quinta-feira, maio 31, 2012

MELANCOLIA, QUEM DIRIA, TEU NOME É IGGY POP


Tem muita gente que não consegue entender a lógica que rege a carreira de Iggy Pop.

Eu consigo.

Na minha cabeça, faz todo o sentido do mundo ele ter reatado sete anos atrás com seus velhos companheiros dos Stooges, com quem brilhara em três LPs armados e extremamente perigosos gravados entre 1969 e 1973 – o último deles, “Raw Power”, produzido por seu amigo David Bowie, que mais adiante iria guiá-lo num flerte musical sombrio com a música eletrônica em dois discos solo magníficos gravados na Alemanha: “The Idiot” e “Lust For Life”.

Da mesma forma, não consigo ver nada de muito estranho no fato dele ter insistido por tanto tempo numa atitude roqueira que exigia demais dele em termos físicos -- para então agora, aos 65 anos de idade, aparentemente de uma hora para outra, começar a posar de chansonier e passar a gravar discos com velhas canções românticas.

Na verdade, essa "trip de chansonier" começou quando convidaram Iggy para participar de um projeto de releituras de canções dos filmes de James Bond, e entregaram a ele a tarefa difícil de regravar “We Have All The Time In The World”, originalmente defendida por Louis Armstrong – que ele tirou de letra, soltando sua voz cavernosa com delicadeza e com o peso existencial que a canção exigia.

O passo seguinte foi participar de um dueto em princípio improvável com sua musa Françoise Hardy em “I'll Be Seeing You”, com resultados absolutamente divinos.

Foi daí em diante que Iggy começou a vislumbrar a possibilidade de seguir gravando discos em inglês ou em francês sem precisar se entregar mais a tournées tão fisicamente desgastantes quanto as que fazia antes.


Começou em 2009, quando surpreendeu a todos com “Préliminaires”, uma climática coleção de canções baladas de Leonard Cohen, de Serge Gainsbourg e dele próprio..

E agora está de volta com este “Après”, seu primeiro disco apenas como intérprete, reunindo um repertório composto quase que exclusivamente por canções românticas clássicas – a maioria em francês, e algumas poucas em inglês, com todas com um tom bem europeu nos arranjos.

É muito engraçado ouvir Iggy cantando coisas como “Et si tu n'existais pas”, de Joe Dassin, ou “La Javanaise”, de Serge Gainsbourg, alternando sopros e cordas com uma bateria dura, típica de bateristas de rock, o que provoca um estranhamento bastante interessante.

Sua interpretação de “La Vie Em Rose” é quase um remake da versão de Louis Armstrong, e surpreende pela passionalidade com que Iggy passeia pelos versos belíssimos de Jacques Brel. Que contrasta com a leveza de “Syracuse” e de “Les Passantes”, ambas lindíssimas, dois triunfos artísticos indiscutíveis.

Já os números em inglês deixam um pouco a desejar.

Não que Iggy não tenha se esmerado neles.

É que vários dos arranjos são certinhos demais para ele. Parecem até base de karaokê. "Michelle", de Lennon & McCartney, e "Everybody´s Talkin´", de Fred Neil, padecem desse mal.

A única exceção à regra é a releitura de “Only The Lonely”, cantada de um jeito meio engasgado e esbanjando uma melancolia de meia idade que não combina, em princípio, com a notória hiperatividade de Iggy Pop.


Pesando prós e contras, essa empreitada de Iggy como chansonier é bem positiva, e muito mais honesta que qualquer um dos 4 volumes do "Great American Songbook" que Rod Stewart andou gravando de dez anos para cá.

O que nos discos de Rod soa cafageste, no de Iggy soa autêntico até o talo, revelando uma faceta absolutamente surpreendente de seu talento.

Reforça mais uma vez a tese de que Iggy Pop é a criatura mais louca e improvável que o rock and roll já produziu.

Torço para que, em sua próxima empreitada no gênero, ele escolha canções mais com cara de dancehalls e menos com cara de cabarets.

Não é por nada -- é que vê-lo posando de crooner de orquestra e cantando de smoking vai ser simplesmente o máximo!


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terça-feira, maio 29, 2012

LISBOA, TOKYO E NEW ORLEANS CONHECEM BEM VALÉRIA OLIVEIRA. FALTA O BRASIL DESCOBRÍ-LA.


Impossível não ficar encantado com Valéria Oliveira.

Confesso que não conhecia o trabalho dessa talentosa cantora e compositora do Rio Grande do Norte, até que um dia desses meu velho amigo Wagner Parra me chamou para conhecer uns LPs de artistas independentes -- todos prensados em fábricas velhas de LPs na República Tcheca, para fugir aos preços extorsivos praticados aqui no Brasil pela fábrica da Deckdisc, que monopoliza o mercado -- que tinham acabado de chegar à sua loja.

Valéria não é nenhuma novata no métier.

Já tem vinte anos de carreira e nove discos gravados -- sete como intérprete, os dois últimos cantando material próprio, e mais um praticamente pronto para lançar no segundo semestre deste ano.

Sua voz intensa e encorpada lembra em princípio uma Elis Regina em tom menor.

