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domingo, março 01, 2015

JOSEPH ARTHUR CELEBRA LOU REED COMUNGANDO DA MESMA ATITUDE ICONOCLASTA PERANTE VIDA E ARTE


A carreira musical de Lou Reed foi uma carreira plena.

Em quase 50 anos desde o surgimento do Velvet Underground até "Lulu", seu último suspiro artístico ao lado do Metalllica, Lou experimentou praticamente tudo o que lhe veio à cabeça, muitas vezes arrumando encrencas monumentais tanto com seu público quanto com as gravadoras RCA, Arista e Sire, que nem sempre aprovavam seus projetos mais diletantes.

Se ficou faltando fazer alguma coisa em sua carreira, talvez tenha sido um álbum acústico com releituras de seus grandes sucessos -- se bem que em "Perfect Night Live In London" (1997) ele chegou perto desse conceito, só que optou por trabalhar um repertório mais obscuro.


O novo álbum de Joseph Arthur, "Lou" (um lançamento Vanguard), pretende ser um tributo carinhoso e pouco reverente a Lou Reed, de quem era amigo pessoal.

Mas o caso é que a falta de reverência foi tamanha que o projeto acabou ganhando contornos amplos e se transformando em muito mais que um mero tributo.

"Lou", da maneira como foi gravado, é um mergulho criativo na obra de um grande artista.

Totalmente acústico, e repleto de releituras que, vez ou outra, tornam números muito conhecidos do repertório de Mr. Reed irreconhecíveis, "Lou" dispensa bateria, baixo e instrumentos adicionais para recriar apenas com voz, violão e piano algumas das canções mais marcantes de duas, três ou quatro gerações.

São doze canções no total.

Abre com uma versão minimalista de "Walk on the Wild Side", sem o cinismo habitual e com uma ternura para com os personagens da canção jamais antes imaginada por Lou. 

"Stephanie Says" traz vocalizações em reverb que transformam os versos da canção quase num diálogo.

"Heroin" vira um blues rasgado, como Lou jamais imaginou gravá-la antes.

"Wild Child" e "Sattelite Of Love" transformam-se em baladas hipnotizantes, 

"NYC Man" e "Coney Island Baby" ganham contornos inusitados na voz gutural de Joseph Arthur.

E "Pale Blue Eyes" e "Magic and Loss" deixam de ser flertes com a morte para transformarem-se em celebrações à vida em tom menor.




Joseph Arthur nasceu em Akron, Ohio, 40 anos atrás, mas caiu fora de lá assim que pôde.

Foi tentar a sorte no circuito folk da Califórnia, e em 1997 deu a sorte -- e também o azar -- de ser descoberto por Peter Gabriel, que o contratou para seu selo New World, voltado prioritariamente para artistas de world music.

Seu primeiro disco para o selo, “Big City Secrets”, serviu para tirá-lo do ghetto folk e projetá-lo para o público de Peter Gabriel. 

Só no seu terceiro trabalho, “Come To Where I'm From” (2000), com produção de T-Bone Burnett e uma levada mais country rock, Joseph Arthur conseguiu atingir um público mais amplo.

Devidamente amparado pela Virgin Records, ele começou a desenvolver projetos mais ambiciosos, sempre influenciado por Gabriel e seguindo conselhos de amigos como Joe Henry e T-Bone Burnett.

Levou alguns anos até a Virgin finalmente se desinteressar dele, mas quando isso aconteceu, ele já era uma força emergente na cena independente.

De lá para cá, gravou uma série de Lps e EPs impeacáveis com sua banda The Lonely Astronauts para seu selo próprio, mesclando folk com pop em contextos sonoros no mínimo inusitados e firmando-se como um dos compositores mais solicitados da cena atual.


Joseph Arthur é um compositor prolífico, e nunca pensou em gravar um disco de covers antes de "Lou".

Talvez por isso mesmo, e também por admirar Lou Reed tão profundamente, essa homenagem ganhou contornos tão especiais e tão pessoais.

O que se pode concluir depois de ouvir "Lou" é que Lou Reed e Joseph Arthur compartilham da mesma atitude iconoclasta perante suas vidas e sua arte.

Da mesma forma que Lou não via nenhuma barreira entre seu trabalho como cantor-compositor e fotógrafo, Joseph adora dizer que sua obra musical e suas pinturas são uma coisa só, que ele chama carinhosamente de “Museum Of Modern Arthur”.

Ou seja: existem mais afinidades entre o autor da homenagem e o homenageado do que pode supor nossa vã filosofia.

Essas afinidades estão todas presentes em "Lou", um disco a ser descoberto.







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quarta-feira, dezembro 03, 2014

T-BONE BURNETT FAZ COM QUE BOB DYLAN TENHA 26 ANOS DE IDADE NOVAMENTE EM 2014


T-Bone Burnett é um cara admirável.

Desde os tempos da Alpha Band nos anos 70, passando por sua carreira solo brilhante a partir dos anos 80, ele sempre gostou de encarar desafios complicados -- fosse como cantor-compositor-arranjador-guitarrista, ou apenas como produtor.

Parceiro musical de Bob Dylan desde os tempos da Rolling Thunder Revue, Burnett recebeu ano passado um desses desafios complicados, e adorou..

Dylan entregou a ele um pacote com cerca de 50 letras escritas -- mas não musicadas -- quando tinha 26 anos de idade, na ocasião de seu retiro na Casa de Woodstock com The Band, que gerou os festejados "Basement Tapes" em 1967.

Missão: montar uma espécie de banda de ocasião com artistas de relevo que topassem pegar aquelas letras escritas 47 anos atrás e não apenas transformá-las em canções, mas envolvê-las num projeto que pudesse soar sereno e grandioso, como uma versão revista e atualizada dos seus 'Basement Tapes".

Burnett gostou da idéia e encampou o projeto, mas não quis se envolver nele como músico -- ao menos, não diretamente.

Assumiu a cadeira de produtor.

