sexta-feira, outubro 31, 2014

BEN HARPER SURPREENDE E RETORNA AO ÚTERO MATERNO EM "CHILDHOOD HOME"


Ben Harper é um dos artistas mais ecléticos da cena musical anglo-americana.

Aos 44 anos de idade, já velho conhecido do público brasileiro, ele é um dos artistas mais intensos da cena musical americana e um compositor de talento raro, que a cada nova investida se revela ainda mais interessante.

Possui uma carreira extremamente sólida, tanto em termos artísticos quanto em vendagens, e pode se dar ao luxo de experimentar o que quiser que seu público endossa e prestigia.



Só isso pode explicar a virada radical que ele promoveu nesse "Childhood Home", um lindo disco country em parceria com ninguém menos que sua mãe, a cantora e musicista Ellen Harper.

Depois de trafegar pelo rock, pelo blues, e também pela soul music e por ritmos caribenhos, Ben decidiu resgatar a pureza country absoluta dos discos clássicos do saudoso cantor-compositor Gram Parsons nos delicados discos em dueto que gravou com Emmylou Harris entre 1972 e 1973, pouco antes de morrer.

E não é que Ben conseguiu? Sua voz casa perfeitamente com a de sua mãe, com quem alterna a primeira e a segunda voz em canções etéreas que irão surpreender até o purista country mais linha dura.

É um disco emocionante, atemporal, repleto de canções originais que, de tão familiares, parecem clássicos do gênero -- mas, surpreendentemente, não são.




Quem ainda hoje insiste em duvidar da grandeza artística de Ben Harper, precisa ouvir esse disco com urgência.

Tem que ser do primeiríssimo time para conseguir produzir algo dessa grandeza -- ainda mais depois de sua incursão vitoriosa pelo blues no disco que gravou com o gaitista Charlie Musselwhite no ano passado.

Guardadas as devidas proporções, Ben e Ellen Harper fazem com a country music o mesmo que João Gilberto faz com o samba.

Convenhamos: não é pouca coisa.
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http://www.benharper.com/

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http://www.allmusic.com/artist/ben-harper-mn0000792733/discography

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CARLENE CARTER, A HERDEIRA MUSICAL DA CARTER FAMILY, VOLTA EM "CARTER GIRL"


Não é nada fácil ser filha de June Carter, ter Johnny Cash como padrasto e ainda querer se afirmar por seus próprios méritos como cantora e compositora.

Ao longo de mais de 30 anos de carreira, pode-se dizer que Carlene Carter foi vítima de uma espécie de nepotismo às avessas.

Apesar de demonstrar talento já em seu disco de estréia, ela custou a ser levada a sério na cena country-rock.

Seu início de carreira em Los Angeles -- bem longe de sua Nashville natal -- em meados dos anos 70 foi muito badalado.

Mas essa badalação toda não se refletiu em boas vendagens, e ela fez mais amigos na cena musical do que entre o grande público.


Carlene Carter herdou a beleza da mãe, e a perseverança também.

Seus primeiros LPs, gravados nos anos 1980, chamaram a atenção por serem roqueiros e modernosos, e pouco ou nada afinados com seu pedigrée musical country.

Eram discos muito bons, mas infelizmente não soaram convincentes o suficiente para mantê-la firme no mercado.

E sua carreira passou a enfrentar altos e baixos emocionais e artísticos.

Drogas, bebedeiras e acusações de falta de profissionalismo vindas de promotores de shows começaram a conspirar contra sua reputação.



Só no quinto álbum, "I Fell In Love", quando ela cansou de negar o fato de ser herdeira da riquíssima tradição musical da Carter Family, é que veio o reconhecimento da crítica.

De lá para cá, seus discos -- bastante esporádicos, diga-se de passagem -- viraram mergulhos profundos na alma musical country americana com uma atitude sempre roqueira e afirmativa.

"Carter Girl", seu novo trabalho para a Rounder Records, é seu trabalho mais denso e vigoroso até o presente momento.

Se em seus projetos anteriores, ele contou com a produção aventuresca dos baixistas e ex-maridos Nick Lowe e Howie Epstein, aqui em "Carter Girl" ela segue à risca as orientações precisas do especialista Don Was -- curiosamente, também baixista --, que deixou claro desde o começo que não iria sossegar enquanto não fizesse dela a grande herdeira musical da gloriosa Dinastia Carter.

