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sexta-feira, outubro 13, 2017

PACOTEIRA MUSICAL DE VETERANOS DA CENA BRITÂNICA: MARIANNE FAITHFULL, ROBERT PLANT, RICHARD THOMPSON, VAN MORRISON & LIAM GALLAGHER

por Chico Marques


Tudo bem, não se faz mais Invasões Britânicas como antigamente.

Mas das últimas Invasões Britânicas que rolaram -- a dos Beatles e dos Rolling Stones (e dos Kinks, dos Animals e do Them) em meados dos anos 1960, e a do pessoal do BritPop em meados dos anos 1990 -- muitos grandes artistas permanecem ativos e muito atuantes na cena musical.

Nossos cinco escolhidos para compor a pacoteira musical de hoje são sobreviventes dessas duas invasões.

Da Invasão mais recente, dos Anos 90, temos o desaforado e irascível Mr. Liam Gallagher, ex-frontman do grupo Oasis, vindo de Manchester.

Já da Invasão dos Anos 60, temos a melancólica Ms. Marianne Faithfull e o multicultural Mr. Richard Thompson (ambos de Londres), além do sempre inquieto Mr. Robert Plant (de Birmingham) e de São Van Morrison (de Belfast, Irlanda).

São todos grandes ícones de vários fronts musicais, com históricos de carreira bem distintos, que estão com discos novos muito festejados pela imprensa e pelo público.

Merecidamente.

Vamos a eles:


ROBERT PLANT
CARRY FIRE
(Nonesuch)

No início dos Anos 80, quando o Led Zeppelin implodiu após a morte de John Bonham e Robert Plant deu o pontapé inicial em sua carreira solo mergulhando de cabeça no MOR no disco Pictures At Eleven, o comentário geral foi: okay, funciona, lembra o Zep, mas falta Jimmy Page. Incomodado com isso, Mr. Plant foi pouco a pouco distanciando sua carreira solo dos ecos do Led Zeppelin, morrendo de medo de virar um daqueles artistas que vivem em função de um passado glorioso. Mas, depois de 5 discos solo bem sucedidos, sentiu que tinha uma situação bem sedimentada e que não corria mais esse risco, daí topou voltar a trabalhar com Mr. Page em dois discos bem distintos: o acústico e revisionista Unledded (1996) e o elétrico e vigoroso Walking Into Clarksdale (1998). O comentário geral foi: okay, funciona, lembra o Zep, mas falta John Paul JonesDe saco cheio do saudosismo dos fãs do Led Zep, Mr. Plant decidiu da virada do século para cá procurar por suas raízes musicais dos dois lados do Atlântico, mergulhando em investigações musicais ao lado da violinista Alison Krauss, depois com a cantora e compositora Shaun Colvin (com quem manteve um romance por cinco anos), e ainda reagrupando a Band Of Joy, banda folk-psicodélica da qual fazia parte antes de ingressar no Led Zeppelin. Cinco anos atrás, promover mais uma virada em sua carreira: voltou para a Inglaterra e montou uma banda espetacular, The Sensational Space Shifters, com quem já gravou 3 LPs. O mais recente, Carry Firecombina rock e folk com música árabe e música eletrônica, e consegue a proeza de fazer com que todas essas vertentes musicais dialoguem ignorando fronteiras musicais, e mostrando que elas não passam de fronteiras mercadológicas. Ao contrário de Lullaby & The Ceaseless Choir (2014), que foi produzido magistralmente por T-Bone Burnett, dessa vez Mr. Plant teve que se auto-produzir, pois a agenda de Mr. Burnett estava cheia. Daí, procurou seguir fielmente as lições que aprendeu com ele no disco anterior, e fez de Carry Fire uma sequência natural dele. Não há highlights a ser destacados, pois o disco é de uma coesão impecável e todos os elementos estão perfeitamente alinhavados. Mesmo assim, vou destacar o único cover do disco: uma releitura eletrônica quase inacreditável da clássica balada rockabilly Bluebirds Over The Mountain, que esbanja uma organicidade musical ímpar, que é a cara de Mr. Plant: moderna e etérea, tudo ao mesmo tempo. Carry Fire é um belo disco, que deve agradar tanto aos velhos fãs do Zep quanto aos que vibraram com Lullaby & The Ceaseless Choir três anos atrás e queriam mais. Pois bem... aqui está!






