sexta-feira, janeiro 22, 2016

2 OU 3 COISAS SOBRE "CASS COUNTY", NOVO LP DO EAGLE TEXANO DON HENLEY

por Chico Marques


A morte súbita de Glenn Frey, co-líder dos Eagles ao lado de Don Henley, no início de Janeiro de 2016, encerrou a saga confusa e megalômana da banda californiana mais bem-sucedida comercialmente dos Anos 70.

Caso raro de banda em que até o baterista canta -- e canta muito bem --, os Eagles conseguiram agregar em seus primeiros quatro albums variantes musicais díspares e muito interessantes, decorrentes das personalidades musicais de cada integrante do grupo.

Um dos muitos dados curiosos da banda é que Glenn Frey, californiano, tinha afinidades musicais com country-rock de tons agridoces da California, enquanto Don Henley, texano da gema, sempre demonstrou ter preferência por um pop denso, quase existencialista.

Esse mix musical aparentemente incompatível somado às colaborações do baixista Randy Meisner -- ex-integrante do prestigiado grupo Poco -- e do guitarrista solo Bernie Leadon -- um aplicado aluno de Clarence White que vinha de uma temporada ao lado de Gram Parsons nos Flying Burrito Brothers -- proporcionou ao DNA dos Eagles todos os fatores hereditários e os anticorpos necessários para se dar bem na primeira metade dos Anos 70.


Mas o caso é que nenhum deles esperava que a banda alcançasse o sucesso que alcançou. Sem contar que a associação da banda com compositores amigos extremamente talentosos como Jackson Browne, Jack Tempchin e John David Souther permitiu que eles tivessem um repertório de singles extremamente robusto em pouco mais de três anos de carreira.

Mas com o megaestrelato de "Hotel California" o delicado equilíbrio "middle of the road" que caracterizava o trabalho dos Eagles foi para a cucuia, e o pop agridoce predominou sobre as sonoridades country, sempre com o contraponto eventual de um rock bem polido ou outro. Tudo isso somado aos abusos farmacológicos de praxe, e deu no que deu: as relações se deterioraram perigosamente entre os dois líderes dos Eagles. Em consequência disso, Randy Meisner e Bernie Leadon, que eram figuras cada vez mais secundárias na banda, decidiram cair fora para tentar carreiras solo, sendo substituídos por Tim Schmitt e Joe Walsh.

E não houve jeito: em 1980, depois da tournée confusa e turbulenta para promover o sexto disco da banda, 'The Long Run", os Eagles anunciaram que estavam encerrando atividades. No ano seguinte, tanto Don Henley quanto Glenn Frey deram início a carreiras solo extremamente bem sucedidas, que ficaram obscurecidas a partir dos constantes retornos dos Eagles a partir de 1994 para novos discos e tournées milionárias.

Curiosamente, tanto Glenn Frey quanto Don henley gravaram apenas 5 discos solo cada um nos últimos 35 anos.

O mais recente trabalho de Glenn Frey foi "After Hours", de 2012, uma coleção de covers de canções dos Anos 40 e 50 de que ele gostava muito, a ponto de decidir gravar um disco só com elas.

Já o mais recente trabalho de Don Henley veio à tona no final do ano passado, depois de vários anos em produção, enquanto aguardava o término de um contrato de longo prazo que tinha com a Warner.


Em "Cass County" (um lançamento Universal Music), seu primeiro disco de inéditas em 15 anos, Don Henley deixa de lado seu pop denso e arrojado e mergulha de cabeça nas suas raízes musicais texanas. Justo elas, que ele tanto evitou ao longo de toda a sua carreira.

Esboçado ao longo dos últimos 3 anos em seu estúdio caseiro, mas gravado inteiramente em Nashville, com músicos da cidade, no início do ano passado, "Cass County" -- nome do condado texano onde Henley passou sua infância -- é tanto uma espécie de volta para casa quando um acerto de contas carinhoso com o passado.

