quinta-feira, dezembro 08, 2005

Sobre a entrevista inedita de John Lennon, divulgada essa semana (por Chico Marques)


Beatlemaníacos em geral tendem a romancear a história dos Beatles. Esquecem que a banda tinha negócios atrapalhados, relações estranhas com sua gravadora, seus empresários e –mais importante de tudo– não sabia lidar direito com o ‘big business’ dos anos 60. Então, na hora de tentar analisar o porquê dos Beatles terem encerrado as atividades em 1970, esses beatlemaníacos sempre acabam buscando explicações em questões pessoais, colocando a culpa em Yoko Ono, Linda Eastman, Allen Klein ou em outros que faziam parte da corte dos rapazes.

Na verdade, os Beatles começaram a acabar em 6 de fevereiro de 1967, quando cometeram o maior erro comercial de suas carreiras, fechando um contrato que os manteve atrelados à EMI Records até 1976. Na época, parecia um bom negócio. Eles ganhariam direito a montar um selo próprio e poderiam administrar a carreira da banda como quisessem, com autonomia artística total. Então nasceu a Apple Records.

Os executivos escolhidos para a gravadora eram todos amigos pessoais dos quatro. Começaram a apostar em artistas novos – James Taylor, Jackie Lomax, Badfinger – e gastaram pequenas fortunas promovendo discos que renderam muito menos que o esperado. Foi quando a Apple começou a afundar em dívidas com a EMI, grupo ao qual os Beatles estavam atrelados, dando início a uma queda de braço complicada entre as duas empresas. E a Apple, claro, levou a pior. Faliu. Foi incorporada pela EMI. Daí por diante, o contrato de exclusividade assinado por eles em 1967 virou uma prisão.

O empresário Allen Klein entrou na história como negociador para tentar interceder a favor deles com a EMI. Mas não deu certo. Então os quatro resolveram investir contra a própria banda para tentar virar o jogo, obrigando a EMI a reavaliar o contrato. Começaram a plantar fofocas na imprensa dizendo que os Beatles estavam se dissolvendo. Curiosamente, a EMI não cedeu às pressões, deixou a banda morrer e ainda os obrigou a permanecer gravando discos solo para a Apple por mais seis anos.

Só em 1976 eles finalmente ganharam autonomia novamente. Paul McCartney assinou o contrato mais lucrativo da história na época, com a Capitol. George Harrison seguiu para a Warner Bros. Ringo Starr se acertou com a Atlantic, e John Lennon sumiu do mapa, saindo da cena musical sem dar maiores explicações para salvar seu casamento com Yoko Ono.


Nada disso desmerece o legado musical dos Beatles. Mas é importante resgatar essas histórias de bastidores para que todos entendam de uma vez por todas que os Beatles não acabaram apenas por razões conjugais e pessoais. O que matou os Beatles foi na verdade o grande sonho deles: a Apple Records.

E então, quando John Lennon declarou para o mundo que “o sonho acabou” – e isso foi entendido como uma metáfora para a mudança dos tempos –, tenham certeza que essa afirmação era bem mais concreta e pessoal do que parecia naquele momento de decepção coletiva.

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