"Carter Girl" é um acerto implacável para a carreira de Carlene Carter.

Repertório impecável, parcerias brilhantes com alguns dos melhores compositores de Nashville, covers magníficos, performances impecáveis... não há nada em 'Carter Girl" que possa conspirar contra o futuro da carreira de Carlene Carter -- muito pelo contrário.

Até os quilos a mais que ganhou de uns tempos para cá -- ela está com 59 anos de idade, e, pelo visto, liberta da indumentária "cougar" que a fazia parecer mais jovem -- serviram para dar a Carlene um ar mais saudável e desencanado e um semblante bem mais... Carter Family!


Como não podia deixar de ser, "Carter Girl" conta com participações inspiradíssimas dos "amigos da família" Willie Nelson e Kris Kristofferson -- tanto um quanto o outro fizeram questão de abençoar a "sobrinha" Carlene nesse belo momento de sua carreira.

Willie a ajuda a achar o tom ideal para a "Troublesome Waters", uma balada country clássica, e Kris faz par com ela numa releitura muito bonita do "Blackjack David" -- dois clássicos da Carter Family nos Anos 40 e 50.

Experimente "Carter Girl", um disco country moderno e atemporal ao mesmo tempo, que reafirma mais uma vez o talento dessa artista ímpar chamada Carlene Carter

Com certeza, um dos melhores discos de country music que você irá ouvir este ano.



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quarta-feira, outubro 15, 2014

JACKSON BROWNE ESTÁ DE VOLTA EM GRANDE FORMA E COM UM DISCO MAGNÍFICO


De todos os cantores-compositores da cena bitterweet do início dos anos 70, nenhum foi tão melancólico, tão intenso, tão sensível e tão sintonizado com aquele climão de "o sonho acabou" quanto Jackson Browne.

Sou meio suspeito para falar dele, pois admiro seu trabalho desde a primeira metade dos Anos 70 -- antes mesmo de mergulhar de cabeça em seus discos solo -- através de covers magníficos como os de Linda Ronstadt em "Rock me On The Water", Bonnie Raitt em "I Thought I Was A Child", Joe Cocker em "Jamaica Say You Will" e Leo Sayer em "Something Fine", todas de sua autoria -- sem esquecer de 'Take It Easy", composta em parceria com Glen Frey e gravada pelos Eagles em seu primeiro LP.

Nascido em Heidelberg, na Alemanha, Jackson Browne foi criado na California e desde cedo demonstrou interesse por folk-music.

Tocou nos primeiros discos da Nitty Gritty Dirt Band, e em 1967 mudou de mala e cuia para Nova York para tentar a sorte como performer nos bares do Village -- isso enquanto se esforçava para emplacar como compositor.

Acabou se envolvendo -- tanto em termos artísticos quanto emocionais -- com a cantora Nico, do Velvet Underground, e contribuindo com três ótimas canções para seu primeiro e melhor LP, "Chelsea Girl".



No início dos Anos 70, no entanto, ele já estava de volta a Los Angeles com uma fita demo embaixo do braço repleta de grandes canções, que logo começaram a ser disputadas a tapa por vários artistas de peso da relevo da cidade.

Daí para "Saturate Before Using", seu álbum de  estréia em 1972, foi só uma questão de tempo e oportunidade.

O fato é que, ao longo dos Anos 70, Jackson produziu 5 álbuns fundamentais, tornando-se o queridinho da crítica e um sucesso inusitado de público, na medida em que suas canções, sempre abordando temáticas complexas, não faziam concessões às regras do mainstream pop da época.

Os Anos 80 já foram meio confusos para Jackson Browne, e sua popularidade crescente gerou discos meio fora de foco, como "Hold Out" e 'Lawyers In Love".

Que vieram seguidos de trabalhos extremamente politizados como "Lives In The Balance" e "World In Motion", sucessos de público, bem sintonizados com a reação popular à era Reagan, mas que apostavam numa retórica perigosa, que pouco a pouco foi cansando e afastando os muitos artistas que antes brigavam pelo direito de gravar suas canções.



Jackson só se deu conta disso no início dos Anos 90, quando voltou a compor canções confessionais para discos como "I'm Alive", "Looking East" e "The Naked Ride Home", e quase ninguém quis gravá-las.

