Mostrando postagens com marcador Wilco. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Wilco. Mostrar todas as postagens

sábado, dezembro 31, 2016

ALTOeCLARO ESCOLHE OS DEZ MELHORES DISCOS DE 2016 (por Chico Marques)

1. BLACK STAR (David Bowie)
Em seu disco de despedida, David Bowie convida o ouvinte para um mergulho na noite da alma. Nele, tudo soa estranhamente confortável e familiar. Ecos dos anos 70 saltam aos ouvidos o tempo todo. Tudo é de uma urgência impressionante. Nesse sentido, lembra um pouco "Station to Station", que foi gravado numa época em que ele vivia no limite, num flerte aberto com a morte -- que ele reverteu de forma brilhante ao longo da série incomparável de álbuns "Low", "Heroes", "Lodger" e "Scary Monsters". Apesar das muitas semelhanças musicais com alguns momentos mais densos de seu disco anterior, "The Next Day" (2013), que abria janelas tanto para seu passado quanto para seu futuro, "Blackstar" não é plural, e nem pretende abrir janela nenhuma para lugar algum. Funciona como um trem fantasma que vaga pela noite, contrapondo o passado à frente do futuro, e vice-versa. Sempre mantendo o imaginário a serviço da realidade, sem perder tempo correndo atrás do sentido da vida, pois não há tempo para isso.