Mas sua atitude musical, sempre plural e modernosa, sugere um cruzamento improvável entre Marisa Monte, Clara Nunes e Regina Spektor – como se algo assim fosse possível.

Acreditem: é.


“No Ar” -- seu disco de 2009, que só tive a chance de ouvir agora -- é muito, mas muito bom, e chega extremamente bem recomendado por jornalistas musicais sempre atentos como Antonio Carlos Miguel e Nelson Motta.

Revela uma compositora intensa, que nunca busca soluções fáceis, tanto nas letras quanto nas melodias, mas sempre privilegia o inusitado e canta suas canções com uma serenidade e uma convicção cativantes.

Eu adorei, por exemplo, o tom bluesy de “Madrugadas Frias”, o pop perigoso de “Viver e Dançar” e sobretudo a inclassificável (e adorável) “Sofrer Faz Parte do Meu Vocabulário”.

E tem mais, muito mais, de onde vieram essas três, vale a pena conhecer esse belo trabalho dessa cantora e compositora potiguar.


Valéria Oliveira é um daqueles tesouros escondidos da música brasileira que, paradoxalmente, entra com mais facilidade no mercado exterior do que no daqui.

Para se ter uma idéia, em Lisboa o trabalho de Valéria já é bem conhecido -- resultado de várias visitas promocionais a Portugal.

No Japão, ela já se apresentou diversas vezes, .

Mês passado, foi convidada para fazer uma pequena temporada num nightclub do French Quarter, em New Orleans.

No Rio e em São Paulo, no entanto, só um ou outro ouvinte mais antenado sabe bem quem é essa moça talentosa.

Está mais do que na hora disso começar a mudar.


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LP À VENDA NA DISQUERIA (SANTOS SP)

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JOE WALSH ASSUME SUA PORÇÃO ANALÓGICA SEM MEDO DE VIRAR UM DINOSSAURO DO ROCK



Em 1970, quando Pete Townshend ouviu o LP “The James Gang Rides Again”, ele quase enlouqueceu ao descobrir em Joe Walsh -- comandante da James Gang -- uma espécie de alma gêmea dele, e não sossegou enquanto não foi conhecê-lo pessoalmente.

É fácil de entender o porquê disso. 

Os pontos de vista musicais dos dois convergiam de uma maneira muito interessante -- tanto que muitas idéias musicais que Townshend ouviu no disco da James Gang foram preciosas na elaboração de “Who´s Next”, o grande álbum do Who de 1971.

Não demorou e os dois se conheceram pessoalmente, viraram amigos e nunca mais pararam de trocar figurinhas musicais.



As semelhanças entre Walsh e Townshend não eram poucas.

Assim como Townshend, Joe Walsh também tocava guitarras, piano, órgão, sintetizadores, compunha e era um arranjador de mão cheia.

Assim como Townshend, o toque de Walsh na guitarra era único – em particular no uso essencialmente roqueiro do slide, pela primeiríssima vez totalmente fora do contexto do blues.

Para completar o quadro, a voz de Walsh, assim como a de Townshend, era bem pequena – deficiência que Walsh sempre contornou com truques de amplificação que a faziam soar estranhamente distante na mixagem final, como se estivesse saindo de um megafone pouco amplificado, o que deixou Townshend fascinado.


Joe Walsh deixou a James Gang em 1972 para seguir uma carreira solo extremamente bem sucedida e virar um dos músicos mais festejados da cena americana – ainda mais depois que uniu forças com os Eagles (foto), tornando-se o guitarrista principal da banda.
 
Só que, infelizmente, com o advento dos famigerados anos 1980, Walsh viu a venda de seus discos cair drasticamente ao longo dos anos e, para não ter que se render às novas regras pouco confortáveis do mercado, manteve-se como guitarrista dos Eagles e uniu forças ao seu velho camarada Ringo Starr, estabelecendo uma parceria musical que dura até os dias de hoje.

Com isso, sua carreira solo entrou numa hibernação bastante prolongada. 

Seu último disco solo, “Songs From A Dying Planet”, data de 1993.


E então, eis que, 19 anos mais tarde, aos 65 anos de idade, Joe Walsh ressurge com um disco impecável, vigoroso, muito divertido e eloqüente da primeira à última faixa.

“Analog Man” é uma brincadeira bem bacana que ele e o produtor Jeff Lynne fizeram em Nashville pouco antes das gravações do último disco de Paul McCartney, "Kisses On The Bottom", do qual participa.

É um disco descomplicado, feito com poucos recursos e muita criatividade, onde Walsh promove as guitarradas habituais sobre várias texturas de bateria, e contracena com efeitos especiais muito divertidos e coloridos criados por um rejuvenecido Jeff Lynne.

Aliás, qualquer músico rejuvenece ao lado de Joe Walsh.

Seu bom humor é contagiante, e está presente em tudo o que ele faz.

Já na faixa título, que abre o disco, ele fala das dificuldades em adequar sua personalidade analógica à era digital -- e só os mais desavisados acreditam nisso, já que todo o aparato envolvido na faixa soa propositadamente digital, com exceção da guitarra, que entra sempre furiosa.