Daí, tomou uma providência drástica, mas necessária: montou sua própria gravadora, Inside Records, e começou a lançar uma série de cds solo acústicos apresentando à cena independente dos Anos 2000 suas canções clássicas, só que com roupagens novas.

Pouco a pouco, seu trabalho foi retomando parte de sua relevância.

Faltava apenas que suas novas canções e seus novos discos conseguissem ser relevantes também.

Sua primeira tentativa nesse sentido, no LP "Time The Conqueror", de oito anos atrás, foi bastante válida, mas não exatamente bem sucedida.


Mas agora, com "Standing In The Breach" (Inside Records), Jackson finalmente marca pontos preciosos e não só resgata um frescor que suas composições haviam perdido com o passar do tempo, como embarca em reflexões sobre a vida, o amor, a política e a maturidade que surpreendem positivamente a todos os que acompanham seu trabalho.

A canção que abre o disco, "The Birds Of Saint Marks", foi composta em 1968 e chegou a ser gravada por Nico nas sessões de "Chelsea Girl", mas ficou de fora da seleção final, e permanecia inédita. É uma balada meio enigmática que lembra um pouco 'Chesnut Mare", de Roger McGuinn, com direito a um solo de guitarra de 12 cordas e vocais em harmonia à moda dos Byrds.

Jackson fez questão de resgatar essa velha canção para que desse o tom inicial a essa nova fase de sua vida e também para que servisse de fio condutor aos caminhos que se abrem nas canções seguintes do disco.

"Yeah Yeah", a segunda faixa, mergulha fundo na personalidade de uma mulher de forma leve e incisiva, alternando uma retórica madura com uma atitude bastante jovial.

Em "The Long Way Around", a faixa seguinte, Jackson prossegue sua viagem sentimental olhando para trás para poder encontrar a coerência que às vezes falta no cotidiano.

De "Leaving Winslow" e "It Could Be Anywhere" em diante, Jackson deixa claro que se sente perfeitamente bem mantendo-se em movimento contínuo no momento atual de sua vida.

Só nas duas faixas finais -- "Standing In The Breach" e "Here" -- Jackson flerta abertamente com a melancolia que celebrizou suas canções mais conhecidas.

Mas mesmo assim, essas canções não são aqueles "big pictures" desesperançados de outras épocas, como os de canções como "The Pretender" e "Running On Empty", dando a entender que enquanto não tivermos políticas individuais guiando nossas vidas, jamais seremos capaz de correr atrás de um sonho coletivo minimamente consistente.

Convenhamos: é uma volta e tanto para alguém que quase sempre se deixou guiar pela melancolia e pela incapacidade de crer num futuro melhor.



Trocando em miúdos, "Standing In The Breach" é uma bela coleção de novas canções.

Sua banda atual, comandada pelos excelentes guitarristas Greg Liesz e Val McCallum, consegue ser muito climática e também rápida e rasteira -- e deve funcionar muito bem em shows ao vivo.

Já seus 66 anos recém-completados parecem uma miragem, na medida em que ele demonstra estar muito mais jovem hoje do que em 1976, quando compunha versos desenganados como este aqui:

"I'm gonna be a happy idiot / And struggle for the legal tender / Where the ads take aim and lay their claim / To the heart and the soul of the spender / And believe in whatever may lie / In those things that money can buy / Thought true love could have been a contender / Are you there? / Say a prayer for the Pretender / Who started out so young and strong / Only to surrender"



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quarta-feira, setembro 24, 2014

O GAITISTA PAUL LAMB SE AFIRMA MAIS UMA VEZ COMO UM GRANDE ESTILISTA DO BLUES


Não existe instrumento mais emblemático do blues do que esse aí.

Desde sempre, músicos de blues costumam usar a guitarra acústica para prover a base melódica e percussiva das canções, e então acrescentam a gaita diatônica para dar uma harmonia adicional a essas canções -- não foi à toa que a gaita diatônica acabou ganhando o nome "harmonica".

Poucos artistas de blues usam a gaita cromática, mais complexa que a diatônica, e menos ainda usam a gaita tremolo.

Só mesmo Charlie Musselwhite, Magic Dick, Jerry Portnoy e um ou outro bluesman mais sofisticado as usam.