2. POST POP DEPRESSION (Iggy Pop & Josh Homme)
Quem diria que duas das figuras mais loucas da cena do rock and roll iriam um dia unir forças num trabalho conjunto? Pois aconteceu: Iggy Pop e Josh Homme entraram no estúdio em Janeiro deste ano -- às próprias custas e ainda sob o impacto do morte de David Bowie -- e gravaram 9 canções cruas e extremamente contundentes compostas em parceria entre os dois e em apenas duas tardes de gravação. O resultado é cru, urgente, e ao mesmo tempo climático. E lembra eventualmente "Lust For Life", que Iggy e Bowie gravaram juntos em 1977, na Alemanha. De todas as homenagens e tributos realizados este ano pela memória de David Bowie, essa aqui é disparado a mais verdadeira e a mais relevante em termos artísticos.
3. BURN SOMETHING BEAUTIFUL (Alejandro Escovedo)
Aos 65 anos de idade, o sempre incansável Alejandro Escovedo continua correndo atrás no novas experiências musicais. Depois de três discos excelentes produzidos pelo lendário Tony Visconti e gravados com a banda do amigo Chuck Prophet, Escovedo uniu forças com Peter Buck (do REM) e Scott McCaughey (do Minus 5) e juntos compuseram as canções de "Burn Something Beautiful". A coisa toda funciona tão bem que dá para sentir claramente em cada canção do disco um pouco da personalidade musical de cada um dos três, tudo devidamente entrelaçado em guitarradas sensacionais e refrões contundentes. Em suma: um disco com espírito de aventura, algo difícil de ver num artista veterano.
4. SHINE A LIGHT (Billy Bragg & Joe Henry)
2016 foi realmente um ano em que muitos artistas apostaram em trabalhos em colaboração. Aqui, temos o príncipe do folk-punk inglês Billy Bragg unindo forças ao multitalentoso guitarrista e produtor americano Joe Henry em releituras delicadíssimas das clássicas canções de estrada que fizeram a fama de Woody Guthrie e tantos outros menestréis errantes. Para entrar no clima das canções, os dois decidiram apostar no inusitado e gravar o disco em plataformas de embarque e salões de estações ferroviárias entre Chicago e Los Angeles. O resultado é absolutamente reverente ao gênero, e ao mesmo tempo aventuresco em termos de produção. Uma ideia brilhante que acabou rendendo um disco delicioso.
5. THE WESTERNER (John Doe)
Desde os tempos do lendário grupo X nos Anos 80, quem segue a obra do ex-punk rocker John Doe está mais do que acostumado com suas idiossincrasias musicais. Mas The Westerner é, sem dúvida, a melhor, mais ousada e mais madura musicalmente delas todas. É um disco sobre o deserto, que alterna guitarradas à moda de Duane Eddy e Dick Dale com rocks e baladas climáticas que remetem aos Doors e, claro, ao X no início de carreira da banda. À primeira audição, pode até parecer que John Doe está fechando um círculo depois de 35 anos de carreira. Ele diz que não. Mas a sensação -- muito agradável -- que fica é essa. Um disco surpreendente.
6. PAGING MR. PROUST (The Jayhawks)
Com mais de 30 anos de carreira oscilando entre o alt-country e o indie-rock, os Jayhawks pareciam no início ser a reencarnação do espírito ousado do grupo Uncle Tupelo, mas acabaram se transformando numa espécie de "versão fim de século" dos country-rockers do Poco. Claro que não há nada de errado ou de indigno nisso, muito pelo contrário. Novamente sem Marc Olson, que já entrou e saiu da banda sabe-se lá quantas vezes, os integrantes remanescentes dos Jayhawks seguem em frente combinando suas preferências musicais, e, mesmo sem grandes pretenções, realizando um disco exemplar. A produção de Peter Buck, do REM, ajudou bastante na hora de colocar todos esses elementos em perspectiva. De resto, as harmonias vocais da banda continuam deliciosas e as canções são todas ótimas.    
7. SCHMILCO (Wilco)
O nome do novo disco do Wilco remete ao grande Harry Nillson, que gostava de usar a alcunha Schmillson, e anuncia mudanças muito curiosas na orientação musical da banda. É como se Jeff Tweedy estivesse trazendo para dentro o Wilco um pouco do clima caseiro experimental do disco que gravou ao lado de seu filho dois anos atrás -- que acabou servindo de trilha sonora para o premiadíssimo filme "Childhood", de Richard Linklater. Paralelo a esses experimentos, Tweedy embarca em canções confessionais com um sotaque country que remetem ao início de carreira do Wilco e ao trabalho dele com Jay Farrar no lendário Uncle Tupelo nos Anos 80. O resultado disso é surpreendente. É o Wilco "de volta para casa", só que musicalmente renovado, tematicamente redimensionado, e pronto para voar alto e longe novamente.
8. THE GHOSTS OF HIGHWAY 20 (Lucinda Williams)
Se hoje o termo Americana acabou virando gênero musical, uma das grandes responsáveis por isso foi Lucinda Williams. Ao lado de Lyle Lovett e outros artistas country crossover, ela conseguiu melhor do que ninguém atrair a atenção das plateias de rock para uma série de trabalhos musicais que desafiavam toda e qualquer classificação em meados dos Anos 90. Esse seu novo trabalho é uma colcha de retalhos espetacular, onde Lucinda trafega pelo country, pela soul music e pelos blues em canções poderosíssimas que são a cara dela -- ou seja: passionais, truculentas e inebriantes. Atenção para a releitura sensacional que ela elaborou para Factory, de Bruce Springsteen. Sem exagero, o melhor disco de Lucinda Williams desde o clássico "Car Wheels On A Gravel Road" (1998).
9. SOLID STATES (The Posies)
Outra banda que chega aos 30 anos de carreira com dignidade artística a toda prova. Sempre sob o comando do genial Ken Stringfellow, os Posies tem gravado pouco -- apenas um disco a cada 5 anos --, mas nunca decepcionam, e nunca abrem mão de correr riscos. Nesse novo disco, o power-pop característico da banda flui tranquilamente através de temas agridoces, como divórcios e perdas afetivas. Uma coleção de canções cativante e despretenciosa. Mas vital.
10. THIS GIRL'S IN LOVE - A BACHARACH & DAVID SONGBOOK (Rumer)
Para quem não conhece, Rumer é uma espécie de Karen Carpenter com alma. Ou uma espécie de Adele com estofo musical. Cantora poderosíssima, e de extremo bom gosto na hora de escolher repertório, ela acaba de gravar um tributo a Burt Bacharach e Hal David que é simplesmente desconcertamente de tão bonito. Desde aquele disco clássico de Ron Isley de 2003, ninguém passeava por esse repertório clássico dos Anos 60 com tamanha propriedade e conhecimento de causa. Se você ainda não conhece os "poderes" de Rumer, não há melhor maneira de começar do que por aqui.




quarta-feira, julho 29, 2015

O WILCO FAZ UMA ESPÉCIE DE AÇÃO DE GRAÇAS COM "STAR WARS", DISTRIBUÍDO GRATUITAMENTE PELA WEB.

por Chico Marques


Existem artistas que, quando esboçam carreiras solo paralelas ao trabalho das bandas de que fazem parte, fazem questão de seguir rotas diametralmente opostas, para evitar que seus trabalhos solo se confundam com os discos de carreira de suas bandas.