Escolheu a dedo vários artistas amigos.

E os convidou para uma aventura musical sem precedentes na história do rock and roll.



O time de compositores convocado por T-Bone Burnett é composto por sua alma gêmea Elvis Costello, mais Jim James (do My Morning Jacket), Marcus Mumford (do Mumford & Sons), Rhiannon Giddens (Carolina Chocolate Drops) e Taylor Goldsmith (The Dawes).

Todos seguiram não para o velho estúdio improvisado no porão da Casa Rosa de Woodstock, onde os "Basement Tapes' originais foram gravados, mas para o Studio One da Capitol em Los Angeles, California -- provavelmente, o melhor estúdio de áudio de todo o Planeta Terra.

Conforme os ensaios e as sessões quase coletivas de composição corriam, todos iam achando o tom certo para suas participações no projeto.

E, sem perceber, começaram a interagir uns com os outros de uma maneira quase fraternal, com um envolvimento bem semelhante ao que rolou entre Bob Dylan e The Band em 1967..

Elvis Costello explica que todos procuraram tratar o parceiro Bob Dylan como um integrante da banda com 26 anos de idade que, por motivo de doença, não estava presente ao estúdio naquele dia.

A partir daí, saíram buscando maneiras de interagir com ele através de seus escritos -- sem reverências de espécie alguma, apenas como um talentoso companheiro de trabalho.

E foi assim que conseguiriam desenvolver um projeto sem ranço nostálgico e sem a preocupação de ter que correr atrás daquele mesmo tom dos "Basement Tapes" originais, preservando a personalidade musical de cada um dos integrantes.

Uma das preocupações principais deles todos foi tentar não compor melodias usando os fraseados musicais que Dylan adota habitualmente nas suas canções.

Não foi muito fácil a princípio.

Mas, depois que acharam o Norte, a coisa toda seguiu às mil maravilhas.



Das 50 canções que Dylan enviou, 20 ganharam melodia e foram finalizadas para este belíssimo "Lost In The River - The New Basement Tapes"

A primeira audição já impressiona, e muito, tanto pela beleza e pela densidade das canções quanto pela grandeza artística do projeto.

É nesses momentos que fica clara a enorme diferença que faz ter alguém como T-Bone Burnett no comando.

Serenamente, ele facilitou para cada um dos integrantes da "banda" achasse mais rapidamente o seu papel no projeto, e permaneceu a maior parte do tempo do outro lado do vidro, acompanhando as coisas da mesa de gravação.

Não se preocupou em imprimir seu toque pessoal acima das contribuições dos participantes, e buscou como produtor aquela mesma organicidade musical que faz do seu trabalho como artista solo algo tão intenso.

É impressionante como "Lost In The River" cresce a cada audição, combinando talentos jamais combinados antes de forma genial.


É sempre bom lembrar que, antes dos "Basement Tapes", Dylan era um compositor solitário, que interagia com suas bandas apenas nos palcos, na hora de tocar.

Nos "Basement Tapes" ele, pela primeira vez, teve a chance de ter parceiros nas suas canções -- vide "This Wheel's On Fire", composta com Rick Danko, e "Tears Of Rage", composta com Richard Manuel, ambos de sua banda na ocasião -- e os resultados foram notáveis.

Há diversas canções em "Lost In The River" em que essa mesma simbiose artística acontece -- e isso, por si só, já revela o quanto essa aventura musical é preciosa.

Essas canções vem encadeadas de forma delicada e envolvente, o que ajuda a fazer de "Lost In The Flood" um sério candidato a maior e mais bem resolvida empreitada musical do ano.

Como eu disse no início do texto, T-Bone Burnett é um cara admirável.

É o único produtor de discos que Bob Dylan nunca conseguiu levar à loucura.

Acreditem: não é pouca coisa..



WEBSITE OFICIAL
http://www.thenewbasementtapes.com/

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quarta-feira, setembro 03, 2014

APAIXONADO NA 3° IDADE, ROBERT PLANT REINVENTA SUA CARREIRA EM GRANDE ESTILO


No longínquo ano de 1968, todos os integrantes do grupo Yardbirds tinham acabado de abandonar o guitarrista Jimmy Page às vésperas de uma tournée pela Europa.

Jimmy entrou em desespero e saiu correndo atrás de conhecidos e indicados de conhecidos para montar às pressas uma nova versão dos Yardbirds para poder cumprir os compromissos.

Foi quando conheceu Robert Plant, com quem estabeleceu uma parceria brilhante à frente do Led Zeppelin durante 12 anos.


Pois bem: em 1982, quando Plant iniciou sua carreira solo, o comentário geral era: "okay, funciona, lembra o Zep, mas falta Jimmy Page".

E a insistência para que ele e Page reatassem a velha parceria passou a ser tamanha que lá pelas tantas, em meados dos Anos 90, eles cederam e acabaram gravando dois discos em colaboração: um reciclando canções do Zep com arranjos acústicos inusitados e outro bem elétrico e só com material inédito.

Ao final dessa parceria, Robert Plant sentiu o peso do legado do Led Zep nas costas e decidiu redirecionar de forma radical sua carreira solo.

Saiu buscando não só suas raízes folk e blues como também reagrupando sua primeira banda, o Band Of Joy, e partindo para aventuras musicais ao lado de cantoras do quilate de Alison Krauss e, mais recentemente, de Patty Griffin.

E então, dois anos atrás, montou uma banda espetacular, The Sensational Space Shifters, com quem gravou um belo disco ao vivo.


Agora, Plant e The Sensational Space Shifters finalmente estreiam em estúdio nesse recém lançado "Lullaby And The Ceaseless Choir".

É o décimo disco solo de Plant, e talvez o mais arrojado musicalmente de todos.

Aqui, as combinações de rock e folk com música árabe e música eletrônica ficam menos aleatórias e revelam um projeto coeso e com uma personalidade musical fortíssima.

Todas as composições são coletivas.

Algumas até lembram o Zep.