VAN MORRISON
ROLL WITH THE PUNCHES
(Caroline)

De tempos em tempos, um negão que vive meio adormecido na alma de Van Morrison acorda e dá a luz de sua graça, obrigando-o a interromper sua sequência tranquila e confortável de discos inspirados nas sonoridades da Irlanda para mergulhar de cabeça nas águas rápidas e lamacentas do Rio Mississippi. É mais ou menos isso que rola aqui em Roll With The Punches, um disco ligeiro, coeso e com uma urgência que havia desaparecido da obra de Mr. Morrison há muitos anos. Dizem que o que motivou esse mergulho no blues foi a aproximação dele de um de seus heróis musicais: o grande cantor inglês Chris Farlowe, um pouco mais velho que ele. De três anos para cá, para surpresa geral, os dois ficaram inseparáveis e não desgrudaram mais. Já que o blues e o rhythm & blues são idiomas musicais que ambos dominam à perfeição, foi por aí que eles decidiram seguir sintonizados musicalmente. Temos aqui apenas cinco originais de Mr. Morrison contra dez covers sensacionais de clássicos como Ride On Josephine e I Can Tell, de Bo Diddley, Going To Chicago de Count Basie e Mean Old World de T-Bone Walker. Quem quiser se esbaldar com um disco que é tão certeiro quanto um murro no queixo, é só vir por aqui. Acredite: Roll With The Punches faz juz ao seu nome.





LIAM GALLAGHER
AS YOU WERE
(Warner Bros)

Eu sempre tive uma séria desconfiança quanto a esse embate constante e interminável entre os irmãos Liam e Noel Gallagher. Nunca entendi como eles conseguiam manter uma postura profissional inabalável nos palcos se odiando tão intensamente. Pior: como conseguiram manter o Oasis em pé por 18 anos seguidos vivendo às turras dia após dia. Tem alguma coisa que sempre me pareceu errada nessa equação. Posso estar errado, mas acho que as brigas constantes entre os dois irmãos sempre foram, na verdade, uma estratégia de marketing muito bem arquitetada para manter a banda sempre presente no noticiário de publicações musicais semanais fofoqueiras como o New Musical Express. Desde que o Oasis acabou, os dois deram sequência a suas carreiras formando novas bandas: The High Flying Brds (de Noel) e Beady Eye (de Liam, com todos os integrantes da formação final do Oasis, menos Noel). As farpas de sempre continuaram sendo disparadas de ambois os lados, e os fãs do Oasis, que andavam saudosos dos barracos e da lavagem de roupa suja entre os dois irmãos, seguiram prestigiando suas novas aventuras -- musicalmente muito semelhantes ao que eles produziam quando gravavam juntos. Agora, estranhamente, Mr. Liam Gallagher resolveu chutar o balde e arriscar uma ruptura com o legado do Oasis nesse seu primeiro álbum solo. As doze faixas de As You Were são surpreendentes, ampliando o espectro musical de Mr. Liam Gallagher para muito além do britpop e o situando muito bem em números de blues, rhythm & blues e outros gêneros musicais onde o repertório do Oasis jamais esteve. Ecos de John Lennon, Marc Bolan e Ian Hunter permeiam o disco do início ao fim, revelando que aquela fúria sonora e as sonoridades ásperas que haviam nos shows (não nos discos) do Oasis estavam lá por iniciativa dele, Liam Gallagher. Por mais que ele diga na entrevistas que vem concedendo para promover As You Were que não se sente confortável numa carreira solo e que gosta mesmo é de fazer parte de bandas, eu, francamente, duvido. Para mim é conversa mole. A estréia solo de Mr. Liam Gallagher é simplesmente ótima. Para alguns críticos, é excelente. Suas composições são tão qualificadas quanto as de seu irmão, revelando-se mais ásperas, menos melódicas e mais contundentes que as de seu irmão. O disco todo é extremamente envolvente, e muito bem produzido. Só Mr. Liam Gallagher acha que "talvez não". Continua um belo encrenqueiro depois de todos esses anos...