Mas também tem aqueles artistas que usam suas carreiras solo para mostrar que podem passar muito bem sem suas bandas.

Jeff Tweedy não se enquadra em nenhuma dessas duas categorias.

Quase todos os álbuns solo que gravou até agora foram tão idiossincráticos que nem chegam a configurar uma carreira solo.

O último deles, "Sukierae", gravado ano passado com seu filho Spencer, de 16 anos, foi o mais próximo que ele chegou de um verdadeiro álbum solo -- e mesmo assim, parecia mais um desfile de ótimas canções em demos bem despojadas e bem sucintas para um eventual novo disco do Wilco.

E foi, sem dúvida, um dos melhores e mais inusitados discos de 2014.
Pois bem: o novo álbum do Wilco, "Star Wars", parece uma consequência direta de "Sukierae".

Pela primeira vez, a maioria das canções de um disco do Wilco  tem como ponto de partida a vida familiar de Jeff Tweedy -- lembrando que "Sukierae" foi gravado enquanto sua mulher lutava contra um tipo raro de cancer, e agora, finalmente curada, ela serve de musa para a produção mais recente de canções de Jeff para a banda.

E também, pela primeira vez, o Wilco -- que em outras épocas teve problemas sérios com gravadoras que conspiraram abertamente para evitar o lançamento alguns de seus discos, como o hoje clássico "Yankee Hotel Foxtrot" -- resolveu não submeter seu novo trabalho a uma gravadora e preferiu lançá-lo gratuitamente na web através do website da banda. 

O motivo disso? 

Segundo Jeff Tweedy, "achamos que seria mais divertido assim". 

O que não impede do disco eventualmente aparecer à venda em breve nas lojas em edições para colecionadores.  
Na verdade, "Star Wars" foi lançado gratuitamente para celebrar os 20 anos da banda e, de quebra, promover a atual tournée americana do Wilco.

Mas também para agradecer a todos pela corrente positiva formada entre os fãs da banda durante a batalha contra o cancer travada pela mulher de Jeff Tweedy. 

Isso explica o nome do disco -- lembram de "Que a Força Esteja com Você"? -- e também a capa bem feminina, com uma pintura de um gatinho branco bem peludo e simpático.

"Star Wars" é um disco surpreendente pela brevidade. 

Tem apenas 33 minutos de duração, e nenhuma das canções avança além de 4 minutos. 

Além do mais, reúne um pouco de cada um dos 9 discos da banda, todos muito diferentes entre si. 

E, mesmo assim, mostra a banda tocando solto, buscando climas musicais inusitados e soando mais palatável ao gosto do grande público do que jamais soou antes. 

É tão coeso que fica até difícil escolher entre as canções que o compoem -- estão todas tão integradas e bem encadeadas que nem faz sentido destacá-las do conjunto.
O mais curioso de tudo é que, comercialmente falando, "Star Wars" poderia ter uma carreira interessante nas lojas. 

O que prova que, definitivamente, o Wilco não está nessa brincadeira pelo dinheiro. 

Aliás, nunca esteve. O Wilco é "fominha" no palco, adora fazer shows longos, e não nega fogo em tournées. Sentem-se perfeitamente bem na estrada.

Além do mais, o Wilco encara sua produção fonográfica como "souvenirs" para os frequentadores de seus shows. 

Até por isso, seus integrantes exigem liberdade criativa total na produção de seus discos e não aceitam qualquer tipo de interferência de qualquer gravadora em seu processo artístico.
O Wilco existe há vinte anos. 

Surgiu de uma desavença entre os guitarristas Jay Farrar e Jeff Tweedy, ambos do grupo alt-country Uncle Tupelo. 

Farrar queria que a banda tivesse uma identidade mais country-rock, seguindo a cartilha dos Byrds e dos Flying Burrito Brothers. 

Já Jeff Tweedy queria que a banda tivesse uma atitude mais experimental e não assumisse posições muito definidas, para ficar livre para experimentar à vontade e se renovar artisticamente com frequência.

Não houve acordo entre eles. 

E então, o Uncle Tupelo partiu em dois: Jay Farrar montou o Son Volt e Jeff Tweedy o Wilco. 