Mas o estranhamento decorrente da abordagem musical escolhida vem sempre antes, podendo tanto encantar os ouvintes mais aventurescos quanto afastar os fãs mais conservadores.

Mas esse é um risco que Robert Plant, aos 66 anos de idade, não tem o menor medo de correr.

O importante é sentir claramente que todas aquelas imposições de mercado de que Robert Plant vinha tentando se libertar há anos, agora ficaram bem para trás.



Três detalhes importantes:

Um: todas as canções de amor desse disco foram escritas para a cantora e compositora Patti Griffin, com quem Plant se casou recentemente.

Dois: a voz folk feminina com sotaque de Wales que vez ou outra surge nas canções é da jovem cantora Julie Murphy, e é tão linda e intensa quanto as vozes de June Tabor, Anne Haslam e Linda Thompson.

Três: a produção aventuresca de T-Bone Burnett é simplesmente sensacional, valorizando os arranjos densos dos seis integrantes do Sensational Space Shifters e dando a eles uma organicidade musical ímpar.



Recentemente, numa entrevista, perguntaram a Robert Plant se seu desinteresse numa reunião com seus velhos parceiros do Led Zeppelin não é só da boca pra fora.

Plant disse: "Pois é... perguntaram a mesma coisa para os Eagles recentemente, e eles disseram que voltaram a tocar juntos porque estavam entediados em suas carreiras solo"

E então, completou: "Pois esse, definitivamente, não é o meu caso".

Precisa dizer algo mais?






WEBSITE PESSOAL
http://robertplant.warnerreprise.com/

DISCOGRAFIA
http://www.allmusic.com/artist/robert-plant-mn0000830538/discography

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segunda-feira, dezembro 02, 2013

PEARL JAM, ELTON JOHN, NORAH JONES E BILLIE JOE ARMSTRONG EM 3 LPs MUITO INUSITADOS


Responda rápido: o que Norah Jones, Billie Joe Armstrong, Pearl Jam e Elton John tem em comum?

Em princípio, nada.

No entanto, todos esses artistas lançaram discos mais ou menos na mesma época -- meados do Outono no Hemisfério Norte --, provavelmente torcendo para que virem presentes de Natal -- e isso, com certeza, indica que são artistas com públicos assemelhados.

O caso é que, após toda a crise que assolou a Indústria Fonográfica nos últimos 10 ou 15 anos, algumas lições os executivos da música aprenderam. Por exemplo: nunca menosprezar o poder de fogo de um artista com público cativo, mesmo que esse artista insista muito em lançar um "produto" meio fora dos padrões da Indústria.

É (mais ou menos) o caso de todos os mencionados acima.

Um disco de Norah Jones voltado para os fãs dos Everly Brothers não é uma aposta fácil, nem mesmo para os ecléticos admiradores dela -- e menos ainda para os fãs do Green Day de Billie Joe Armstrong.

O mesmo vale para um cd de Elton John com vários temas instrumentais e sem um single grudento tocando o dia inteiro nas emissoras de rádio para puxar as vendas.

E quem conhece o Pearl Jam sabe que há muitos anos a banda exige de sua gravadora liberdade criativa total, e não aceita fazer concessões nesse sentido, grava o que quer e pronto..

Quinze anos atrás, talvez esses artistas tivessem "projetos fora do padrão" -- como esses que acabam de lançar no mercado -- arquivados por suas gravadoras, sob a alegação de que seriam investimentos muito arriscados e que provavelmente não dariam retorno.

Mas hoje, depois dessas mesmas gravadoras terem finalmente sentido a água bater em suas nádegas, elas não fazem mais isso.

Ao contrário: hoje elas agradecem aos céus por esses artistas veteranos -- que dispensam apresentações e maiores esforços de divulgação -- existirem, e ainda seguirem gravando e abastecendo o mercado com seus novos "produtos".



NORAH JONES E BILLIE LEE ARMSTRONG
FOREVERLY
Reprise (Warner Brasil)

Discos tributo a LPs clássicos raramente resultam em projetos bem resolvidos. Na maioria das vezes, acabam virando homenagens duvidosas envolvendo vários artistas -- vide o que aconteceu com os tributos a "Tapestry" de Carole King e "Rumours" do Fleetwood Mac, para citar apenas dois exemplos. Até por isso, quando a graciosa Norah Jones e o áspero Billie Joe Armstrong decidiram refazer faixa a faixa o clássico LP dos Everly Brothers "Songs Our Daddy Taught Us", de 1958, não chamaram ninguém para dividir a cena com eles, com receio de que o espírito da homenagem se diluísse numa super produção. Fizeram tudo sozinhos, em poucos dias, bem "low profile", para tentar resgatar o mesmo clima intimista que os irmãos Phil e Don Everly conseguiram imprimir na gravação do disco original. Claro que os dois cometem algumas ousadias aqui e acolá, até porque a idéia por trás de "Foreverly", o nome do disco, é não permitir que a homenagem seja reverente demais. São 12 canções tradicionais americanas que Norah e Billie Joe cantam em uníssono à moda dos Everlys. Os arranjos são discretos e delicados, e não seguem o mesmo padrão de instrumentação do LP original, como pode-se perceber em "Oh So Many Years" e "I’m Just Here to Get My Baby Out of Jail". Mas o mais legal de tudo é que tanto Phil Everly quanto Don Everly estão bem vivos -- ainda que meio aposentados, com 75 anos de idade. E homenagem legal é aquela que se recebe em vida.