A harmonica, ao menos em princípio, é um instrumento pouco complexo e de fácil acesso a músicos instintivos e pouco gabaritados.

Mas, mesmo assim, sempre acontece de algum músico mais talentoso começar a explorar potenciais insuspeitos do instrumento e, eventualmente ir onde nenhum outro gaitista jamais esteve.



Paul Lamb é talvez o gaitista mais importante da cena inglesa hoje.

Com 59 anos de idade e uma carreira de quatro décadas, é no mínimo curioso que só agora ele comece a ser descoberto pelos americanos como um grande estilista do blues.

Durante os anos 70 e 80, Lamb cansou de acompanhar músicos americanos de passagem por Londres, ficou amigo deles todos, mas várias dificuldades de mercado o impediam de tentar emplacar um trabalho próprio.

Só no início dos anos 90, a muito custo, ele conseguiu gravar um disco com uma banda chamada The Blues Burgulars -- que, já no disco seguinte, mudaria o nome para The King Snakes.

De lá para cá, Paul Lamb e os King Snakes já gravaram nada menos que 17 discos, sempre mesclando blues, baladas e rock and roll com uma maestria invejável, sempre com seu jeito de cantar bem intenso e sua harmonica personalíssima sempre onipresente.



Esse recém-lançado "Hole In The Wall" (Secret Records) com certeza vai fazer alguns amigos na América na próxima temporada de Festivais, mas é endereçado mesmo ao mercado europeu, que conhece e prestigia o trabalho de Lamb há muitos anos.

É um disco delicioso, talvez o melhor que Paul Lamb gravou até hoje, repleto de truques que vão deixar gaitistas experientes com a pulga atrás da orelha e se perguntando:

Como é que esse cara consegue fazer isso?



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ROD PIAZZA & THE MIGHTY FLYERS: QUASE 50 ANOS FIÉIS AO ESPÍRITO DO WEST COAST BLUES


Rod Piazza é uma das figuras mais emblemáticas da cena do blues da California desde meados dos anos 60.

Desenvolveu um estilo que mescla o som encorpado e meio truculento do Chicago Blues com a suavidade do West Coast Blues -- tudo isso mesclado com toques de jazz bastante incomuns em gaitistas de blues.

Aluno muito aplicado de George 'Harmonica" Smith -- ex-sideman de Muddy Waters, que mudou de Chicago para Los Angeles por não aguentar mais o frio glacial da Capital do Blues --, Rod Piazza acabou virando seu aluno, e depois amigo e parceiro musical.

Primeiro no lendário grupo Bacon Fat -- talvez a única banda com dois gaitistas na história do blues -- que, sob a supervisão do grande produtor Mike Vernon, marcou época na cena do blues da Costa Oeste no final dos Anos 1960.

Depois, em diversas parcerias musicais ao longo dos Anos 1970, ao lado de grandes ícones do blues ainda na ativa

Não desgrudaram um do outro até o início dos anos 80, quando a saúde de Smith começou a falhar.

Piazza cuidou de seu amigo e professor até ele falecer, em 1983.


Foi mais ou menos por aí que Rod Piazza montou os Mighty Flyers com sua mulher, a pianista Honey Piazza, e uma penca de amigos -- entre eles os superguitarristas Kid Ramos e Rick Holstrom.

Com apenas dois discos para a Black Top Records, Rod, Honey e os Mighty Flyers se transformaram rapidamente na banda de blues mais badalada dos nightclubs de Los Angeles, recebendo eventualmente o amigo e fã Bruce Willis como crooner convidado.

De lá para cá, já gravaram quinze discos deliciosos que, se por um lado não trazem grandes novidades, servem para afirmar Rod Piazza cada vez mais como um bom cantor e compositor e um excelente band-leader que sempre consegue extrair performances inspiradíssimas de seus bandmates.



"Emergency Situation", novo disco de Rod Piazza & The Mighty Flyers,, traz duas novidades.

Uma deles é seu retorno ao selo Blind Pig depois de uma longa temporada na Delta Groove Records.

E outra é a frequência com que suas diversas gaitas dividem a cena com os saxofones de Ron Dziubla e Jim Jedekin.

Convenhamos: poucos gaitistas ousam enfrentar um saxofone como receio de levar a pior.

Dois saxofones então... é loucura.