Todas as faixas de “Analog Man” são de altíssimo gabarito -- certamente são o melhor da produção de Walsh nesses últimos 19 anos, agora finalmente fora da gaveta.

Tem coisas surpreendentes como ‘Spanish Dancer” e o tema instrumental “Índia”, que encerra o disco, mas no geral o que predomina é aquele tom familiar dos discos que Walsh gravou nos anos 70 e 80, que permanece intacto.


Analógico ou não, o trabalho de Joe Walsh permanece ousado e moderno até o talo.

“Analog man” é, sem exagero, seu melhor disco desde “The Confessor”, de 1984, e seu trabalho mais acessível desde “...But Seriously, Folks”.

É tão bom, mas tão bom, que eu sou capaz de apostar que vai provocar em Pete Townshend o mesmo efeito que “The James Gang Rides Again” provocou 42 anos atrás.



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segunda-feira, maio 28, 2012

RESGATANDO A MÚSICA DE GARY PRIMICH E A ALMA DO BLUES MODERNO, NUMA TACADA SÓ.



Gary Primich nasceu em Chicago, e se escolou no Blues ainda menino, olhando e escutando os mestres do gênero tocando ao vivo na lendária Maxwell Street.

Como muitos músicos de blues que batalhavam por um lugar ao sol na cena musical da cidade, Gary logo percebeu o quão limitado e difícil seria perseguir uma carreira por ali, e não hesitou assim que surgiu uma oportunidade de trabalho em Austin, capital do Texas.

Sua carreira de cantor, gaitista, guitarrista e band-leader começa aí, ao lado do lendário baterista Jimmy Carl Black (dos Mothers Of Invention, de Frank Zappa) e à frente do grupo The Mannish Boys, que eles fundaram.

Depois de gravar dois discos com a banda, e de tocar com praticamente todo mundo na cena local, Gary Primich decidiu que estava na hora de sair em carreira solo.

Entre 1991 e 2006, gravou nove LPs impecáveis que projetaram seu nome por todos os cantos onde se respira blues no Planeta Terra.

E então, depois de diversas tournées pela Europa e pelo Japão, chega a notícia, em 2007, de que Gary Primich acabara de morreu em sua casa em Austin de uma dose de heroína mal administrada, interrompendo uma das trajetórias mais notáveis na cena do blues moderno.


Cinco anos depois desse triste dia, chega às lojas a primeira panorâmica de carreira de Gary Primich: uma bela antologia dupla entitulada “Just A Little Bit More”.

O primeiro dos dois cds passeia pelos seus discos originais, revelando mais uma vez o estilista fabuloso e o músico absolutamente plural que ele era.

Tem desde blues e boogie woogie rasgado até rock and roll, rockabilly e clássicos do Great American Songbook – a releitura que ele faz para “September Song” é de arrepiar de tão linda.

Já o segundo cd é sob medida para admiradores saudosos, assim como eu, e traz gravações inéditas feitas com os amigos do Omar & The Howlers, com o genial Gary Clark Jr. – que abriu os shows brasileiros da última tournée de Eric Clapton – e muitos outros craques da cena musical vibrante de Austin.


Gary Primich talvez tenha sido o melhor gaitista de sua geração.

Ouvi-lo tocar era um assombro: parecia até que estávamos diante do lendário Big Walter Horton, tamanho o vigor de seu sopro.

Mas certamente não foi o único bom gaitista dessa safra, e felizmente deixou uma legião de seguidores e admiradores.

Se você é um deles, prepare-se para emoções fortes com esse “Just A Little Bit More”.

A alma do blues moderno está aqui. 

Por inteiro.


 
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imich

quarta-feira, maio 23, 2012

OS RASCUNHOS PRECIOSOS DE PETE TOWNSHEND EM "THE QUADROPHENIA DEMOS"


Pete Townshend nasceu com alma de produtor.

Ninguém pode acusá-lo de não saber para onde pretendia levar suas canções em suas gravações definitivas – fossem elas solo ou não.

A partir de “Tommy” -- o primeiro disco conceitual que compôs e arranjou para  The Who, em 1969 -- Pete sempre teve o cuidado de gravar demos extremamente detalhadas, muitas vezes tocando todos os instrumentos, para que nenhum membro da banda e(ou) nenhum produtor contratado por sua gravadora se atrevesse a alterar a essência de suas composições.

Nisso ele era irredutível: tudo o que queria que essas canções fossem em suas versões finais já estava devidamente registrado em suas demos.

Faltava apenas acrescentar alguma maquilagem e, claro, o som e a fúria do The Who.


Pois bem: Pete Townshend guardou essa infinidade de fitas demo extremamente bem acabadas com muito carinho por quase 15 anos.

Até que, no início dos anos 80, num período de baixa criativa, optou por cumprir uma obrigação contratual com sua gravadora reunindo suas demos mais expressivas num álbum duplo descompromissado chamado “Scoop”.

Para surpresa geral – dele inclusive --, “Scoop” foi um sucesso estrondoso.

Crítica e público ficaram encantados com os rascunhos musicais estilosos de Pete Townshend, que expunham sua genialidade musical a olhos vistos.

