adams" ganham o ouvinte logo de cara, apesar de não serem exatamente canções fáceis.

Todas são, claro, exemplos muito bem acabados do talento desse grande artesão pop, que não só continua no topo de seus poderes como cantor e compositor, como faz questão de deixar claro que ainda tem muita lenha para queimar.


Essa aposta franca no exagero, tanto na sua produção artística quanto na sua vida pessoal, custou muito caro para Ryan Adams.

Em troca, recebeu a indiferença de parte de seu público, que deixou de acompanhar sua carreira.

Agora, depois de muitos discos longos e dispersos que quase ninguém ouviu, Ryan Adams parece ter finalmente achado a medida certa para embalar seu trabalho.

Permanece um artista inquieto e nada fácil de se lidar, mas o produto final de seu trabalho não sofre mais as consequências de suas idiossincrasias.

Meno male.




WEBSITE OFICIAL
http://paxamrecords.com/

DISCOGRAFIA
http://www.allmusic.com/artist/ryan-adams-mn0000808336/discography

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quarta-feira, setembro 03, 2014

APAIXONADO NA 3° IDADE, ROBERT PLANT REINVENTA SUA CARREIRA EM GRANDE ESTILO


No longínquo ano de 1968, todos os integrantes do grupo Yardbirds tinham acabado de abandonar o guitarrista Jimmy Page às vésperas de uma tournée pela Europa.

Jimmy entrou em desespero e saiu correndo atrás de conhecidos e indicados de conhecidos para montar às pressas uma nova versão dos Yardbirds para poder cumprir os compromissos.

Foi quando conheceu Robert Plant, com quem estabeleceu uma parceria brilhante à frente do Led Zeppelin durante 12 anos.


Pois bem: em 1982, quando Plant iniciou sua carreira solo, o comentário geral era: "okay, funciona, lembra o Zep, mas falta Jimmy Page".

E a insistência para que ele e Page reatassem a velha parceria passou a ser tamanha que lá pelas tantas, em meados dos Anos 90, eles cederam e acabaram gravando dois discos em colaboração: um reciclando canções do Zep com arranjos acústicos inusitados e outro bem elétrico e só com material inédito.

Ao final dessa parceria, Robert Plant sentiu o peso do legado do Led Zep nas costas e decidiu redirecionar de forma radical sua carreira solo.

Saiu buscando não só suas raízes folk e blues como também reagrupando sua primeira banda, o Band Of Joy, e partindo para aventuras musicais ao lado de cantoras do quilate de Alison Krauss e, mais recentemente, de Patty Griffin.

E então, dois anos atrás, montou uma banda espetacular, The Sensational Space Shifters, com quem gravou um belo disco ao vivo.


Agora, Plant e The Sensational Space Shifters finalmente estreiam em estúdio nesse recém lançado "Lullaby And The Ceaseless Choir".

É o décimo disco solo de Plant, e talvez o mais arrojado musicalmente de todos.

Aqui, as combinações de rock e folk com música árabe e música eletrônica ficam menos aleatórias e revelam um projeto coeso e com uma personalidade musical fortíssima.

Todas as composições são coletivas.

Algumas até lembram o Zep.

Mas o estranhamento decorrente da abordagem musical escolhida vem sempre antes, podendo tanto encantar os ouvintes mais aventurescos quanto afastar os fãs mais conservadores.

Mas esse é um risco que Robert Plant, aos 66 anos de idade, não tem o menor medo de correr.

O importante é sentir claramente que todas aquelas imposições de mercado de que Robert Plant vinha tentando se libertar há anos, agora ficaram bem para trás.



Três detalhes importantes:

Um: todas as canções de amor desse disco foram escritas para a cantora e compositora Patti Griffin, com quem Plant se casou recentemente.

Dois: a voz folk feminina com sotaque de Wales que vez ou outra surge nas canções é da jovem cantora Julie Murphy, e é tão linda e intensa quanto as vozes de June Tabor, Anne Haslam e Linda Thompson.

Três: a produção aventuresca de T-Bone Burnett é simplesmente sensacional, valorizando os arranjos densos dos seis integrantes do Sensational Space Shifters e dando a eles uma organicidade musical ímpar.



Recentemente, numa entrevista, perguntaram a Robert Plant se seu desinteresse numa reunião com seus velhos parceiros do Led Zeppelin não é só da boca pra fora.

Plant disse: "Pois é... perguntaram a mesma coisa para os Eagles recentemente, e eles disseram que voltaram a tocar juntos porque estavam entediados em suas carreiras solo"

E então, completou: "Pois esse, definitivamente, não é o meu caso".

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WEBSITE PESSOAL
http://robertplant.warnerreprise.com/

DISCOGRAFIA
http://www.allmusic.com/artist/robert-plant-mn0000830538/discography

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