Segundo Henley, nunca foi tão divertido gravar um disco quanto dessa vez, graças ao time excelente e bem-humorado de músicos jovens que teve à disposição no estúdio. Como de hábito, todas as canções foram compostas em parceria com seu parceiro contumaz Stan Lynch, que nunca teve chance de mostrar suas habilidades como compositor nos muitos anos em que tocou bateria para Tom Petty & The Heartbreakers.

"Cass County" é um disco muito curioso e contraditório. É aparentemente despojado, mas custou caro. É aparentemente nostálgico, mas os arranjos são bem modernos. E apesar de ter uma levada meio urgente, foi gravado sem a menor pressa.
As canções são todas ótimas e de altíssimo gabarito, como de praxe em todos os álbuns solo de Don Henley. Difícil escolher uma ou outra para detacar.

Por mais confuso e prolongado que possa ter sido o processo de produção do disco, existe uma unidade artística e um padrão de excelência inegáveis no repertório. E as composições são simplesmente impecáveis, quase todas de primeira grandeza. Nenhum de seus discos solo ostenta um material tão "assoviável".

Na medida em que "Cass County" foi projetado originalmente para ser um disco de colaborações, e as participações especiais já gravadas eram "especiais demais" para serem descartadas no mix final, o jeito encontrado por Don Henley foi conjugar o que restou do projeto inicial com o novo projeto, tentando situar tudo num clima meio "rootsy" que pode ser sentido já a partir da capa, que traz Henley sentado ao volante de uma velha caminhonete com jeitão de roceiro, cuidadosamente desalinhado e despenteado.

"Cass County" ostenta duetos magníficos com Lucinda Williams, Trisha Yearwood, Martina McBride e Dolly Parton, além de Merle Haggard e de Mick Jagger, que faz uma participação vocal simplesmente genial com Miranda Lambert na faixa de abertura "Bramble Rose". Traz baladas fulminantes como "Words Can Break Your Heart", "She Sang Hyms Out Of Tune" e "Prayin' For Rain". E também rocks poderosos como "Achy Breakin' Heart". Tem até um blues com sotaque country à moda de Hoagy Carmichael chamado "Too Much Pride". E o mais importante de tudo: tem o vigor criativo dos músicos que povoam Nashville atualmente, que lembra, de certa forma, a verve dos country-rockers californianos do final dos Anos 1960 e início dos Anos 1970. Como os Eagles, por exemplo. Aliás, uma das mais belas faixas do disco é parcialmente dedicada a eles. O nome é "Train In The Disance".

Com o passar dos anos, a voz de Henley mudou um pouco. Continua rouca como sempre foi, só que agora está bem menos potente. Eu, pessoalmente, acho que ela nunca esteve tão bem acomodada a suas canções. Curiosamente, ficou um pouco semelhante à voz de Warren Zevon em seus dois LPs derradeiros. Mas fiquem tranquilos: Henley parece estar bem de saúde, não há com o que se preocupar.



Enfim, entre as novas canções de sua autoria e os covers que iriam compor o álbum de duetos inacabado, "Cass County" acaba ganhando uma dimensão curiosa com a recente morte de Glenn Frey.

Na medida em que Don Henley sempre fez o contraponto modernoso ao country-rock franco e desencanado de seu ex-parceiro, vê-lo mergulhar fundo em sua alma country pela primeira vez em seus discos solo sugere que ele desistiu da velha queda de braço que rolou entre os dois parceiros musicais ao longo dos últimos quarenta e poucos anos. 

Henley teria entregado os pontos.

Ou seja: Glenn Frey ganhou a parada.

De qualquer maneira, o que vale é que, com isso, Don Henley gravou o melhor álbum solo de sua carreira até o presente momento.



Se Glenn Frey ouviu "Cass County" antes de partir deste Planeta -- e ele viveu tempo suficiente para tê-lo ouvido -- presumo que tenha aprovado o tom da brincadeira, disparando um de seus clássicos sorrisos de canto de boca. Glenn era muito cool.

Don Henley, felizmente, ainda é.