MARIANNE FAITHFULL
NO EXIT
(Verycords/Ear Music)

Setenta anos de idade. Cinquenta e três anos de carreira. Quem diria que aquela menina linda e melancólica que emplacou em 1964 um hit mundial com As Tears Go By -- canção que ganhou de presente de seu namorado Mick Jagger e de Keith Richards --, iria desenvolver uma carreira tão singular e superlativa. Ms. Faithfull conseguiu impor através de sua voz frágil e docemente ríspida um padrão novo e original que, de tão pessoal, poucas cantoras ousaram tentar seguir na época. Mas se atrapalhou com o fim de seu casamento com Jagger no início dos Anos 70, com suas investidas meio desastradas como atriz e, last but not least, com a dependência de heroína e constantes tentativas de suicídio. Demorou para perceber que nada daquilo tudo apontava para lugar algum. Passou a primeira metade dos anos 1970 num limbo artístico muito cruel, e só conseguiu achar foco para seu carreira ao se reinventar por completo, já em plena era punk, com o LP Broken English. Daí em diante, encontrou um público fidelíssimo, que nunca mais iria abandoná-la. Mergulhou de cabeça no repertório de Kurt Weill em 20th Century Blues, e gravou vários LPs alternando canções próprias com outras de seus amigos Tom Waits e Nick Cave. Em No Exit ela passa sua carreira a limpo numa apresentação ao vivo impecável, e mostra que sua voz, bastante combalida com os excessos dos anos selvagens, ainda consegue passear por seu velho repertório com sua integridade musical intacta. Uma artista carismática, intensa e absolutamente verdadeira.




RICHARD THOMPSON
ACOUSTIC CLASSICS II
(Beeswing)

Richard Thompson é um artista que dispensa apresentações em qualquer canto do mundo -- menos aqui no Brasil, onde nunca teve um
disco lançado. Membro fundador do seminal grupo de folk-rock britânico Fairport Convention, Mr. Thompson desenvolve há 46 anos um trabalho que desafia convenções e rótulos, mesclando em sua guitarra toques de jazz e de música erudita com influências de rock, blues, folk e música oriental. Nunca deixou de ser um cult artist, até porque nunca aceitou se adequar aos requisitos do mercado. Bem que tentaram promovê-lo perante um público mais amplo no final dos Anos 80, mas não funcionou direito. Mr. Thompson já tinha um público cativo extenso àquela essa altura do campeonato. Na medida em que sua integridade artística e sua liberdade criativa sempre foram fatores inegociáveis, e ele estava satisfeito com o que havia conquistado até então, não fazia o menor sentido abrir mão disso. Graças a essa teimosia, Mr. Thompson produziu alguns dos discos mais festejados pela crítica nos últimos 46 anos, como I Want To See The Bright Lights Tonight (1974) e Shoot Out The Lights (1982), ambos com sua ex-mulher Linda Thompson –, ou os trabalhos solo Hand Of Kindness (1983), Across A Crowded Room (1985) e Daring Adventures (1986), todos dignos de figurar em qualquer antologia de melhores LPs desse período. Nos últimos dois anos, Mr. Thompson decidiu se dedicar a desenvolver releituras acústicas de seu extenso repertório, e já está no segundo volume da série. Tudo indica que isso é apenas o começo, e que vem mais por aí. Os dois primeiros LPs da série Acoustic Classics lançados até agora servem tanto como uma curiosidade para os fãs de longa data quanto como uma introdução ao universo musical desse artista gigantesco, ainda que absolutamente desalinhado.




CHICO MARQUES
é comentarista,
produtor musical
e radialista
há mais de 30 anos,
e edita a revista cultural
LEVA UM CASAQUINHO
e o blog musical
ALTO & CLARO 


quarta-feira, novembro 05, 2014

MARIANNE FAITHFULL DÁ ADEUS À AMARGURA EM SEU NOVO LP "GIVE MY LOVE TO LONDON"


Marianne Faithfull é um caso complicado.

Linda e muito popular em 1964, quando ganhou o mundo com o compacto “As Tears Go By”, de Mick Jagger & Keith Richards, ela conseguiu impor através de sua voz frágil e docemente ríspida um padrão novo e original que, de tão pessoal, poucas cantoras ousaram tentar seguir na época.

Extremamente bem sucedida a princípio, foi terrivelmente prejudicada por seu casamento turbulento com Mick Jagger, por suas pretensões como atriz e, last but not least, pela dependência de heroína e pelas constantes tentativas de suicídio.