Por conta disso, não só alguns outros volumes de “Scoop” vieram a público nos anos seguintes, como também vários outros artistas resolveram também começar a publicar suas demos -- o que acabou criando uma nova tendência na Indústria Fonográfica.

E então, depois de publicar vários discos nesse formato -- sempre muito bem recebidos por seus fãs --, eis que Pete Townshend decide resgatar as demos que deram origem a “Quadrophenia”, a obra mais ambiciosa da carreira do The Who, e que permaneciam estranhamente inéditas até agora.

Na verdade, Pete estava mesmo é esperando que "Quadrophenia" completasse 40 anos de vida para trazê-las a público. 

“Quadrophenia Demos Vol.1” e “Quadrophenia Demos Vol.2” chegam agora às lojas num formato no mínimo curioso: dois LPs de 10 polegadas cada, com quase todas as canções contidas no disco original.

São demos preciosísimas. Que tem tudo, menos cara de gravações caseiras.

É uma delícia poder ouvir “The Real Me” e "The Punk Meets The Godfather" ainda sem as explosões vocais de Roger Daltrey, mas com Townshend castigando seu violão de forma cruel sobre uma base rítmica bem suave.

E também é uma grata surpresa perceber que todo aquele encadeamento envolvente que resgata, em meio a cada música, o tema recorrente “Love Reign Over Me” já estava previsto num estágio bem inicial da elaboração de “Quadrophenia”.

Enfim: é um grande prazer escutar novamente todos aqueles temas bem familiares em versões quase intimistas, mas já com sua grandeza plenamente revelada.

Se na literatura muitos escritores só se revelam por inteiro depois de investigarmos seus diários, anotações ou esboços, na música de Pete Townshend a mesma premissa é verdadeira.

Pete Narigudo, você é genial....




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terça-feira, maio 22, 2012

LADIES AND GENTLEMEN, THIS IS TOM JONES!


Eu admiro Tom Jones desde menino.

Adorava seu programa de TV “This Is Tom Jones”, cheio de convidados muito especiais, que ia ao ar pela TV Record por volta de 1970. Não perdia um. Lembro bem do dia em que vi Ray Charles cantando lá. Se bem que lembro também de uns cantores bem cafonas -- como Engelbert Humperdinck e Caterina Valente -- que batiam o ponto por lá.

Os anos foram passando e, conforme fui crescendo, fui percebendo que, apesar de seu talento, Tom Jones era quase tão cafona quanto a maioria dos seus convidados, e que os arranjos da orquestra que o acompanhava eram de gosto altamente dicutível.

Custei a entender como alguém com uma voz tão espetacular quanto a dele podia escolher tão mal seu repertório, alternando verdadeiras aberrações como “Delilah” e “Help Yourself” com números espetaculares como “She´s a Lady” e “It´s Not Unusual”.

Mais alguns anos se passaram, e vi Tom Jones indo direto para o fundo do poço, virando cantor country em discos deploráveis e cada vez mais prisioneiro da cena artística decadente de Las Vegas.


A partir dos anos 90, no entanto, Tom Jones cansou daquilo tudo, voltou para a Inglaterra e começou a flertar com o pop mais modernoso feito por lá, saindo em em busca do lugar ao sol na cena musical que, até palavra em contrário, era seu por direito. 

Primeiro com aquela gravação espetacular de "Kiss", de Prince, com o pessoal do Art Of Noise, que sacodiu as pistas de dança do mundo inteiro. 

E depois, com o magnífico álbum de duetos "Reload!", onde desfila um repertório bem moderno e contracena com grandes estrelas do rock e do pop, num verdadeiro triunfo artístico.

De lá para cá, ele vem gravando um disco melhor que o outro, sempre agradando crítica e público, e resgatando a dignidade de sua carreira a olhos vistos.


“Spirit In the Room”, recém-lançado, é o disco mais despojado de Tom Jones em toda a sua carreira.

Produzido por Ethan Johns, oscila entre o folk e o gospel em números sempre levados no violão ou na guitarra com uma base rítmica bem simplificada.

É curioso constatar o quanto Tom Jones demonstra estar à vontade nesse contexto -- justo ele, habituado a disparar seu vozeirão sobre instrumentações exageradas.

“Spirit In the Room” abre com uma versão delicadíssima para “Tower Of Song”, de Leonard Cohen, simplesmente de arrepiar, 

E o que vem a seguir é impressionante: canções nada óbvias -- e escolhidas a dedo -- dos songbooks de Paul McCartney, Paul Simon, Richard Thompson, Joe Henry e Tom Waits, uma mais linda e sob medida para sua voz que a outra.

Tom Jones está atualmente com 72 anos de idade, e a 2 anos de completar 50 anos de carreira. Continua cantando muito bem, e sua voz não parece dar sinais de cansaço -- se bem que muito do exibicionismo vocal que ele ostentava em sua juventude parece estar totalmente fora de questão no seu trabalho atual, sempre pautado com muita sensatez pelo "menos é mais".

"Spirit In The Room" faz para a carreira de Tom Jones algo semelhante ao que a série "American Recordings" -- produzida "no osso" por Rick Rubin -- fez por Johnny Cash. Não é um projeto tão radical -- mas é tão intenso quanto, e fornece a dimensão real da sua grandeza artística.