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terça-feira, janeiro 19, 2016

2 OU 3 COISAS SOBRE "FIRST COMES THE NIGHT", NOVO LP DO SURFISTA MELANCÓLICO CHRIS ISAAK


Quando surgiu na cena musical de Los Angeles, correndo de rádio em rádio com seu primeiro LP "Silvertone" em baixo do braço, Chris Isaak esbanjou simpatia e, com isso, foi saudado de imediato por todos no meio musical como um curioso mix entre o visual de Ricky Nelson, a voz de Roy Orbison e a guitarra "twangy" de Duane Eddy.

Isaak chegou com a corda toda, mesclando sonoridades revisionistas da Sun Records com os "pet sounds" californianos dos Anos 60, alternando seu jeitão de surfista vintage com uma atitude artística pós-modernosa -- sempre sob a tutela do veterano produtor Eric Jacobsen, co-responsável pelos sucesso de John Sebastian e de Tim Hardin nos anos 60.

Chris Isaak fez um bom número de amigos pela América com seus dois primeiros discos, mas só foi cair no gosto do grande público no terceiro, "Heart Shaped World", de 1989, quando emplacou a canção "Wicked Game" nas paradas do mundo inteiro -- aqui no Brasil inclusive.

Desnecessário dizer que sua carreira paralela como ator em filmes como "O Silêncio dos Inocentes" de Jonathan Demme e "Coração Selvagem" de David Lynch ajudaram bastante na sedimentação de sua imagem de astro pop múltiplo, fazendo dele uma espécie de "instant darling" daquele final de década.



Nos últimos 25 anos, no entanto, Chris Isaak nunca mais conseguiu repetir o sucesso daquele momento.

Soube administrar bem sua carreira, alternando música e cinema com um talk-show chamado "The Chris Isaak Hour" que fez por uns tempos no Biography Channel, e fugindo sempre que possível daquela armadilha clássica que faz do artista um prisioneiro de fórmulas que deram certo tempos atrás.

Mas sempre que sentiu que sua carreira ameaçada a entrar em baixa, Chris Isaak não hesitou em retomar sua persona "mezzo Ricky Nelson com Roy Orbison, mezzo Duane Eddy" para reencontrar seu público cativo e assim seguir em frente com sua carreira.



"First Comes The Night" (um lançamento Vanguard-Wicked Game Records) é o 13º álbum de estúdio de Chris Isaak em 30 anos de carreira.

Quer saber se traz grandes novidades?

Não, não traz.

Não muitas, pelo menos.

Mas na medida que há seis anos Chris Isaak não nos brindava com um disco com canções inéditas, isso por si só já faz de "First Comes The Night" um acontecimento musical digno de ser devidamente saudado.

 Gravado em Nashville, bem longe do mar, e produzido por Paul Worley (Dixie Chicks, Lady Antebellum, Martina McBride), Dave Cobb (Jason Isbell, Sturgill Simpson, Shooter Jennings) e seu velho amigo Mark Needham, "First Comes The Night" segue em sintonia fina com o espírito de seus discos clássicos, só que mais pelo viés das composições do que pela musicalidade revisionista.

É um disco um pouco menos praiano que seu trabalho habitual, mas tão colorido e climático quanto, trazendo um cardápio de doze canções marcantes e perfeitamente assoviáveis, que vão das baladas românticas sempre infalíveis a rocks estilosos e números country híbridos que são, no mínimo, cativantes.

"The Way Things Really Are", por exemplo, é um número composto e levado no piano -- coisa rara nos discos de Isaak, sempre movidos por guitarras.

"Down in Flames", uma canção difícil de classificar, ostenta um beat muito curioso e bastante incomum em seu repertório.

Já "Perfect Lover"  vem pontuada por uma levada meio rockabilly, meio mariachi que é simplesmente irresistível -- a trilha sonora perfeita para uma escapada de fim de semana em Tijuana.