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PEARL JAM
LIGHTNING BOLT
Monkeywrench-Virgin (Universal Brasil)

Recentemente, uma reportagem da BBC apresentava o Pearl Jam como um novo Grateful Dead, por ter conseguido em 22 anos de carreira imprimir uma marca musical muito forte num repertório extremamente variado em performances ao vivo nunca menos que espetaculares. Realmente, é meio difícil reconhecer no Pearl Jam de hoje aquela banda truculenta de Seattle que virou ícone da cena grunge em seus dois primeiros discos, do início dos anos 1990, e que lutou arduamente para que seus discos seguintes conseguissem sobreviver àquele modismo. Tanto que depois de dois discos quase experimentais -- "Vitalogy" e "No Code" -- o Pearl Jam deixou tanto a fúria quanto a latargia um pouco de lado e mergulhou de cabeça no Mainstream do Rock Americano -- só que com uma atitude bem aventuresca, em que toda e qualquer proposta musical se justifica contanto que não sirva apenas aos discos, mas principalmente aos palcos. Prova disso é que, de "Yield" (1998) para cá, a música do Pearl Jam ganhou uma organicidade que não tinha antes. Maturidade musical? Tesão de Palco? Sintonia fina entre companheiros de banda? Todos esses fatores certaamente contribuíram para a sedimentação do estilo musical da banda. "Lightning Bolt" é o 10º disco de estúdio deles, e quem se der ao trabalho de ouvir vai descobrir um Pearl Jam cada vez mais plural em termos musicais, em composições sempre grudentas e arranjos vigorosos. E fiquem tranquilos quanto ao ukelele de Eddie Vedder: dessa vez ele ficou em casa. Eddie comparece apenas tocando guitarra, piano e soltando a voz. E que voz....! E que banda....!

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ALTOeCLARO



ELTON JOHN 
THE DIVING BOARD 
Capitol (Universal Brasil) 

Desde "Songs From The West Coast" (2002), Elton John e Bernie Taupin parecem determinados a resgatar uma atitude que eles cultivavam em seus primeiros trabalhos juntos, quando gravavam álbuns magníficos como "Tumbleweed Connection" e 'Madman Across The Water" sem se preocupar com as paradas de sucessos, que eram supridas por singles desconectados desses LPs. 'Peachtree Road" (2004) e "The Captain & The Kid" (2006), seus discos seguintes, deram sequência a essa tendência vitoriosa em termos artísticos, mas decepcionante (para Elton) em termos comerciais. E então, depois de um projeto em colaboração com Leon Russell, 'The Union", produzido por T-Bone Burnett 3 anos atrás, Elton concluiu que só iria conseguir resgatar o frescor de seu trabalho nos anos 70 de forma plena se resgatasse também a urgência de seu modus operandi de compor e gravar na época, fazendo tudo rapidamente, utilizando poucos músicos, e sem se preocupar em deixar que as canções maturassem antes. "The Diving Board" é o resultado dessa experiência guiada por T-Bone Burnett. São 19 canções, sendo três delas interlúdios instrumentais, metade delas composta ou finalizada em 3 dias em 2012 e a outra metade em outros dois dias no início deste ano. São canções delicadas, vez ou outra auto-confessionais, sempre "no osso", que trazem saídas musicais bem distintas e parecem ter sido criadas para compor um mesmo contexto. Apesar disso, não dá para dizer que "The Diving Board" seja um disco conceitual. É, isso sim, uma espécie de prova de fogo pessoal. Elton John precisa, a essa altura da vida, achar razões para continuar produzindo discos novos -- até porque ele poderia viver tranquilamente fazendo tournées só com seu repertório clássico. Quer fazer isso da maneira menos complicada possível. Sob esse aspecto, "The Diving Board" é um triunfo. Mas eu, pessoalmente, acho que fica um pouco aquém dos 3 belos álbuns que ele compôs com seu parceiro Bernie na primeira década desse novo século.

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terça-feira, outubro 02, 2012

DIANA KRALL VOLTA À ALVORADA DO GREAT AMERICAN SONGBOOK EM SEU NOVO LP


Ninguém pode acusar Diana Krall de ser uma artista previsível.

Em vinte gloriosos anos de carreira, essa loura canadense estonteante (em todos os sentidos) já se revelou uma excelente pianista de jazz, e também se afirmou como uma cantora envolvente e versátil a ponto de conseguir cativar as mais sisudas platéias de jazzófilos.

Claro que, ao longo de todo esse tempo, nem tudo foram flores.

Nossa loura deu, sempre que pode, algumas puladas de cerca artísticas que, se por um lado lhe renderam alguns arranhões com setores mais ortodoxos da crítica, por outro lado foram deliciosamente aventurescas e divertidas.

Uma atitude positiva, bem na medida certa para quebrar com a obviedade que parecia estar reservada para sua carreira.


Pois bem: Diana Krall é não só surpreendente, mas também imensamente vaidosa.

Adora incorporar musas da canção de outras épocas

Se divertiu muito posando de Julie London no LP 'The Look Of Love" (2001).

Ficou muito à vontade brincando de Astrud Gilberto em "Quiet Nights", lançado no ano passado.

Até se deu ao luxo de cometer "The Girl In The Other Room", um belo disco de jazz com repertório contemporâneo de gente como Joni Mitchell, mesclado com 6 canções próprias inspiradas em Joni e compostas em parceria com o maridão Elvis Costello, com quem vive há quase 10 anos.

Diana topa qualquer parada para não cair prisioneira do formato que a consagrou em seu início de carreira.

Não que ela não goste de comandar um quarteto de jazz. Gosta, e muito. Mas não esconde de ninguém que almeja um público muito maior.



Seu novo LP, "Glad Rag Doll", é mais um ítem ousado em sua discografia.

Produzido por T-Bone Burnett a partir de um repertório de 35 canções meio obscuras dos anos 20, 30 e 40, que ela conhecia dos discos 78 rotações da coleção pessoal de seu pai, foi gravado utilizando pela primeiríssima vez um piano honky-tonk de armário, ao invés dos Steinways habituais.

Sua banda é composta por colaboradores contumazes de Burnett, como o multiinstrumentista Marc Ribot, o baterista Jay Bellerose e o baixista Dennis Crouch, mesclando sonoridades de ragtime com boogie woogie e, pasmem, até rock and roll.