Deixou de ser uma grande banda indie para gerar duas das bandas mais influentes e vitais das duas últimas décadas. 

No caso específico do Wilco, virou uma banda que flerta abertamente com o mainstream sem jamais perder de vista suas raízes indie, nem se render ao classic rock adulto contemporâneo.

Com 20 anos nas costas, o Wilco se recusa a "amadurecer" em seus discos, com medo de firar previsível e perder sua identidade musical.

Daí, prefere circular em torno dos mesmos temas indefinidamente, repetindo -- com um approach bem original, diga-se de passagem -- um truque estilístico que aprenderam com outras bandas como o Grateful Dead e o Phish.

Sabem o que fazem. 

E fazem muito bem. 

São 10 álbuns de estúdio em 20 anos de carreira até agora, mais sabe-se lá quantos gravados ao vivo. 

Todos brilhantes. Todos impecáveis. Todos exuberantes. Como o gatinho da capa de "Star Wars"

 Que a Força esteja com Jeff Tweedy e seus comparsas!


AMOSTRA GRÁTIS




quinta-feira, fevereiro 05, 2015

JEFF TWEEDY ADIA MAIS UMA VEZ SUA ESTRÉIA SOLO NUM BELO ÁLBUM EM DUO COM SEU FILHO


Jeff Tweedy é o Rei da Melancolia na cena alternativa americana.

Seu trabalho à frente do Uncle Tupelo e do Wilco é impecável, tanto como compositor, cantor e guitarrista quanto como produtor e band-leader.

Tanto que, apesar dele gostar de se envolver em projetos paralelos de tempos em tempos -- como os grupos all-star Golden Smog, Minus 5 e Loose Fur --  nunca passou por sua cabeça embarcar numa carreira solo.

Mas então, ano passado, enquanto o Wilco celebrava seu aniversário de 20 anos com uma tournée para promover uma série de discos de material inédito de estúdio que estava arquivado, Jeff teve uma notícia triste: sua mulher, Susan Miller Tweedy, foi diagnosticada com um linfoma. 

Assim que a tournée terminou, Jeff se recolheu em casa para cuidar dela, e começou a trabalhar em seu estúdio caseiro uma série de demos com seu filho mais velho, Spencer Tweedy, de 18 anos de idade, e a maioria das canções nessas demos trata de vida familiar deles e da iminência dela ser golpeada com a saída de cena se sua mulher.




Como não eram canções adequadas para o Wilco, Jeff decidiu lançá-las naquele formato mesmo, com apenas dois musicos -- Spencer e ele -- participando, num álbum duplo de produção despojada, e assinado por Tweedy.

E então nasceu "Sukierae" (lançamento Anti/dBpm Records), um belo álbum duplo com 20 canções que desfilam uma musicalidade meio opaca se comparada ao Wilco, que nos convida para participar da intimidade artística de um núcleo familiar unido num esforço de tentar desfrutar do que podem ser seus últimos momentos.

Eu confesso que relutei um pouco a ouvir esse álbum, lançado em Outubro do ano passado, pois estava evitando trabalhos movidos por motivações assim. Mas então assisti "Boyhood", filme de Richard Linklater que ganhou vários Golden Globes, e fiquei encantado com a canção tema, "Summer Noon", que faz parte desse álbum, e daí em diante foi impossível não ser arrebatado pelo trabalho dos dois.



Nenhuma das canções de "Sukiarae" lida diretamente com os assuntos morte e crise familiar, mas algumas delas passam a limpo anos e anos de vida em comum de uma maneira reflexiva e eventualmente melancólica. Já outras tentam tirar leite de pedra, falando sobre as alegrias da vida cotidiana sem conseguir esboçar um sorriso.

A névoa que cerca "Sukiarae" é proposital, e funciona como uma defesa para Jeff e Spencer Tweedy. 

Por outros lado, o jeito aventuresco e meio amalucado de Spencer tocar bateria acabou permitindo a Jeff ser mais inventivo e audacioso como solista na guitarra -- algo que, no Wilco, ele normalmente evita fazer, preferindo sempre ser o maestro da banda e não o solista.




"Sukiarae" é um belo trabalho, uma comunhão de pai e filho muito delicada e preciosa em termos musicais.

Se eu tiver que escolher minhas canções favoritas, ficaria com a faixa de abertura "Don't Let Me Be So Understood", "New Moon" e "Wait For Love" -- além de "Summer Noon", claro.