Mas o caso é que estamos falando de Rod Piazza, não de um gaitista qualquer.

Ele é uma fera do West Coast Blues -- um grande craque tanto nas gaitas cromáticas quanto nas gaitas diatônicas, o que não é comum --, e a julgar por "Emergency Call", continua perigosíssimo.

O mesmo pode-se dizer dos implacáveis e rápidos no gatilho The Mighty Flyers, cuja formação atual conta com Honey Piazza (piano & Vocal), Henry Carvajal (guitarra e vocal), Norm Gonzales (baixo acústico) e David Kida (bateria).


A essa altura do campeonato, Rod Piazza já é mais veterano que a maioria de seus ídolos musicais.

São 66 anos de vida -- 48 deles de vida profissional dedicada ao blues

Mesmo assim, alguns puristas do blues ainda insistem em tratá-lo como um jovem artista desvinculado das tradições do blues.

Alguns mais despeitados até o acusam de ter crescido na sombra do prestígio de George Harmonica Smith.

Tudo bobagem.

Basta sentir o sopro forte de qualquer uma de suas gaitas para constatar que Rod Piazza não só é um grande mestre do blues moderno, mas também é, provavelmente, a maior autoridade em seu instrumento em todo o Sul da California.

Não é pouca coisa.








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O SUINGUE RASGADO DO WEST COAST BLUES DE RICK ESTRIN & THE NIGHTCATS


Rick Estrin é uma figuraça.

Está à frente dos Nightcats desde 1976.

Compondo, cantando, soprando sua gaita e fazendo o blues mais suingado e bem-humorado da Área da Baía de San Francisco, na California.

Detalhe: a banda se chamou Little Charlie & The Nightcats por 30 anos e 9 álbuns, devido ao grande guitarrista Little Charlie Baty, com quem Estrin dividia o comando da banda.


Sete anos atrás, no entanto, Little Charlie teve um enfarto violento.

Ficou impossibilitado de seguir em frente com a agenda da banda lotada de compromissos o ano inteiro.

Daí, se aposentou.

E passou o bastão para seu parceiro Estrin -- que imediatamente chamou o superguitarrista Kid Andersen para unir forças à banda, e seguiu em frente.

Desde então, Rick Estrin & the Nightcats já gravou dois excelentes discos de estúdio para a Alligator Records.

Tão bons ou melhores que os discos clássicos do Little Charlie & The Nightcats, gravados também para a Alligator.


Agora eles chegam com esse disco ao vivo, "You Asked For It... Live!", que dá a dimensão exata do poder de fogo e do jogo de cintura de Rick Estrin & The Nightcats sempre que sobe num palco.

É blues suingado pra ninguém botar defeito.

Com um pé no Texas, outro em Kansas City e o coração no West Coast Blues.

Para quem nunca teve a chance de vê-los ao vivo em suas apresentações anuais no Bourbon Street, em São Paulo, esse disco serve como consolo.

Já para quem teve a chance de vê-los ao vivo, fica apenas uma ressalva:

Estrin podia ter incluído no setlist deste disco alguns números menos ortodoxos de seus dois últimos trabalhos de estúdio, só para sentir a reação do público.

Em vez disso, preferiu apostar no certo e ir para a galera dando exatamente o que ela quer: o blend habitual de West Coast Blues e Jump Blues, sem surpresas.

O nome do disco entrega a intenção, e não dá para censurá-lo por fazer essa opção.

Na verdade, a idéia aqui em "You Asked For It... Live!" não é outra senão se esbaldar.

E isso Estrin e os rapazes fazem muito, muito bem.








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http://www.allmusic.com/artist/little-charlie-the-nightcats-mn0000257147/discography
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terça-feira, setembro 09, 2014

AS AVENTURAS MUSICAIS PELA ESPANHA DO INCANSÁVEL CALIFORNIANO STEVE WYNN


Steve Wynn é um losangeleño da gema, que sempre foi fascinado pelos novaiorquinos do Velvet Underground.

Tanto que, na hora de batizar o que viria a ser a banda de sua vida, ele escolheu o nome de um projeto musical bem antigo do velvet John Cale: The Dream Syndicate.

O nome trouxe sorte, e o Dream Syndicate brilhou forte na cena Paisley Underground -- um pouco mais intensamente que outras bandas contemporâneas em Los Angeles como as Bangles, os Long Ryders, o Rain Parade e o Green On Red.