Nossa loura certamente ficou impressionada com a multiplicidade musical dos últimos discos de seu marido produzidos por T-Bone, e quis tentar uma experiência semelhante, mesclando tradição e modernidade e subvertendo alguns padrões de mercado que devem irritar muito artistas criativos e desalinhados como ela.

Todas as canções de "Glad Rag Doll" são ótimas. Ela está cada vez mais arrojada como intérprete. A faixa título, por exemplo, apresentada em duas versões diametralmente diferentes, dá o tom exato dessas suas qualificações.

Isso para não mencionar as gravações soberbas e muito originais que ela fez para dois clássicos dos anos 50: "I'm A Little Mixed Up" -- um número de rock and roll rasgado -- e "Lonely Avenue" -- composta por Doc Pomus para seu amigo Ray Charles, aqui num arranjo todo climático e levemente atonal.


Verdade seja dita: Diana Krall está mais arrebatadora do que nunca na capa de "Rag Baby Doll".

Como ela consegue, aos 48 anos de idade -- que ela completa no dia 18 de Novembro --, isso só ela sabe.

Nossa loura abusa de seus atributos físicos na capa do disco, vestida como uma honky tonk girl dos tempos do ragtime e do vaudeville -- se bem que com alguns detalhes em couro liso que indicam uma atitude um pouco mais barra pesada,

Em outras palavras: Diana Krall continua uma artista e uma mulher fascinantes -- dois conceitos que não costumam ser complementares, mas que nossa lora sabe mesclar numa mesma persona artística como poucas outras divas da canção americana conseguiram.

"Glad Rag Doll" é, indiscutivelmente, desde seu conceito até o resultado final, um grande disco.

Traz Diana Krall bem do jeito que o diabo gosta -- e nós aqui também.



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terça-feira, julho 17, 2012

O NOVO DISCO DE JOE JACKSON REDIMENSIONA O FABULOSO LEGADO DE DUKE ELLINGTON


Nos dias de hoje, quem vê Elvis Costello se desdobrando em diversas frentes musicais -- ora gravando um disco de jazz para a Verve Records, ora gravando música erudita para a Deutsche Grammophon, ou então simplesmente oscilando entre o pop classudo de Burt Bacharach, o rock rasgado de sua banda, The Imposters, e flertes com country music ao lado de T-Bone Burnett -- não imagina que, muito antes dele, e fazendo muito menos barulho que ele, um outro artista de sua geração já havia percorrido todos esses caminhos -- de forma muito mais inusitada.

Esse artista é o cantor, pianista e saxofonista inglês Joe Jackson.

Jackson, para quem não lembra direito, foi uma das forças emergentes mais vitais da cena pós-punk inglesa, ao lado de Costello, Graham Parker, Dave Edmunds, Nick Lowe, The Clash e The Pretenders. À frente de um quarteto rápido e rasteiro, ele brilhou em uma sequência impecável de LPs bem desaforados e até hoje muito divertidos de se ouvir: "Look Sharp", "I´m The Man" e "Beat Crazy"

Mas assim que sentiu que a efervecência do pós-punk estava se dissipando, Joe Jackson deixou sua banda de lado e passou a perseguir um projeto musical pop muito requintado, com raízes no cancioneiro clássico americano e no jazz, mas também com um pé nos conceitos pop de seu amigo Thomas Dolby.

Nessa brincadeira, surgiram "Night & Day" e "Body & Soul", dois discos deliciosos e extremamente bem sucedidos comercialmente, onde Joe Jackson explora todas as vocações musicais que tinha até então, e mais algumas.



Pois bem: quase 30 anos se passaram desde então.

De lá para cá, Jackson seguiu explorando novas vocações musicais, criando trilhas sonoras para filmes, sinfonias jazzísticas e peças um tanto quanto idiossincráticas, sem jamais fazer concessões e seguindo firme num projeto artístico que cada vez mais se distanciava de seu trabalho mais consagrado, cujo valor -- tudo indicava a essa altura do campeonato --só iria ser devidamente reconhecido depois que ele morresse ou se aposentasse.

Mas nada disso foi necessário, felizmente.

Depois do retorno triunfal de seu quarteto original dos anos 70 para gravar um ótimo disco de estúdio e uma tournée que resultou num álbum ao vivo espetacular, Jackson parece estar empenhado em não permitir mais que seus projetos musical falem línguas diferentes das que ele já testou no passado, e menos ainda que sejam esnobados por seus velhos fãs.



"For Duke", seu novo trabalho, é um triunfo artístico assombroso.

Partindo do pressuposto de que Duke Ellington nunca teve uma atitude reverente em relação aos arranjos mais conhecidos de seus números clássicos, e sempre tratou de reinventar esse repertório das mais diversas maneiras possíveis, Joe saiu em busca de uma maneira original e pessoal para abordar o universo ellingtoniano.

E achou, sem dificuldades.

Sua primeira providência foi retirar todos os metais dos arranjos de Ellington e substituí-los por teclados e guitarras, para depois reinventar os andamentos e dar ao repertório um toque bem "lush", com climas musicais oscilando entre o cocktail bar, clubes de jazz e cabarets pós-modernos -- tudo isso sem jamais diluir os originais, ou sufocá-los com arranjos mal dimensionados.

Muitos jazzófilos mais tradicionalistas torceram o nariz para "For Duke".

Acharam o que Jackson fez uma heresia musical, e um desrespeito pára com Ellington.

Mas não é não.

É um trabalho ousado, corajoso, extremamente intrincado, que reúne num mesmo conceito musical músicos de naturezas muito diferentes -- como Iggy Pop e Sharon Jones, o guitarrista Steve Vai, o contrabaixista Christian McBride, a violinista Regina Carter e até a cantora brasileira Lilian Vieira, que faz uma releitura para "Perdido" que é quase um sambinha.

E, cá entre nós, eu que achava a versão que os Neville Brothers fizeram 20 e poucos anos atrás para "Caravan" um achado musical, fiquei completamente boquiaberto com a diversidade de idiomas culturais e musicais que Joe Jackson conseguiu afluir para sua releitura desse clássico ellingtoniano.