É um disco perfeito para se ouvir sozinho num dia de chuva, ou num dia frio.

Ao final, vem a constatação de que a vida é muito melhor sempre que estamos repartindo a mesma órbita de quem a gente ama.


WEBSITES OFICIAIS
http://spencertweedy.com/
http://wilcoworld.net/#!/

AMOSTRAS GRÁTIS

sábado, abril 13, 2013

BILLY BRAGG CHEGA À MATURIDADE AINDA MAIS INCONFORMADO EM "TOOTH & NAIL"


Um dos maiores desafios para qualquer artista popular é, e sempre será, permanecer relevante depois de se estabelecer no mercado.

Neil Young abordou esse dilema em canções como “Thrasher”, talvez a mais contundente delas, falando de amigos perdidos em canyons de cristal, absorvidos pela vaidade e encastelados no estrelato, incapazes de perceber que seu métier só faz sentido enquanto eles conseguirem se reinventar a cada nova estação.

Billy Bragg sabe disso melhor do que ninguém.

Desde que surgiu, 30 anos atrás, em meio à efervecência pós-punk, em discos contundentes como “Talking With The Taxman About Poetry” e “Workers Playtime” ele personifica uma versão pós-moderna de Woody Guthrie. Isso em plena Era Margareth Thatcher, No início, foi acusado de ser apenas um "poser" curioso. Mas, com os anos, foi-se revelando um ótimo compositor, extremamente hábil tanto com letras quanto com melodias, e um artista muito peculiar.

De lá para cá já se reinventou algumas vezes, unindo forças aos americanos do Wilco e, mais recentemente, integrando a banda The Blokes, sempre alternando seu discurso político com um discurso amoroso denso e intenso, trafegando pelos mais diversos gêneros musicais com sua guitarra na mão e uma atitude nunca menos que contundente.


E não é que em seu mais novo trabalho, “Tooth & Nail”, ele se reinventa mais uma vez?

Gravado em Santa Mônica, Califórnia, com o suporte precioso do produtor Joe Henry e dos amigos The Blokes, Bragg deixa seus temas politizados um pouco de lado e investe numa mensagem mais universal, expandindo sua retórica -- sempre incisiva, diga-se de passagem -- a assuntos ainda não devidamente explorados em seu trabalho -- às vezes num tom de crônica, outras vezes num tom mais confessional..

O resultado disso são canções desconcertantes como “Your Name On My Tongue”, ‘Swallow My Pride” e “No One Knows Nothing Anymore”. Ou então canções delicadas e assováveis, como “January Song” e “Tomorrow’s Gonna Be A Better Day”, que abrem e fecham o disco, respectivamente.

Em meio a tudo isso, temos como termômetro do "estado de coisas atual de Billy Bragg" uma bela e sintomática releitura de “I Ain’t Got No Home Anymore”, de Woody Guthrie. Que, de certa forma, indica que nosso herói está nos dias de hoje mais propenso a conjugar seu ativismo político com sua condição de cidadão do mundo do que ficar restrito à cena trabalhista inglesa que sempre defendeu.

(não vou me espantar se, a essa altura do campeonato, já tiver alguns velhos colegas folkies esquerdofrênicos acusando Bragg de seu um traidor da causa. Bob "Judas" Dylan conhece bem os métodos dessa gente.)



Enfim, Billy Bragg esá comemorando 30 anos de carreira questionando se seu trabalho ainda faz sentido no mundo de hoje.

30 anos que não pesam na bagagem, e que, de quebra, fornecem um diferencial artístico que poucos artistas mais jovens conseguem ostentar.

Além, é claro, de mais perplexidade do que conforto, mais angústia que alívio, e as habituais doses cavalares de som e fúria -- como ele demonstra em “No One Knows Nothing Anymore”, a canção mais truculenta deste disco:

"Let's stop pretending / We can manage our way out of here / Let's stop defending the indefensible / Let's stop relying on / The lecturing of the experts / Whose spin just makes our plight incomprehensible/ High up on a mountain top, somebody with a skinhead crop / Is thinking deep thoughts for us all / Serenity is all around, but if you listen /You can hear the sound / Of one head being banged against the wall"




BIO-DISCOGRAFIA



WEBSITE OFICIAL



AMOSTRAS GRÁTIS

sábado, abril 28, 2012

BILLY BRAGG E WILCO: REDIMENSIONANDO O LEGADO DE WOODY GUTHRIE PARA AS GERAÇÕES QUE AINDA ESTÃO POR VIR.