Demorou muito para Marianne perceber que nada daquilo tudo apontava para lugar algum.

Foi quando tentou retomar sua carreira musical.

Em vão.


Passou a primeira metade dos anos 1970 num limbo artístico muito cruel.

Só conseguiu achar foco para seu carreira ao se reinventar por completo, já em plena era punk, com o LP “Broken English” -- certamente o trabalho mais contundente de uma cantora-compositora inglesa naquela período.

Daí em diante, encontrou um público fedelíssimo que nunca mais iria abandoná-la.

Mergulhou de cabeça no repertório de Kurt Weill em “20th Century Blues”, e gravou vários LPs alternando canções próprias com outras de seus amigos Tom Waits e Nick Cave.

Seis anos atrás, recuperada de uma mastectomia, topou fazer “Easy Come Easy Go”, um álbum de covers com duetos para acabar com todos os outros álbuns de covers com duetos -- onde contracenou com amigos como Antony, Rufus Wainwright, Nick Cave, e até Keith Richards.

Ano retrasado, voltou, com um LP mais inusitado ainda. “Horses & High Heels” inteiramente gravado em New Orleans com os jovens músicos do excelente grupo Lower 911, e o resultado foi desconcertante e inusitado, contrapondo a abordagem musical sombria de Marianne com o frescor musical desses jovens músicos.


Agora, ela está de volta com "Give My Love To London", uma álbum de extremos emocionais, segundo ela própria, produzido brilhantemente por Rob Ellis e Dimitri Tikovo e mixado por Flood, produtor do U2.

E mais uma vez, Marianne reúne em torno dela convidados estelares com canções escritas especialmente para ela: Nick Cave, Brian Eno, Roger Waters, Anna Calvi, Steve Earle e Tom McRae, todas perefeitamente adequadas a ela.

É um LP belíssimo, de uma delicadeza absoluta.

Se no seu disco anterior Marianne nos brindou com uma releitura lindíssima de "Going Back", de Carole King e Gerry Goffin, aqui ela reinventa de forma magnífica o clássico dos Everly Brothers "The Price Of Love", acrescentando à canção uma densidade existencial que ela nunca sonhou ter antes.

E tem uma versão tão dilacerada e contundente de "I Get Along Without You Very Well" de Hoagy Carmichael que deixa a versão clássica de Billie Holiday no chinelo.

Para completar, suas novas composições são todas ótimas, provas irrefutáveis de que ela, com o passar dos anos, conseguiu tornar-se uma compositora de mão cheia.

Em praticamente todas elas, Marianne promove um resgate emocional intenso e extremamente verdadeiro.


Marianne Faithfull está com 68 anos de idade.

A cada disco que lança, ela não cansa de nos surpreender positivamente.

Já foi ao Inferno e voltou algumas vezes, sempre encarnando uma Ofélia junkie que possui todas as características de uma personagem trágica,

Menos uma:

Insiste em permanecer viva, ativa, e bem.


WEBSITE OFICIAL
http://mariannefaithfullofficial.tumblr.com/

DISCOGRAFIA
http://www.allmusic.com/artist/marianne-faithfull-mn0000651107/discography

AMOSTRAS GRÁTIS

,

sexta-feira, maio 27, 2011

TRÊS DIVAS: ALISON KRAUSS, K D LANG E MARIANNE FAITHFULL (por Chico Marques)


É triste, mas desde que inventaram os especiais de TV da série “Divas VH1” cerca de 15 anos atrás, qualquer cantora cafona e chata -- como Mariah Carey e Celine Dion, por exemplo – parece ter ganho o direito de se autodenominar Diva, mesmo sendo apenas uma gralha pop.

Quem já viu esses shows de horrores na TV sabe bem do que estou falando. Nada mais constrangedor do que ver nesses programas cantoras de verdade sendo obrigadas a contracenar com essas criaturas que miam nos microfones. para com isso se manterem no mainstream da cena musical.

Aretha Franklin – essa sim, uma Diva de verdade -- chutou o balde em grande estilo quando foi chamada para gravar uns duetos no "Divas VH1". Não teve piedade, e jantou três ou quatro dessas matracas pop em menos de 4 minutos, enquanto cantava "You Make Me Feel Like A Natural Woman", de Carole King . E nenhuma delas chiou. Reclamar equivaleria a passar recibo de incompetência. Foi engraçadíssimo. Moral da história: Diva de verdade pode o que quiser, e ponto.