"For Duke" é um triunfo que é porque Joe Jackson partiu do presuposto de que Ellington jamais se importaria que a essência de sua música servisse de ponto de partida para investigações pessoais de outros artistas de naturezas diferentes da dele, e mergulhou fundo.

Ouça com carinho e deixe-se envolver, pois vale a pena.

Você provavelmente ficará espantado não só com as possibilidades que o universo ellingtoniano oferece, mas também com o altíssimo gabarito dos arranjos e das investidas musicais regidas por Jackson.

A este bravo príncipe punk que perdeu deliberadamente o caminho de casa e vagou sem rumo muito claro por exílios os mais diversos por tantos anos -- mas jamais irá admitir isso, até porque "angry young men" como ele não costumam ter vocação para filho pródigo --, minhas saudações:

Benvindo de volta, Mr. Jackson, estávamos com saudades.



BIO-DISCOGRAFIA
 http://www.allmusic.com/artist/joe-jackson-mn0000784732

WEBSITE OFICIAL
 http://joejackson.com/

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quarta-feira, maio 25, 2011

AS SEMPRE INCESSANTES AVENTURAS MUSICAIS DE BEN HARPER E JOSEPH ARTHUR (por Chico Marques)


Sempre que alguém usa o termo “superbanda”, logo se imagina músicos que passaram por bandas importantes no passado associados em projetos caça-níqueis altamente rentáveis, mas pouco recomendáveis artisticamente.

O conceito de “superbanda” surgiu nos anos 1970, quando qualquer pequeno arranhão no ego de qualquer membro de qualquer banda de rock já era o suficiente para desencadear uma carreira solo -- 90% das vezes duvidosa e, conseqüentemente, desastrosa.

Para que estrelas pop perdulárias conseguissem arcar com as dívidas decorrentes dessas aventuras solo, o jeito era embarcar em uma dessas “superbandas” promovidas pelas próprias gravadoras, e que tinham lá suas vantagens: não chegavam a ser comprometedoras, já que duravam pouco, rentabilizavam rápido e eram rapidamente esquecidas pelo grande público.

Foram tantas “superbandas” naquela época – Beck Bogert & Appice, West Bruce & Laing, Asia, KGB, The Firm, etc. etc. etc. – que, aos poucos, o público cansou e desistiu delas. O oportunismo delas ficou acintoso demais. Ninguém mais conseguia se impressionar com projetos oportunistas desse tipo.

E então, quando tudo parecia perdido, surgiram duas superbandas realmente autênticas, fruto de camaradagem verdadeira entre músicos muito talentosos. Uma era o Little Village -- de John Hiatt, Nick Lowe, Ry Cooder e Jim Keltner. E a outra, The Traveling Wilburys -- de George Harrison, Bob Dylan, Roy Orbison, Tom Petty, Jeff Lynne e (novamente) Jim Keltner.

Pois foi nesse mesmo espírito do Little Village e dos Traveling Wilburys que surgiu ano passado a superbanda folk Fistful Of Mercy, muito festejada pela crítica, que reunia os veteranos Ben Harper e Joseph Arthur com o jovem Dhani Harrison, filho de George Harrison. Os três se internaram por 3 dias num estúdio em Los Angeles, onde finalizaram em grupo várias canções que haviam sido esboçadas individualmente, e partiram numa tournée pela Europa para promover o disco -- que, diga-se de passagem, marcou presença em 9 de cada 10 listas de melhores do ano passado.

Agora, oito meses mais tarde, enquanto Dhani Harrison prepara aos poucos seu primeiro trabalho solo, Ben Harper e Joseph Arthur já estão de volta ao expediente normal com suas bandas, e acabam de lançar discos solo no mínimo interessantes.


Ben Harper convocou pela segunda vez o grupo Relentless7 para seu décimo primeiro LP de estúdio, “Give Till It´s Gone”, uma coleção de canções bem urgentes que aparentemente não puderam esperar por um “álbum de conceito”. Não é uma ironia, e sim um fato: são poucos os discos de estúdio de Harper que não seguem uma orientação temática e um planejamento extremamente cuidadoso. E nesse planejamento está incluída sua persona enigmática e múltipla, sempre flexível a ponto de permitir que ele se comporte às vezes como guitar hero, outras vezes como cantor e compositor, e quase sempre como o carismático band leader de uma jam band. Aos 42 anos de idade, já velho conhecido do público brasileiro, é um dos artistas mais intensos da cena musical americana e um compositor de talento raro, que a cada nova investida se revela ainda mais interessante.

“Give Till It´s Gone”, gravado inteiramente na “garagem estúdio” da casa do amigo Jackson Browne, é um disco bem diferente dos outros que Harper lançou de 1994 para cá -- quase sempre à frente dos Innocent Criminals --, apesar de seguir fielmente a cartilha de nunca se assumir como artista de um ou outro gênero musical. Números não muito acelerados como “Rock & Roll Is Free” fazem contraponto a baladas belíssimas como “I Will Not Be Broken” e “Pray That Our Love Sees The Dawn”, num conjunto de canções bem consistente, Além disso, conta com participações inspiradas de Jackson Browne, o anfitrião, e também de Ringo Starr, que se convidou para a brincadeira por indicação do “sobrinho” Dhani Harrison.


Nesse novo trabalho, Ben Harper optou novamente por simplificar a produção e gravar todas as faixas ao vivo no estúdio. Brinca com sonoridades dissonantes, deixa a banda tocar solta, e foge de todas as armadilhas de produção que sufocaram “Diamonds On The Inside” -- uma de suas melhores coleções de canções até hoje, mas também um de seus discos mais datados em termos sonoros. Harper aprendeu que, para sobreviver gravando discos com material inédito no mercado atual, o ideal é seguir os ensinamentos de quem é da cena independente e está habituado a fazer milagres com verbas menores. Todo mundo ganha com isso: as canções brilham mais, a gravadora pressiona menos e tudo fica muito mais fácil de tocar ao vivo nas tournées. Harper trocou muitas figurinhas com Joseph Arthur -- um especialista em produções rápidas, rasteiras e bem realizadas -- durante as sessões de gravação do disco do Fistful Of Mercy ano passado, e já saiu aplicando as lições aqui. Ele, definivamente, não perde tempo.