A América comemora o centenário de Woody Guthrie este ano.

Woody Guthrie, para quem não conhece, foi um folk singer combativo e um compositor implacável com as mazelas que oprimiam a classe trabalhadora americana nos anos 30 e 40.

Herói musical e existencial de nove em cada dez jovens folk singers inconformados com o 'Sistema" surgidos nos anos 60 -- entre eles, o jovem Bob Dylan --, Guthrie virou lenda por correr os quatro cantos da América com seu violão, levando sua mensagem populista e pró-Sindicalista onde quer que ela fosse incômoda ao "Establishment" naquela época.

Mas o diabo é tempo passou, sua música foi ficando datada demais, e sobreviveu esses anos todos a duras penas, apesar de ter sido agraciada com dois revivals -- um na ocasião de sua morte em 1967, e outro em 1976 no lançamento de sua cinebiografia "Bound For Glory", dirigida por Hal Ashby e com David "Kung-Fu" Carradine interpretando Woody.

Pois bem: vinte anos atrás, os herdeiros de Woody Guthrie negociaram com a editora musical da Warner Bros. Records uma série de manuscritos dele com dezenas de letras para canções que ele nunca cegou a musicar -- em parte por serem "off-topic" demais para sua reputação de folkie politizado.

A idéia do pessoal da Warner era entregar essas letras para compositores de prestígio com alguma afinidade com Guthrie, para que eles as musicasse.

Mas como era um projeto caro e complicado, que não entusiasmava a ninguém na direção da gravadora, nunca entrou nas prioridades principais deles.



Até que um dia alguém comentou sobre as letras de Woody Guthrie com Jeff Tweedy, do grupo Wilco, e também com o folk singer inglês Billy Bragg, e eles se resolveram encampar o projeto de virar parceiros em composições de Woody Guthrie.

Mas sem reverências. Trataram Woody Guthrie de igual para igual. Billy Bragg compôs algumas canções, Jeff Tweedy e seus parceiros do Wilco compuseram outras, e nessa brincadeira eles conseguiram fazer Woody Guthrie renascer como artista.

Até porque muitas dessas letras revelam facetas muito curiosas de Woody, que não tem nada a ver com o folk singer de protesto.

Quem poderia imaginar que ele gostava tanto de Ingrid Bergman a ponto de compor uma canção para ela?

Ou que ele poderia ser capaz de compor canções como "Christ For President" e "My Flying Saucer"?

Ou ainda que ele fosse capaz de tanto lirismo quanto em "Someday Some Morning Sometime" ou "At My Window Sad And Lonely"?


Tudo isso veio à tona em dois discos magníficos que são verdadeiras revelações musicais de Billy Bragg & Wilco (com participação especial da delicadíssima Natalie Merchant), chamados "Mermaid Avenue" (1997) e "Mermaid Avenue 2" (2000).

Mas o que ninguém sabia é que as sobras de estúdio dessas sessões de gravação ainda continham tantas preciosidades.


Pois bem, agora vem tudo à tona em "Mermaid Sessions - The Complete Sessions", com os dois cds originais, mais um terceiro repleto de faixas acabadas que ficaram de fora, e ainda alguns demos bem reveladoras de como foi árduo, mas divertido, o processo de composição de Bragg e Tweedy.

São mais de 3 horas de música popular americana de primera grandeza, produzida por compositores da gema do folk e do rock and roll.

É uma daquelas associações que, em princípio, tinha tudo para dar errado.

Mas acabou saindo melhor... muito melhor que a encomenda.



INFO:
 http://www.allmusic.com/artist/woody-guthrie-p1995/biography
http://www.allmusic.com/artist/billy-bragg-p3761/biography
 http://www.allmusic.com/artist/wilco-p142015/biography
 
DISCOGRAFIAS:
http://www.allmusic.com/artist/woody-guthrie-p1995/discography
http://www.allmusic.com/artist/billy-bragg-p3761/discography
http://www.allmusic.com/artist/wilco-p142015/discography

WEBSITES OFICIAIS:
 http://www.woodyguthrie.org/
http://billybragg.com/
 http://wilcoworld.net/

AMOSTRAS GRÁTIS: