quinta-feira, junho 15, 2006
Cassandra Wilson rompe com tradição do jazz em novo álbum (por Carlos Calado para a FOLHA)
Quem conhece os discos que Cassandra Wilson gravou na última década sabe que ela já tinha pouco a ver com Diana Krall, Jane Monheit, Michael Bublé e outros vocalistas da cena atual do jazz, que insistem em cantar os standards dos anos 30 e 40 que Ella Fitzgerald e outras divas do gênero interpretaram tão bem.
Agora, com "Thunderbird", Cassandra deve chocar mais ainda os conservadores. Se já tinha abandonado o repertório tradicional do jazz, a intérprete e compositora rompe de vez com as sonoridades convencionais do gênero, num álbum carregado de guitarras, teclados, efeitos eletrônicos e doses de experimentação e estranheza.
A primeira faixa já provoca um certo susto. Estruturada a partir de um "sample" da Wild Tchoupitoulas (divertida banda de Nova Orleans), "Go to Mexico" é uma canção dançante de formato pop, com um leve sabor de hip hop. É possível que, ao ouvi-la, um desavisado até se pergunte: "Isso é jazz?"
"Closer to You" (de Jacob Dylan), a faixa seguinte, também é uma canção tipicamente pop. Tingida por teclados e bateria programada, surge em um arranjo frio que esquenta com a voz grave e densa de Cassandra. Algo semelhante acontece em "It Would Be So Easy", um R&B sombrio, que ganha substância com os sofisticados vocais da cantora.
No fundo, não importa que se trate de uma balada, um funk ou um reggae. Com duas décadas de estrada e muita inquietação, hoje Cassandra é capaz de injetar essência jazzística em qualquer gênero musical. Basta ouvir como ela traz um novo frescor à tradição do blues, gênero ancestral de toda a música popular dos EUA, presente em quatro faixas do álbum.
Como a versão da clássica "Easy Rider", que começa de modo etéreo, só com voz e a guitarra de Marc Ribot, para desembocar em uma performance de alta voltagem. Já na versão "funky" de "I Want to Be Loved" (Willie Dixon), que conta com a participação do bluesman e guitarrista Keb Mo, Cassandra dá um show de sensualidade. Claro que alguns méritos desse álbum, especialmente quanto à sonoridade nada convencional e ao aspecto meio sujo dos arranjos, devem ser creditados ao produtor T Bone Burnett, conhecido por gravações das bandas Wallflowers e Counting Crows.
É provável que os jazzistas mais ortodoxos acusem Cassandra de ter se vendido ao pop, mais ou menos como fizeram no lançamento do inovador "Blue Light Til Dawn", que marcou outra guinada radical da cantora, em 1993.
"Thunderbird" é um álbum meio estranho e desalinhavado que cresce a cada audição. Pode não agradar a todos os fãs da cantora, mas é um marco de seu compromisso pela criação de um jazz com a cara dos dias de hoje.
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