Joseph Arthur é bem menos conhecido que Ben Harper, apesar de estar na estrada há quase tanto tempo quanto ele. Nascido em Akron, Ohio, 39 anos atrás, ele foi tentar a sorte no circuito folk da Califórnia, e em 1997 deu a sorte, e também o azar, de ser descoberto por Peter Gabriel, que o contratou para seu selo New World, voltado prioritariamente para artistas de world music. Seu primeiro disco para o selo, “Big City Secrets”, serviu para tirá-lo do ghetto folk e projetá-lo para o público de Peter Gabriel. No entanto, as dificuldades financeiras da New World impediram que ele recebesse a promoção que merecia, e acabou perdido num limbo artístico por quase três anos. Só no terceiro trabalho, “Come To Where I'm From” (2000), com produção de T-Bone Burnett e uma levada mais country rock, Joseph Arthur conseguiu atingir um público mais amplo. Devidamente amparado pela Virgin Records, ele começou a desenvolver projetos mais ambiciosos, sempre influenciado por Gabriel e seguindo conselhos de amigos como Joe Henry e T-Bone Burnett. Levou alguns anos até a Virgin finalmente se desinteressar dele. Mas quando isso aconteceu, Joseph Arthur já era uma força emergente na cena independente. De lá para cá, gravou uma série de Lps e EPs impacáveis com sua banda The Lonely Astronauts para seu selo próprio, mesclando folk com pop em contextos sonoros no mínimo inusitados e firmando-se como um dos compositores mais solicitados da cena atual.


Seu novo LP, “The Graduation Ceremony”, vem nessa mesma trilha de excelência, e é, desde já, um sério candidato a melhor disco deste ano. Repleto de canções intensas e serenas, nele a delicadeza musical de Joseph Arthur se expressa em diversos formatos. Desde o folk-pop de “Out On A Limb” e “Almost Blue”, cujo vigor lembra Jeff Buckley, até baladas pungentes como “Watch Our Shadows Run” e “Face In The Crowd”, com falsetes que lembram um pouco Neil Young no início dos anos 1970. Apesar dessas referências, não se engane: é um trabalho completamente original, de um artista muito pouco conhecido aqui no Brasil, e que merece ser devidamente descoberto. Detalhe: Joseph Arthur é também pintor, e suas aquarelas são muito expressivas. A linda capa de “The Graduation Ceremony” é mais um belo exemplo de seus múltiplos talentos.


Tanto Ben Harper quanto Joseph Arthur são de uma geração de artistas que aboliu rótulos para poder passear por diversos gêneros musicais sem virar vítimas das famigeradas classificações de mercado -- que os coleguinhas da Billboard Magazine tanto defendem.

Suas contínuas aventuras musicais vão longe. Podem ter certeza de que, antes mesmo do final deste ano, tanto um quanto outro já estará flertando com algum novo projeto para o ano que vem. Os dois são incansáveis.

É graças à iniciativa de artistas incansáveis e inclassificáveis como Ben Harper e Joseph Arthur que a cena musical americana não cansa de se reinventar, mesmo durante a maior crise de história da Indústria Fonográfica.


BEN HARPER
DISCOGRAFIA, FOTOS E ENTREVISTAS
http://altoeclaro.blogspot.com/2011/05/senhoras-e-senhoresben-harper.html


JOSEPH ARTHUR
DISCOGRAFIA, FOTOS E ENTREVISTAS

http://altoeclaro.blogspot.com/2011/05/senhoras-e-senhores-joseph-arthur.html


HIGHLIGHTS: BEN HARPER

"GIVE IT TILL IT´S GONE"







HIGHLIGHTS: JOSEPH ARTHUR

"THE GRADUATION CEREMONY"



sexta-feira, maio 06, 2011

PETER CASE E STEVE EARLE: OUTSIDERS, GRAÇAS A DEUS! (por Chico Marques)



Até meados dos anos 60, o mundo da música funcionava assim: cantor cantava e compositor compunha.

Os compositores trabalhavam nos escritórios das editoras que publicavam suas canções. Davam duro para abastecer os cantores contratados pelas gravadoras. Ao contrário de Nashville ou Los Angeles, onde compositores trabalham em casa, havia em Nova York um lugar mítico chamado Tin Pan Alley, próximo ao Brill Building da CBS, que reunia a maioria desses escritórios – que, por sinal, desapareceram quase por completo no final dos anos 1960, quando compositores dos mais diversos gêneros se rebelaram e decidiram que podiam muito bem cantar e gravar suas próprias canções. E foi aí que todo mundo descobriu como eram as caras de John Prine, Kris Kristofferson, Carole King, Barry Mann, James Taylor, Jackson Browne, Warren Zevon e tantos outros que sempre tiveram seus nomes escritos em letras bem pequenas nos discos, logo abaixo dos títulos das canções.

Com o passar do tempo, as novas gerações de cantores-compositores perceberam que tinham uma condição privilegiada dentro da Indústria Fonográfica -- que sempre precisava deles para eventualmente abastecer um ou outro artista recém-inventado na sala de algum executivo. Para muitos jovens cantores-compositores que participavam de bandas, essa era a garantia de que, caso a banda falhasse e fosse dispensada da gravadora, haveria a chance de permanecer contratado como artista solo.