Escutem a gravação que ele fez para o blues "Soul Of A Man", de Blind Willie Johnson, e me digam se esse bravo senhor galês de um metro e meio de altura não canta como um gigante?

Vida longa a Mr. Tom Jones!



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segunda-feira, maio 21, 2012

JOAN OSBORNE MERGULHA NAS ÁGUAS PROFUNDAS DO BLUES E DO RHYTHM & BLUES



Em 1995, quando Joan Osborne explodiu na cena musical com seu álbum “Relish” e o hit mundial “One Of Us”, pouca gente prestou atenção a uma releitura vigorosa de um blues clássico de Sonny Boy Williamson, “Help Me”, perdida entre as canções que compunham o repertório do disco, que fazia um contraponto curioso ao tom “americana” predominante.

Joan achou por bem manter esse mesmo tom nos dois discos que ela gravou a seguir – tão bons e afirmativos, mas infelizmente, não tão bem sucedidos quanto “Relish”.

Sempre no meio do repertório desses discos, um ou outro blues muito bem escolhido repetia aquela mesma magia de "Help Me", revelando um conhecimento de causa insuspeito e uma maestria impressionante no gênero.

Até que, um belo dia, essa nativa do Kentucky radicada em Nova York percebeu que estava perdendo tempo precioso de sua carreira só molhando o pé na margem e não mergulhando de cabeça no rio.

A partir daí, já na condição de artista independente, começou a focar seus discos no blues e no rhythm & blues. Paralelamente a isso, enveredou pela produção e foi chamada para viabilizar discos de artistas de blues amigos, como os lendários Holmes Brothers. Não sossegou enquanto não encontrou nesses artistas com quem trabalhou as saídas diferenciadas que faltavam para tornar seu trabalho ainda mais especial.


“Bring It On Home” é o disco mais intenso que Joan Osborne grava desde essa tomada de posição mais radical em sua carreira.

É uma coleção de números nada óbvios de blues, rhythm and blues e soul music, onde revela toda a sua versatilidade como cantora, mesclando números clássicos como “Shake Your Hips” de Slim Harpo ou “I Want To Be Loved” de Muddy Waters, com preciosidades soul como “Champagne & Wine” de Otis Redding e “The Same Love That Made Me Laugh” de Bill Withers.

Isso para não mencionar a versão fulminante para “I Don´t Need No Doctor”, do repertório de Ray Charles, que abre o disco de forma retumbante, e a releitura inspiradíssima para “Broken Wing”, de John Mayall, de uma delicadeza à toda prova.

“Bring It On Home” traz participações especialíssimas de amigos como Allen Toussaint e Jimmy Vivino -- além dos Holmes Brothers nos vocais em várias faixas --, contracenando com uma banda de apoio afiada e sempre a postos para estender o tapete para que a voz de Joan revele todas as nuances possíveis em um álbum que prima pelo colorido musical.
São tantos os desafios que Joan Osborne teve que encarar para conseguir seguir adiante com sua carreira após “Relish” que não dá para não se impressionar com a tranquilidade com que faz uso de seu enorme talento como cantora e band leader.

A única falha deste “Bring It On Home” – se é que isso pode ser considerado uma falha -- é não privilegiar o lado compositora de Joan Osborne. Mas isso ela conserta oportunamente. O mais difícil ela já fez -- e fez com maestria -- e é isso o que realmente importa.


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O SHOW DE IDIOSSINCRASIAS QUE ANTECEDEU A VOLTA DO BLACK SABBATH (Videocrônica para o Jornal da Orla Web - Maio 18, 2012)

sexta-feira, maio 18, 2012

RICHARD GALLIANO RELÊ NINO ROTA SOB UMA ÓTICA JAZZÍSTICA E PRODUZ UMA OBRA-PRIMA



Digam o que quiserem: Richard Galliano É um artista de jazz.

Que, infelizmente, não grava jazz tanto quanto gostaria porque o accordion é um instrumento pouco requisitado entre os grupos do gênero.

Mesmo assim, Galliano segue sua trajetória musical com uma atitude intrinsecamente jazzística mesclando a música negra americana com o cancioneiro francês e italiano -- sempre buscando convergências entre os mais diversos idiomas musicais e adequando sonoridades de outras épocas às sensibilidades mais modernas.

Galliano aprendeu a tocar accordion com seu pai ainda muito jovem.

Como gostava demais de jazz, decidiu apreender também a tocar trombone para poder se candidatar a participar de combos e orquestras de jazz.

Conforme foi amadurecendo como músico, foi descobrindo novas maneiras de inserir o accordion no jazz, e pouco a pouco foi-se desinteressando do trombone. 

Ouviu de seu amigo e mestre Astor Piazzolla certa vez que jamais deveria se afastar de suas raízes musicais, mas também jamais deveria ficar restrito a elas. Segue esse conselho à risca desde então.

Hoje, aos 62 anos de idade, não é à toa que esse francês de família italiana já é tido como o accordionista mais importante do cenário musical internacional.

Galliano é um artista múltiplo, imprevisível, que vai de Bach a Billie Holiday sem escalas nem cerimônias, e que grava discos tanto para selos de jazz europeus quanto para a classuda Deutsche Grammophon.


Esse disco, “Nino Rota”, é um exemplo do amplo alcance de Richard Galliano como músico.

Aqui, ele passeia pelo repertório do grande compositor italiano com uma delicadeza, e ao mesmo tempo com uma irreverência absolutamente ímpares, alterando compassos de números tradicionais para que possam receber improvisações onde antes elas não caberiam, e reinventando vários conceitos musicais recorrentes na obra musical de Rota.

Assim como acontecia com a postura musical de Astor Piazzolla – aliás, homenageado por Galliano num aguardado LP que chega às lojas ainda este mês --, nenhuma obra musical composta por Nino Rota é considerada aqui sagrada ou intocável, por melhor e mais emblemática que seja.

E apesar disso, duvido muito que os fãs de Nino Rota consigam torcer o nariz para um projeto tão simpático, tão leve e tão deliciosamente criativo quanto esse


Lançado em Outubro do ano passado em meio às comemorações do centenário do maestro e compositor, esse “Nino Rota” não sai do meu playlist do iTunes desde então.

O caso é que não canso de trabalhar ao som desse disco.

Daí, estava mais do que na hora – meio atrasado, aliás -- de indicá-lo por aqui.

Sendo assim, conheçam Richard Galliano e reencontrem o grande maestro italiano nesse belo disco.

Em algum ponto do Cosmos, quem sabe Nino Rota e Astor Piazzolla -- e quem sabe até Federico Fellini -- não estão bebendo em homenagem a essa deliciosa brincadeira musical promovida por esse discípulo pouco respeitoso.

Mas incomparável.



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quarta-feira, maio 16, 2012

ARNALDO ANTUNES SE REINVENTA NUM "ACÚSTICO MTV" BRILHANTE E SEM CONCESSÕES



Arnaldo Antunes está comemorando 30 anos de carreira.

Uma carreira bem acidentada, com forte apelo popular no início, à frente dos Titãs, e cheia de altos e baixos nos anos que se seguiram, dependendo do teor dos álbuns solo que gravava.

Mas o importante é está comemorando 30 anos de carreira sem abrir mão de seu projeto original e sempre se reinventando musicalmente, seja em projetos desenvolvidos com seu amigo e escudeiro Edgar Scandurra ou com os correligionários nos Tribalistas: Carlinhos Brown, Dadi e Marisa Monte.

E comemorando em grande estilo, nesse envolvente “Acústico MTV”, num palco que parece um pequeno circo ou um coreto de praça do interior – o que vier primeiro.

O que mais impressiona logo de cara nas 22 faixas do disco é a facilidade com que Arnaldo consegue desdobrar todas as suas personas musicais fazendo com que elas coubessem nesses formatos musicais utilizados aqui.

Nas palavras do próprio Arnaldo: “É muito bacana. “Acústico” é um teste de resistência das canções. Se elas sobrevivem a um formato, é porque elas são realmente legais. É um trabalho intenso rearranjar tudo.”


Quem comanda a cena toda é, acreditem ou não, o lendário produtor Liminha, que ninguém jamais imaginou trabalhando novamente com Arnaldo Antunes -- Arnaldo inclusive.

A banda de apoio é tão estelar quanto ecumênica, e incluí Curumim (bateria e vocais), Marcelo Jeneci (Vk7, mellotron, clavinete, wurlitzer, acordeom, bells e vocais), Chico Salém (banjo, violão de aço e náilon, lapsteel, guitarra portuguesa e guitalelê) além do indispensável Edgard Scandurra (violão de aço, violão de 12, harp suzuki, talk box e vocais), seu parceirão mais contumaz nesses últimos vinte e poucos anos.

Nas participações especiais, Moreno Veloso e Nina Becker e o trompetista Guizado ajudam a reforçar o aspecto inusitado da empreitada.

De qualquer forma, fica no ar a pergunta: como pode uma combinação tão aparentementemente incompatível de músicos quanto essa funcionar?

Pois funciona exemplarmente bem.

"Arnaldo Antunes Acústico MTV" é uma excelente retrospectiva de carreira, um passeio por várias fases de sua vida que, realinhavadas e colocadas em perspectiva, trazem um relevo impressionante à essa riquíssima trejetória de 30 anos de intensa produção artística.

O repertório traz sucessos, lados B, canções inéditas e outras que ele deu para amigos de presente e que nunca tinha gravado antes -- tudo isso embalado por uma delicadeza musical intrinsecamente brasileira e uma atitude bem menos roqueira que a habitual.

Não se espantem se "Arnaldo Antunes Acústico MTV" despertar o interesse de velhos fãs dos Titãs que nunca deram muita atenção à sua carreira solo, pois esse desejo não saiu em momento algum da cabeça de Liminha durante a concepção desse projeto -- apesar dele jamais perturbar Arnaldo com essa preocupação.

Vejam lá o que vocês vão levar: o CD, o DVD ou o BluRay. Os 3 formatos já estão nas lojas.

Só não deixem passar este trabalho primoroso que conseguiu reunir tanta gente interessante sob um mesmo teto, desafiando com muito talento e muita criatividade um formato de show -- "MTV Unplugged" -- que há já uns bons anos vêm dando sinais inequívocos de fadtiga.

Bravo, Arnaldo Antunes!

"

INFO:
 http://pt.wikipedia.org/wiki/Arnaldo_Antunes


DISCOGRAFIA:
http://www.territoriodamusica.com/rockonline/az/discografia/?a=Arnaldo+Antunes

WEBSITE OFICIAL:
http://www.arnaldoantunes.com.br/new/

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terça-feira, maio 15, 2012

PREPAREM-SE PARA MAIS UMA GUITARRADA ESPETACULAR DE SANTANA EM "SHAPE SHIFTER"



Tenho muito carinho e admiração por Carlos Santana.

Que não tem?

É um grande cara e um guitarrista magnífico, eloqüente como poucos -- mas subestimado pela crítica e também por muitos jazzistas por ter dedicado tempo demais de sua longa carreira ao rock e ao pop.

O caso é que Carlos Santana está chegando aos 50 anos de carreira em grande forma.

Dono de uma história gloriosa que começa em 1962, quando chega do Mexico a San Francisco, California, onde já começa a tocar profissionalmente com seus irmãos, apesar de ter apenas 14 anos de idade, Carlos pulou de banda em banda até finalmente montar a primeira encarnação do Santana em 1966.

Daí em diante, todo mundo sabe o que aconteceu. Do sucesso em Woodstock em 1969 ao estrelato com discos magníficos como "Abraxas", "Batuka" e "Caravanserai", Carlos Santana comandou um time estelar de músicos latinos e negros sem igual no rock, no pop ou em qualquer gênero musical.


Depois de oscilar entre o pop e o jazz nos anos 80 e 90 numa discografia um pouco confusa, Santana deu a sorte de emplacar um dos últimos blockbusters da Indústria Fonográfica – “Supernatural”, de 1999, com mais de 25 milhões de cópias vendidas no mundo inteiro, o primeiro de uma trinca de cds com convidados ilustres lançados nos últimos anos pela Arista Records de seu amigo Clive Davies.

Para Santana, foi uma grata surpresa. Ele estava fora da cena mainstream e, de repente, ganha 8 Grammies, 15 discos de platina, volta em grande estilo ao megaestrelato e ainda leva para casa uma grana preta. Quem nao queria estar no lugar dele? 

Boa pergunta. O caso é que o formato engessado deses discos e dos shows que se seguiram a eles estava começando a cansar, e ele estava ficando de saco cheio daquilo tudo, morrendo de saudades de sua carreira regular, focada no seu trabalho com sua banda. Devia ser realmente muito chato ter que se aborrecer com o assédio dos produtores dos muitos artistas duvidosos que eram convidados para participar de seus discos.

O fundo do poço para Carlos Santana foi um projeto medonho chamado "Guitar Heaven", lançado 3 anos atrás, onde o escalaram para regravar números clássicos de rock dos anos setenta com um monte de convidados. As bases já estavam prontas, ele só teve que chegar com a sua guitarra e entrar com os solos, nada mais.

O disco foi lançado, revelou-se rapidamente um fiasco retumbante, e deu a Santana o pretexto que ele precisava para começar a recusar projetos como esse e retomar sua carreira solo com independência artística e sem interferências desagradáveis de executivos sabichões.


“Shape Shifter”, seu mais novo trabalho, é o resultado dessa tomada de posição e um verdadeiro choque qualitativo em sua carreira. 

É um álbum essencialmente instrumental, com temas de naturezas bem variadas, onde ele passeia com sua guitarra e com os músicos de sua banda pelos mais diversos gêneros musicais, sempre com muita destreza e muita delicadeza, como não podia deixar de ser.

O conjunto de "Shape Drifter" funciona bem, mas é meio irregular.  Alguns dos temas -- como ‘Angelica Faith” e “Metatron” -- são apenas triviais e simpáticos, enquanto outros mergulham em águas bem mais profundas -- como “Nomad, “Dom” e a belíssima faixa título do disco.

Se bem que a coisa fica boa mesmo a partir de “Macumba Im Budapest” quando a alma latina de Carlos Santana explode numa sequência espetacular de números muito ritmados, que ainda inclui “Mr. Szabo”, homenagem ao grande guitarrista e amigo Gabor Szabo, e a salsa magnífica “Eres La Luz”, que conta com participação vocal de Andy Vargas e Tony Lindsay.
Santana encerra “Shape Shifter” com dois números conhecidos de seus shows ao vivo que, por uma série de motivos, não couberam nos seus últimos discos: o lindíssimo bolero “Canela” e a desconcertante “Ah, Sweet Dancer”, compostas em parceria com seu talentoso filho pianista Salvador Santana. 


Depois de ouvir "Shape Shifter", fica a sensação clara de que esse era o disco que Santana queria fazer há muito tempo, e não conseguia.

Por alguma razão, Santana sempre fez questão de separar seus discos de banda – que assinava como Santana – de seus discos solo, quase sempre instrumentais -- que assinava como Devadip Carlos Santana, ou simplesmente Carlos Santana.

Este é um disco de Carlos Santana solo, bem pessoal e autoral, mas com o vigor e a marca registrada de sua banda de estrada, o que nos leva a crer que ele finalmente achou um jeito de unificar essas duas vertentes de sua carreira.

Aqui -- assim como em seus melhores discos -- os tradicionais exageros de Santana na guitarra fazem todo o sentido do mundo. Sua música continua tão exuberante que não tem tempo de ser elegante.

(Quer guitarras elegantes? Ouça George Benson ou Earl Klugh...)



INFO:
 http://www.allmusic.com/artist/carlos-santana-p195903/biography
http://www.allmusic.com/artist/santana-p13645/biography

DISCOGRAFIA:
 http://www.allmusic.com/artist/carlos-santana-p195903/discography
 http://www.allmusic.com/artist/santana-p13645/discography

WEBSITE OFICIAL:
http://www.santana.com/

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segunda-feira, maio 14, 2012

O RETORNO DO RHYTHM AND BLUES CONJUGAL DE SUE FOLEY E PETER KARP


Cupido anda à solta na cena do blues americano.

Depois que o casal de guitarristas Derek Trucks e Susan Tedeschi decidiram unificar suas bandas para cair na estrada juntos como Tedeschi-Trucks Band, eis que mais dois ícones do blues moderno decidem embarcar numa empreitada semelhante.

Tudo começou quando Sue Foley – 45 anos, canadense de Ottawa, veterana da cena de Austin, Texas, com mais de 10 discos gravados – foi convidada para participar do festejado álbum “Shadows And Cracks” do gênio incompreendido Peter Karp, que havia sido líder da Roadhouse Band nos anos 90 -- um artista errante de New Jersey radicado em Nashville, misto de cineasta, artista plástico e cantor e compositor.

O tal dueto entre os dois foi gravado, mas acabou não sendo incluído no disco.

Nesse meio tempo, tiveram um romance rápido, mas muito intenso. Se separaram e caíram na estrada, cada um promovendo seu próprio disco, mas, como estavam apaixonados, se correspondiam quase diariamente por emails. ,

Assim que as duas tournées acabaram, os dois decidiram se casar, mudar para Austin e dar uma geral em tudo o que escreveram um para o outro em seus laptops.

Resultado: a correspondência deles se transformou numa série de canções que deram origem a um disco que é a crônica do romance entre os dois.


“He Said She Said” é um álbum conceitual muito bonito e totalmente confessional assinado por Sue Foley e Peter Karp, e que veio seguido de uma tournée conjunta, com o agora casal dividindo a mesma banda e correndo juntos pelos quatro cantos da América.

Foi extremamente bem recebido, tanto pela crítica quanto pelos públicos de Sue Foley e de Peter Kamp, que o colocaram em todas as listas de Melhores do Ano de 2010.

E quem apostou que, depois dessa experiência musical e conjugal, Foley & Karp iriam dar um tempo e retomar suas carreiras solo, se enganou redondamente.


E agora, olha eles aí de volta com “Beyond The Crossroads”, um LP diametralmente oposto a tudo o que haviam realizado dois anos atrás em “He Said She Said”.

Dessa vez, os dois fugiram dos conceitos.

Toda a corte que um fez para o outro e toda aquela conversa confessional no disco anterior já é passado, e isso se reflete no novo repertório do casal, bem leve e totalmente desencanado.

A faixa de abertura já dá o tom do que vem pela frente: nada menos que uma releitura bem suingada de “We´re Gonna Make It”, do saudoso Little Milton Campbell, que tanto Karp quanto Foley cantam com uma convicção impressionante.

E o que vem a seguir é o blend de blues, rhythm & blues, country music e folk que permeia há muitos anos os trabalhos solo tanto de um quanto do outro, em canções compostas pelos dois durante a tournée anterior e testadas na estrada antes de ganhar gravações definitivas em estúdio.

Antes que algum blueseiro mais ranheta reclame, é bom deixar claro que trata-se mais de um álbum de “americana” do que propriamente de blues, onde números mais roqueiros como “You´ve Got A Problem” e a faixa título se alternam com doses cavalares de rhythm & blues em “More Than I Bargained For” e “Analyse´n Blues”.


O resultado prático disso são 12 números extremamente agradáveis, que falam de momentos alegres e triviais, ao longo de quase 40 minutos de música de altíssimo gabarito, por dois cantores e compositores que acharam um jeito de conjugar seus talentos de forma intensa e surpreendente.

Daí, só nos resta dizer: Parabéns Sue Foley e Peter Kamp.

Pela ousadia em arriscar duas carreiras bem sucedidas num projeto em princípio incerto.

Pela delicadeza com que trazem a público flashes reveladores de sua vida cotidiana.

E pela nonchalance das performances registradas nesses dois discos, prova incontestável do gabarit
o musical desses dois grandes músicos.

Quanto a você, ouvinte, prepare-se para embarcar nessa aventura musical muito envolvente deste casal nada improvável.

Acredite: Cupido sabe o que faz.


INFO:
http://www.allmusic.com/artist/sue-foley-p38838/biography

DISCOGRAFIA:
http://www.allmusic.com/artist/sue-foley-p38838/discography

WEBSITE OFICIAL:
http://www.suefoley.com/

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