E tem ainda as divertidas "Baby What You Want Me to Do" and "Don't Break My Heart", que parecem ter fugido de um daqueles filmes duvidosos de Elvis Presley rodados na década de 60, como "Carrossel de Emoções" e "Loiras Morenas e Ruivas".

Claro que sempre é bom ter um single poderoso puxando execução nas rádios, e a faixa-título é simplesmente perfeita para exercer essa função. Trata-se de um número poderoso, que evoca "Wicked Game" e é a cara de Chris Isaak -- ou ao menos, a cara que o grande público se habituou a associar a ele.




Apesar de "First Comes The Night" alternar números inusitados com canções sob medida para agradar em cheio ao fã habitual de Mr. Isaak, não se pode dizer que seja um LP que eleve o trabalho dele a um novo patamar artístico.

É um disco de manutenção de carreira, visando sua sobrevivência na cena independente e a manutenção de sua reputação de roqueiro baladeiro romântico.

"First Comes The Night" é um belo disco, reforça sua persona cool e o reafirma como um ótimo compositor e um artista pop bastante relevante.

O que mais um veterano da cena pop, com 30 anos de carreira pregressa e uns tantos outros pela frente, pode desejar nos dias de hoje?



WEBSITE OFICIAL
http://www.chrisisaak.com/

DISCOGRAFIA COMENTADA
http://www.allmusic.com/artist/chris-isaak-mn0000775323/discography

AMOSTRAS GRÁTIS







 


segunda-feira, janeiro 11, 2016

2 OU 3 COISAS SOBRE "BLACKSTAR", O DERRADEIRO MERGULHO NA NOITE DA ALMA DE MR. DAVID BOWIE

por Chico Marques


Passei a primeira semana de 2016 ouvindo sem parar "Blackstar", novo LP de David Bowie. Fiquei completamente encantado com as texturas musicais que ele criou e desenvolveu, com a densidade existencial das canções e com a carga dramática intensa que contrasta com a brevidade do disco (42 minutos de duração).

Minha intenção inicial foi esperar para publicar uma apreciação de "Blackstar" na última sexta, dia 8 de Janeiro, data oficial de seu lançamento mundial e também o dia em que Mr. Bowie iria completar 69 anos de idade. Mas não escrevi nada. Não me senti pronto para escrever a respeito. Alguma coisa permanecia no ar, me incomodando e fascinando mais e mais a cada nova audição, Achei melhor ouví-lo mais algumas vezes e esperar para ver se as idéias clareavam mais um pouco até o início da semana seguinte.

E então, a semana seguinte veio com a notícia da morte de David Bowie na noite de domingo, 10 de Janeiro, em Nova York, depois de 18 meses de uma batalha intensa contra um cancer. Na medida em que desde o final dos Anos 70 Bowie nunca deixou de zelar por sua privacidade, separando totalmente sua vida artística de sua vida pessoal e familiar, só um círculo seleto de amigos sabia pelo que ele estava passando. Para o grande público, Bowie estava apenas recluso.

A notícia de sua morte, obviamente, mudou por completo o meu entendimento sobre o que Bowie pretendia com "Blackstar". Nunca me ocorreu que este fosse um disco especificamente sobre a morte, apesar dela estar à espreita nos temas das sete faixas do disco. Mas agora é, gostemos disso ou não.

"Blackstar" é uma sequência de canções que chama o ouvinte para mergulhar na noite da alma. Nele, tudo soa estranhamente confortável e familiar. Ecos dos anos 70 saltam aos ouvidos o tempo todo. Tudo é de uma urgência impressionante. Nesse sentido, lembra um pouco "Station to Station", que foi gravado numa época em que ele vivia no limite, num flerte aberto com a morte -- que ele reverteu de forma brilhante ao longo da série incomparável de álbuns "Low", "Heroes", "Lodger" e "Scary Monsters".

Apesar das muitas semelhanças musicais com alguns momentos mais densos de seu disco anterior, "The Next Day" (2013), que abria janelas tanto para seu passado quanto para seu futuro, "Blackstar" não é plural, e nem pretende abrir janela nenhuma para lugar algum. Funciona como um trem fantasma quer vaga pela noite, contrapondo o passado à frente do futuro, e vice-versa. Sempre mantendo o imaginário a serviço da realidade, sem perder tempo correndo atrás do sentido da vida, pois não há tempo para isso.