Assim como Aretha, que manteve sua dignidade inabalada nesse episódio, existem várias artistas bem estabelecidas na cena musical anglo-americana que ainda conseguem se preservar desse tipo de exposição indecente.

A americana Alison Krauss é uma que foge desses eventos sempre que pode. Foi esnobada pelas TVs musicais por muitos e muitos anos, até que faturou um Grammy por seu LP em parceria com Robert Plant três anos atrás. Daí em diante, passou a ser muito requisitada para diversas festas idiotas aqui e acolá. Nunca disse tantos “Obrigado, Não” quando nesses últimos anos.

A canadense K D Lang é outra que sempre foi preterida nesses programas. Não que eles tenham preconceito contra lésbicas – para quem não sabe, K D foi a primeira cantora da cena country a sair do armário na América. Prefiro acreditar que as Divas da VH1 tenham morrido de medo de ser literalmente devoradas por ela, até porque seu apetite sexual voraz por outras cantoras já virou lenda no meio.

E tem ainda a londrina Marianne Faithfull, veteraníssima, que nunca foi e nunca será convidada para participar de qualquer coisa por lá porque provavelmente nenhuma das Divas da VH1 jamais conseguiria cantar no timbre estranhíssimo dela.

Todas as três são de primeiríssimo time, e estão de volta com novos trabalhos de alto gabarito, que não fazem concessões ao mercadão. Vamos a elas. E a eles:


Alison Krauss está comemorando 40 anos de vida e 28 anos de carreira. Se alguém dissesse que, um dia, uma violinista adolescente com formação clássica iria se tornar um dos expoentes máximos da country music americana, certamente seria chamado de louco. Pois Alison usou o violino clássico para tentar mergulhar na alma do bluegrass e do folk, e não só deu certo como também chegou onde nenhum rabequeiro de Nashville jamais esteve. Sempre com sua incansável banda, The Union Station, ela estreou em disco aos 14 anos de idade, e nunca mais parou, somando até agora 13 LPs gravados que são apreciados tanto por platéias country quanto por fãs de jam bands e de jazzistas crossover. Havia até dois meses atrás uma grande expectativa em torno do que seria seu trabalho seguinte a “Raising Sand”, seu premiado disco em parceria com Robert Plant, que ganhou o Grammy 3 anos atrás.


Pois a espera compensou. ‘Paper Airplanes” é, certamente, o mais conciso de todos os LPs de Alison Krauss & The Union Station. A loura de Illinois está cada vez melhor como intérprete, esbanjando sensibilidade em releituras para “Dimming Of The Day”, de Richard Thompson, e “My Opening Farewell”, de Jackson Browne. Já como compositora, ela surpreende com canções tristes e reflexivas, conseqüência de um casamento recém-terminado, como “Miles To Go” e “Sinking Stone”. "Paper Airplanes" é um trabalho maduro, muito bem seqüenciado, onde o bluegrass de câmara do Union Station afirma mais uma vez que country music pode ser recheada com música instrumental de primeira grandeza. E aos que desconfiaram que, depois do estrelato recente, Alison iria ficar muito maior que sua banda a ponto de engolí-la, “Paper Airplane” prova justamente o contrário – tanto que o guitarrista Dan Tyminski assume os vocais em nada menos que 3 canções do disco. Um LP belíssimo, sob medida para fazer com que pessoas normalmente reticentes a country music revejam seus conceitos. E se rendam.


K D Lang veio da região de Alberta, e tem sangue esquimó, Dona de uma voz magnífica e apaixonada pelos legados musicais de Patsy Cline e Roy Orbison -- mas adepta de um visual andrógino que nunca lhe facilitou as coisas na conservadora cena country --, K D conseguiu aos poucos seu passaporte para a mesma cena alternativa americana que abrigara outros artistas de difícil classificação, como Lyle Lovett e Steve Earle. Seus 3 LPs para a Sire Records são primorosos – em particular o terceiro, “Absolute Torch & Twang”, que a lançou internacionalmente. Mas de "Ingénue" em diante, ela optou por uma musicalidade mais convencional dentro do pop mainstream e, paralelamente a isso, assumiu em entrevistas sua opção pelo lesbianismo, o que segmentou seu público de forma perigosa para sua carreira – que ia de vento em popa até então. E justo quando parecia que iria conseguir reverter esse quadro a seu favor -- em duetos magníficos com Roy Orbison e Tony Bennett --, ela própria sabotou esse esforço embarcando num ativismo homossexual meio duvidoso que acabou por ofuscar seu trabalho musical em LPs excelentes como “Drag”, “Hyms Of The 49th Parallel” e “Watershed”.