Entre 1982 e 1989, The Dream Syndicate gravou uma série de discos muito densos e muito festejados na cena alternativa.

Seu disco de estréia, "The Days Of Wine And Roses", já é tido como um clássico, e fez deles uma das bandas influentes dos Anos 80, deixando suas marcas em grupos tão díspares quanto The Black Crowes e The Killers.

Verdade seja dita: desde The Doors uma banda não mergulhava tão fundo no imaginário psicodélico sombrio da cidade.



Mas então, depois de sete LPs muito bons, The Dream Syndicate começou a passar por turbulências internas e dar sinais claros de esgotamento criativo.

E o sempre inquieto e desgarrado Steve Wynn ao invés de esperar pelo pior, dissolveu a banda e partiu logo para uma carreira solo.

Uma carreira solo tão aventuresca em termos musicais quanto bem sucedida comercialmente, diga-se de passagem.

Desde 1990, Steve vem alternando discos solo bem elétricos, à moda de Neil Young, como "Kerosene Man" (1990) e "Dazzling Display" (1992), com trabalhos mais acústicos e reflexivos como "Fluorescent" (1994), sempre surpreendendo e contrariando as expectativas de seu público.

Mas o caso é que Steve Wynn adora fazer parte de bandas e, depois da dissolução do Dream Syndicate, nunca negou fogo sempre foi convidado a participar de alguma.

Tanto que, nesses últimos 25 anos, sempre nas férias de sua carreira solo, já embarcou em 3 bandas diferentes: Gutterball, Miracle 3 e Baseball Project.


Em 2000, durante uma excursão pela Europa ao lado do amigo Paco Loco e da banda Australian Crawl,  Steve acabou indo parar num estúdio de gravação em Andaluzia e gravou um disco ao lado dessa gente toda, chamado "Memento".

Esse disco, curiosamente, permaneceu inédito nos Estados Unidos, assim como um segundo chamado "Smack Dab", que ele e Paco gravaram em 2006 para uma gravadora espanhola.

Pois agora, agora a Omnivorous Records americana decidiu lançar os dois juntos num álbum só, chamado "Sketches Of Spain", e o resultado final é muito interessante.

Talvez por estar longe de casa, e liberto dos compromissos habituais de sua carreira solo, Steve Wynn ficou mais à vontade para fazer experiências musicais bem pouco ortodoxas, colocando sua voz encorpada sobre harmonias pop bem delicadas, só para ver se elas se sustentam em pé com tanto peso em cima delas.

O resultado é extremamente bem resolvido, ousado e divertido.

O caso é que "Sketches Of Spain" não é um disco fácil, e nem é endereçado a qualquer público.

É um trabalho extremamente honesto, concebido na estrada e gravado rapidamente, para que a essência dele não se perdesse numa gravação minuciosa e prolongada demais.

Corre à boca pequena que Steve e Paco acabam de gravar um terceiro disco juntos nos intervalos de sua recente Tournée de Verão pela Europa -- e quem ouviu as gravações afirma que a dobradinha dos dois nunca foi tão bem resolvida quanto agora.



2014 tem sido um ano está bem movimentado para Steve Wynn.

Começou com o lançamento de um belo disco ao vivo, bem folk, com releituras de suas canções favoritas de Bob Dylan.

Agora, chega este ótimos "Sketches Of Spain", e ainda este ano teremos o terceiro disco de Steve ao lado de seus comparsas do Baseball Project.

Como se tudo isso não bastasse, ele está saindo em tournée agora em Setembro com seus velhos comparsas do Dream Syndicate, para a alegria de seus velhos fãs -- e isso deve render, no mínimo, um DVD ao vivo.

Vida de artista independente é assim mesmo, bastante corrida.

Não existe na cena indie aquela manha de artista mainstream que grava um disco a cada três anos, alegando dificuldades para compor, trabalhando pouco.

Artista independente nunca para de fazer tournées, tem que ter disco novo todo ano para estar sempre em voga e ter sempre as portas abertas dos meios de divulgação sem ter que gastar fortunas em assessoria de imprensa e promoção.

Não é uma vida fácil.

Mas para gente inquieta como Steve Wynn é a única vida possível.



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