É o caso de Peter Case, e também o de Steve Earle, dois dos cantores-compositores mais admiráveis da cena americana dos últimos 25 anos. Apesar de musicalmente muito diferentes, possuem muito mais em comum do que aparentam. Ambos nasceram em 1954. Ambos são meio folk singers, meio rock and rollers. Ambos estrearam solo em 1986 com LPs sensacionais que constam da maioria das listas dos melhores da década de 1980 nos Estados Unidos. Ambos foram alvo de grandes apostas da parte de Indústria Fonográfica e acabaram descartados por ela -- para depois ressurgir na cena alternativa, onde permanecem firmes e fortes até hoje. Ambos são cristãos fervorosos. E, para completar o quadro, são também romancistas e possuem vários livros publicados.


Peter Case sabia desde cedo que queria ser cantor e compositor. Teve várias bandas nas escolas que frequentou, em Buffalo, New York. e sempre que podia dava um jeito de subir com seu violão nos palcos dos clubes folk da cidade. Assim que se emancipou, mudou de mala e cuia para a Califórnia, onde virou músico itinerante, circulando entre San Francisco e San Diego e participando de várias bandas. Uma das canções que gravou com o grupo The Nerves, “Hanging On the Telephone”, recebeu um cover do Blondie, e estourou nas paradas americanas. Infelizmente, The Nerves implodiu antes de poder tirar proveito do feito, mas Case conseguiu capitalizar isso a favor de sua banda seguinte, The Plimsouls, que rapidamente se transformou num dos atos mais disputados na cena de Los Angeles do início dos anos 1980 -- e acabou abençoado pelo produtor Richard Perry em dois ótimos LPs de estúdio e um ao vivo melhor ainda.


Sua carreira solo conseguiu superar ainda mais essas espectativas iniciais, numa seqüência de álbuns brilhantes e sempre inusitados, primeiro para a Geffen e depois para a independente Vanguard, onde deixou claro para todos que era um dos melhores compositores americanos, assim como um excelente cantor, um bom guitarrista e um tremendo gaitista. Gosta de definir sua música como “folk tribal”. Entre seus fãs confessos, nada menos que Allen Ginsberg, T-Bone Burnett e Bruce Springsteen.


Seu novo trabalho, “Wig!”, é surpreendente. É o primeiro LP que ele grava depois de uma delicadíssima cirurgia do coração, onde tinha poucas chances de sobreviver. Quem esperava música tranqüila e sossegada, quebrou a cara. Case voltou mais roqueiro e mais elétrico do que nunca, em blues e rocks bem sujos, sem marcação de contrabaixo, acompanhado apenas pelo guitarrista Ron Franklin e pelo baterista D J Bonebreak, do lendário grupo X. O resultado final é brilhante, cru ao extremo, e muito divertido – tem até uma releitura bem palhaça para “Old Blue Car”, single de sucesso de seu primeiro ábum solo, gravado 25 anos atrás. Totalmente gravado ao vivo em estúdio, “Wig!” é cativante da primeira à última faixa, e possui uma urgência típica de quem andou brigando pela vida e quase a viu escapar pelas suas mãos de bobeira. Uma aula exemplar de rock and roll, blues, jogo de cintura, bom humor e tudo mais que vocês quiserem...


Steve Earle também sabia desde cedo que queria ser cantor e compositor. Nascido em Vancouver, mas criado em San Antonio, no Texas, era fascinado pelo trabalho de Townes Van Zant, e iniciou sua carreira aos 16 anos nos clubes de Houston. A conselho do próprio Townes, que acabou virando seu amigo, Steve foi tentar a sorte em Nashville, e teve boa acolhida na banda de Guy Clark, tanto como guitarrista quanto como compositor. Estreou solo com “Guitar Town”, um disco de rockabilly que foi execrado pela comunidade musical de Nashville mas ganhou fãs incondicionais na cena roqueira americana, na época entusiasmada com artistas country desalinhados como Dwight Yoakam e Lyle Lovett. Oscilou anos e anos entre essas duas cenas musicais. Casou uma dezena de vezes, foi em cana outra dezena de vezes – por posse de heroína, por bater em seus próprios seguranças e por não pagar várias pensões alimentícias --, mas desde 1995 tomou vergonha na cara. Largou as drogas, casou (e sossegou) com a cantora Allison Moorer, e está totalmente dedicado à sua carreira artística, gravando um disco a cada dois anos, escrevendo romances e até trabalhando como ator na premiada série “Treme”, da HBO.


Seu novo trabalho, ‘I´ll Never Get Out Of This World Alive”, é uma homenagem a Hank Williams, que costumava dizer essa frase. Reúne a sua produção dos últimos 4 anos, incluindo duas canções que deu para Joan Baez gravar – “God Is God” e “I Am A Wanderer” – e também “This City”, sobre New Orleans, tema da série “Treme”, com um belo arranjo de metais de Allen Toussaint. Aqui, mais uma vez, Steve une forças ao amigo e produtor T-Bone Burnett, que busca as texturas musicais ideais para a alma texana dessas novas canções – todas compostas em Nova York, onde vive atualmente, bem longe do Estado da Estrela Solitária, e talvez por isso mesmo mais texanas do que nunca. Seu belo dueto com Allison Moorer em “Heaven Or Hell” é simplesmente estupendo, uma das baladas country mais desconcertantes já compostas. Enfim, ‘I´ll Never Get Out Of This World Alive” é um LP tão superlativo e fundamental quanto os anteriores “Transcendental Blues” e “I Feel Alright”. Mesmo quem não gosta de country music não vai conseguir torcer o nariz para mais essa pequena obra prima de Steve Earle.


Cantores-compositores como Steve Earle e Peter Case são mais que menestréis modernos. Eles são o Sal da Terra de qualquer modalidade de Música Popular. Os gêneros e subgêneros musicais passam. Eles permanecem. Sempre possuem a cara do seu tempo. E, vez ou outra, deixam legados que as gerações seguintes não cansam de redescobrir.

Agora, privilégio mesmo é ser contemporâneo desses caras...



HIGHLIGHTS
PETER CASE - "WIG!"








HIGHLIGHTS
STEVE EARLE - "I´LL NEVER GET OUT OF THIS WORLD ALIVE"