Seu novo trabalho, “Sing It Loud”, tenta corrigir alguns desses equívocos. E até consegue. Aqui, pela primeira vez em 22 anos, K D Lang se reassume como artista country pop, produzindo afinal a tão aguardada seqüência para seu melhor LP, “Absolute Torch & Twang”, e seguindo um padrão musical alt country que -- nunca houve a menor dúvida quanto a isso -- cai como uma luva para ela. Os flertes com o pop permanecem, mas bem equilibrados, numa levada musical que remete ao trabalho de grupos como Son Volt e Wilco. Todas as canções do disco são memoráveis e de sua autoria – com excessão de “Heaven”, dos Talking Heads. “Sing It Loud” beira a perfeilão. Se K D Lang não fosse tão teimosa, esse belo disco não teria levado tantos anos para vir à tona. Mas antes tarde do que nunca. Só nos resta torcer para que seu público de outras épocas ainda não tenha desistido dela. Conheço dois ou três velhos admiradores que vão vibrar com essas boas novas.


Marianne Faithfull é outro caso complexo. Linda e muito popular em 1964, quando ganhou o mundo com o compacto “As Tears Go By”, de Mick Jagger & Keith Richards, ela conseguiu impor através de sua voz frágil e docemente ríspida um padrão novo e original que, de tão pessoal, poucas cantoras ousaram tentar seguir na época. Extremamente bem sucedida a princípio, foi terrivelmente prejudicada por seu casamento turbulento com Mick Jagger, por suas pretenções como atriz e, last but not least, por sua dependência de heroína e constantes tentativas de suicídio. Demorou muito para Marianne perceber que nada daquilo tudo apontava para lugar algum. Foi quando tentou retomar sua carreira musical. Em vão.

Passou a primeira metade dos anos 1970 num limbo artístico muito cruel. Só conseguiu achar foco para seu carreira ao se reinventar por completo, já em plena era punk, com o LP “Broken English” -- certamente o trabalho mais contundente de uma cantora-compositora inglesa naquela período. Daí em diante, encontrou um público fedelíssimo que nunca mais iria abandoná-la. Mergulhou de cabeça no repertório de Kurt Weill em “20th Century Blues”, e gravou vários LPs alternando canções próprias com outras de seus amigos Tom Waits e Nick Cave. Três anos atrás, recuperada de uma mastectomia, topou fazer “Easy Come Easy Go”, um álbum de covers com duetos para acabar com todos os outros álbuns de covers com duetos -- onde contracenou com amigos como Antony, Rufus Wainwright, Nick Cave, e até Keith Richards.


Agora, Marianne está de volta, com um LP mais inusitado ainda. “Horses & High Heels” foi inteiramente gravado em New Orleans com os jovens músicos do excelente grupo Lower 911, que vem trabalhado com Dr. John nos últimos anos. O resultado é desconcertante e inusitado, contrapondo a abordagem musical sombria de Marianne com o frescor musical desses jovens músicos. Suas canções recentes são todas ótimas -- provas irrefutáveis de que ela, com o passar dos anos, conseguiu tornar-se uma compositora de mão cheia. Mas é em “Goin' Back”, de Carole King e Gerry Goffin, um dos quatro covers do disco, que o bicho pega pra valer. Quem diria que, um dia, alguém conseguiria inserir numa canção tão blasé quanto esta uma carga existencial tão intensa. É como se Marianne, aos 65 anos de idade, finalmente conseguisse enxergar novamente em si mesma aquela linda menina de 17 anos que em 1964 encantou o mundo todo, e que há muito havia perdido de vista. Só esse resgate emocional já faria de “Horses & High Heels” um disco essencial. Mas tem mais, muito mais, de onde veio essa pérola. Cabe a vocês descobrir. Não tenham medo de Marianne Faithfull. A turbulência ficou para trás.