Tudo o que "Blackstar" proporciona em termos existenciais é de uma truculência emocional ímpar. E, agora sabemos com certeza, é tudo absolutamente verdadeiro.


"Blackstar" não se preocupa em estar em sintonia com o momento musical atual, uma obsessão que sempre permeou cada novo trabalho de Bowie. Sua sonoridade jazzy possui um toque glam muito forte, que soa atemporal e nada datado. Claro que o disco, que não é de audição fácil, não é composto unicamente de estranhamentos musicais. Ele se equilibram com números pop com drum'n'bass à moda dos Anos 90, entre outras surpresas curiosas.

Duas canções do disco -- "Sue (Or in a Season of Crime)" e "'Tis a Pity She Was a Whore" -- já haviam aparecido na coletânea "Nothing Has Changed" dois anos atrás, mas foram regravadas com uma levada completamente diferente por Bowie e pelo produtor Tiny Visconti para este novo disco.

Mas para chegar até elas o ouvinte tem que passar pela ousada e complexa suite de abertura de dez minutos de duração que dá nome a "Blackstar", e que é de tirar o fôlego. Posso apostar que, ao ouví-la, Scott Walker deve ter morrido de inveja e, ao mesmo tempo, de orgulho de seu pupilo. É uma obra espetacular, que dá uma dimensão totalmente nova às capacidades de Bowie como compositor.


Quer um conselho?

Ouça "The Next Day", o disco de Bowie de 3 anos atrás, e depois, mergulhe de cabeça em "Blackstar".

Sem medo. Pode dançar, se quiser.

"Blackstar" é um disco suspenso no ar, climático e envolvente, que agora passa a fazer mais sentido ainda ao se afirmar como um epílogo na carreira de Bowie.

É complexo e perturbador, além de ser uma peça fundamental numa das carreiras mais relevantes da música popular do Século 20. Poucos artistas tiveram o privilégio de definir em vida qual seria o ponto final em suas obras.

Pois David Bowie teve.

Começa agora o Eterno Retorno.


"CAMALEÃO DO ROCK"
É A PUTA QUE O PARIU!
(DAVID BOWIE)  




Amostras Grátis











segunda-feira, janeiro 04, 2016

2 OU 3 COISAS SOBRE "FUTURE NOSTALGIA", NOVO LP DOS CANADENSES BARBUDOS E PELUDOS THE SHEEPDOGS

por Chico Marques


Não deixa de ser uma grande ironia uma das melhores e mais criativas bandas americanas de Southern Rock da atualidade ser na verdade... canadense. Até parece troco por todas aquelas gracinhas disparadas contra o modo de vida do Canada pelos roteiristas de "South Park" ao longo de muitos e muitos anos.

O caso é que The Sheepdogs -- difícil imaginar um nome mais "sixties" para uma banda -- está na estrada desde 2006, dando murro em ponta de faca sem esmoecer e brigando por um lugar ao sol em meio à disputadíssima cena do rock adulto norteamericano.

Os três primeiros LPs da banda foram gravados às próprias custas, com distribuição bastante defitária até mesmo no Canadá. Nos Estados Unidos, conseguiram algum "airplay" apenas em college rádios da região de Minneapolis-Saint Paul. 


Mas, mesmo com tudo conspirando contra eles, The Sheepdogs jamais cogitou jogar a toalha.


Foi só a partir de 2011 que a sorte começou a sorrir para esses bravos rapazes cabeludos.

A Rolling Stone Magazine promoveu um concurso nacional chamado "Choose The Cover - So You Want To Be A Rock And Roll Star" para escolher uma banda sem contrato com gravadora alguma para sair na capa da revista.