Voltando ao início da conversa, e tentando fechar o assunto: para ser Diva de verdade é preciso ter, antes de mais nada, estofo artístico e um talento excepcional para a vida.

Alison Krauss, por exemplo, é Diva porque reinventou o bluesgrass e o folk com uma atitude quase camerística, que nunca havia sido tentada antes.

K D Lang é Diva porque nunca teve medo de arriscar uma carreira de sucesso numa empreitada perigosa que a afastou de seu lugar de direito na cena musical atual por quase 15 anos.

E Marianne Faithfull... bem, Marianne é Diva porque já foi ao Inferno e voltou algumas vezes, sempre encarnando uma Ofélia junkie que possui todas as características de uma personagem trágica, menos uma: insiste em permanecer viva, ativa, e bem.

Convenhamos: não é para qualquer uma.

Entendeu, Mariah Carey? Entendeu, Celine Dion? Entendeu, VH1?



ALISON KRAUSS
Discografia, Trechos de Entrevistas e Fotos



K D LANG
Discografia, Trechos de Entrevistas e Fotos



MARIANNE FAITHFUL
Discografia, Trechos de Entrevistas e Fotos





HIGHLIGHTS
Alison Krauss & Union Station
"Paper Airplanes"






HIGHLIGHTS
K D Lang
"Sing It Loud"







HIGHLIGHTS
Marianne Faithfull
"Horses & High Heels"





quinta-feira, maio 26, 2011

SENHORAS E SENHORES... MARIANNE FAITHFULL


“Meu pai foi um espião inglês na Segunda Guerra e nunca foi pego pelos alemães. Eu o vi pela última vez aos 6 anos de idade. Depois disso, nunca mais tive notícias dele, mudou de identidade e desapareceu pelo mundo. Dizem que meu filho é muito parecido com ele. Mesmo não tendo podido conviver muito com meu pai, torço para que tenha tido uma vida boa.”


“Viver com Mick Jagger era muito movimentado. Ele costumava dirigir um Bentley comigo ao lado e levava o fotógrafo Michael Cooper no banco de trás. Michael era uma espécie de fotógrafo da corte dos Rolling Stones. Tenho muitas fotos desses passeios. Mick e eu não éramos pessoas muito divertidas um com o outro, mas até que tivemos momentos bem legais. Foi uma parceria bastante criativa.”


“É verdade que Keith Richards e eu passamos uma noite juntos quando soubemos que Mick Jagger e Anita Pallenberg estavam tendo um romance às escondidas. Foi uma atitude de retaliação. Mais adiante, descobrimos que estávamos apaixonados e aí tivemos um romance de verdade, mas não durou muito, éramos todos muito selvagens naquela época. Eu amo muito Keith até hoje e fiquei feliz em ler na sua autobiografia as coisas carinhosas que disse a meu respeito. Somos grandes amigos.”


“Minha vida mudou completamente desde que deixei de beber e usar drogas. Felizmente meu instinto de auto-sabotagem parece estar desativado há já uns bons anos.”


“Eu consegui chegar a bons termos com meu passado turbulento. Tudo o que acontecia ao meu redor eu levava de forma pessoal, e acabava me machucando com isso. Era muito insegura. Vivia na defensiva. Hoje eu não me importo mais com nada disso. Depois de ter ficado face a face com a morte, descobri que a vida é uma dádiva.”



LPS MARIANNE FAITHFULL
Come My Way (1964)
Marianne Faithfull (1965)
Go Away From My World (1965)
North Country Maid (1966)
Faithfull Forever (1966)
Love In A Mist (1967)
Dreaming My Dreams (1969)
Faithless (1978)
Broken English (1979)
Dangerous Acquaintances (1981)
A Child´s Adventure (1983)
Summer Nights (1984)
Music For The Millions (1985)
Strange Weather (1987)
Blazing Away (1990)
A Secret Life (1995)
20th Century Blues (1997)
Weill: The Seven Deadly Sins (1998)
Vagabond Ways (1999)
Kissin' Time (2002)
Before The Poison (2005)
Easy Come Easy Go (2008)
Horses and High Heels (2011)

WEBSITE OFICIAL
http://www.mariannefaithfull.org.uk/