E eles venceram, ganhando não só destaque na capa da revista e notoriedade instantânea, mas também -- aliás, principalmente -- um contrato com a Atlantic Records, onde gravaram seu aclamado quarto LP, "The Sheepdogs" (2012), que serviu para estabelecer o grupo na cena musical americana.

Sintomaticamente, o recém-lançado quinto LP de The Sheepdogs é justamente o melhor e, ao mesmo tempo, o mais desencanado e menos ambicioso que a banda já gravou.

Seu nome? FUTURE NOSTALGIA (um lançamento Warner Bros. Records), mais um deliciosa aula de rock and roll rasgado no belo currículo da banda.


São 18 canções curtas, de no máximo quatro minutos de duração cada, quase todas perfeitamente assoviáveis, e com um frescor criativo que permite a eles passar ao largo do festival de clichês comuns tanto ao Southern Rock quanto ao Rock Psicodélico.

Como conseguem isso? 

É que, apesar de ter uma carreira já relativamente estabelecida e uma identidade musical bem definida, The Sheepdogs não abre mão de manter uma atitude de bar band que não só dá o tom a toda a produção da banda, como soa sempre extremamente saudável.

Segundo o baterista Sam Corbett, o que move The Sheepdogs é que nenhum dos integrantes da banda se leva a sério mais do que o estritamente necessário, pois, segundo ele, "não existe nada mais corrosivo para uma banda de rock de que abrir mão da descontração e do descompromisso".

Voltando a FUTURE NOSTALGIA, suas 18 canções ostentam sonoridades extremamente familiares, lembrando desde o Bad Company e o Led Zeppelin até a Allman Brothers Band e os Faces e -- pasmem! -- o Queen!

São números sempre muito melódicos e, ao mesmo tempo, bem marcados nas guitarras e quase sempre com vocais em três partes -- característica das bandas psicodélicas de origem folk vindas de San Francisco e Los Angeles, como Jefferson Airplane, Grateful Dead e Quicksilver Messenger Service.

Há quem diga que a atitude da banda lembra cada vez mais a de bandas clássicas canadenses, como o Guess Who e o Bachman Turner Overdrive. Eu, pessoalmente, discordo um pouco disso. Na minha maneira de ver, The Sheepdogs é muito mais descolado que essas duas bandas mencionadas acima, pois seus discos fluem naturalmente e não parecem pautados por compromissos pontuais com produtores.

Outro ponto a favor de The Sheepdogs é que, apesar das canções da banda serem muito familiares, a maneira como as canções são executadas pela banda e encadeadas nos discos é sempre surpreendente e inusitada.

Por conta de todas essas características às vezes conflitantes, fica muito complicado definir The Sheepdogs com palavras.

Não é uma jam band, mas, se necessário, embarca em improvisos longos sem fazer feio em momento algum.


Toca seguindo o figurino das bandas clássicas, mas possui um frescor musical que tem pouco ou nada a ver com elas.


E, para complicar mais ainda, seus integrantes parecem muito satisfeitos com toda essa indefinição e com todo esse descompromisso, que já viraram traços estilísticos da banda.


Trocando em miúdos, o grande diferencial de The Sheepdogs é justamente buscar sua relevância artística na pedra fundamental do rock and roll, já que quase niguém se dá ao luxo de fazer isso nos dias de hoje.

É uma banda de rock moderna com uma sonoridade atemporal, uma atitude artística desencanada e uma obra que -- não vejo exagero algum em dizer isso -- já pode servir como referência para as novas bandas que estão vindo por aí.

Por essas e outras, tem gente que se refere a The Sheepdogs como "a grande esperança branca e peluda que vem do Canadá".

Quero ver o pessoal responsável por "South Park" conseguir dormir com um barulho desses!
THE SHEEPDOGS
Formação Atual:
Ewan Currie (guitarra, clarinete, saxofone, vocal)
Rusty Matyas (guitarra, trompete, vocal)
Shamus Currie (órgão Farfisa e Hammond, trompete)
Ryan Gullen (baixo, trombone,vocal)
Sam Corbett (bateria, percussão, trombone, vocal)
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