Difícil acreditar que Cat Power já seja uma veterana da cena independente americana...
Mas é verdade. O tempo passa para todos. O mais curioso é tentar reconhecer no trabalho que Chan Marshall -- o nome verdadeiro dessa novaiorquina louquinha de pedra -- desenvolve hoje a mesma anarquista folk-punk arrogante e desgovernada de seus primeiros discos "Dear Sir" e "Myra Lee", ambos gravados no mesmo dia, em 1995.
Ela começou sua carreira já enfiando o pé na jaca, abrindo shows para a desbocada Liz Phair numa tournée completamente perdulária. Foi quando conheceu Steve Shelley, baterista do Sonic Youth, e o guitarrista Tim Foljahn, do grupo Two Dollar Guitar, e transformou o conceito Cat Power numa banda de verdade.
Iniciou uma longa associação com a Matador Records que persiste até hoje, a partir de "What Would the Community Think?", de 1996, extremamente bem recebido pela crítica na época, que ficou impressionada com suas canções sempre derramadas de emoção e seus vocais catárticos.
Faltava ganhar o público.
E isso Cat Power conseguiu em mais dois discos de material original extremamente bem resolvidos: "Moon Pix", de 1998 e "You Are Free", de 2003, com participações especialíssimas de Dave Grohl e Eddie Vedder.
Foi mais ou menos por aí que ela decidiu flertar abertamente com a música produzida em Memphis, Tennessee, e mergulhou de cabeça no blue-eyed soul em discos como "The Greatest" e as coleções de covers "The Covers Record" e "Jukebox". Com resultados surpreedentemente positivos, diga-se passagem.
Era difícil acreditar, mas a irrascível Cat Power havia finalmente sido absorvida pelo mercado musical.
E o que é melhor: sem ter que vender a alma para nenhuma gravadora, nem ter que se submeter a algum produtor metido a gênio da raça empenhado em facilitar sua entrada no mainstream.
Pois a julgar por "Sun", o mais recente trabalho de Cat Power, tudo o que ela quer agora é justamente não ser aceita facilmente pelo mainstream.
Que se dane se o seu time está ganhando ou não. Ela insiste no seu apreço pelo incerto e segue topando qualquer parada para não virar escrava do pessoal de marketing de sua gravadora.
"Sun" é um disco muito agradável e, ao mesmo tempo, muito estranho também.
É consequência direta de suas recentes andanças pelo mundo afora, e vem repleto de loops musicais que lembram tanto o pop francês dos anos 70 quanto a bossa nova brasileira e o minimalismo de seu amigo Philip Glass.
Aqui ela está cantando bem melhor, sobrepondo sua própria voz em diversas camadas diferentes, e os arranjos trazem um instrumental cru e ao mesmo tempo sofisticado, repleto de surpresas e ousadias.
Para completar, é sua estréia, vitoriosa, como produtora.
Eu não ousaria destacar nenhuma faixa do disco. São todas muito envolventes. Acabo de ouvir o disco três vezes seguidas. É primoroso. Denso, suave, climático e cheio de atitude.
Convenhamos: não é pouca coisa.
"Sun" rompe com quase tudo que Cat Power vinha fazendo nos últimos anos.
A obsessão com o som de Memphis dos últimos discos foi por água abaixo, assim como qualquer resquício folk ou punk que ainda restasse no trabalho dela.
Permanece apenas a truculência melódica habitual, dentro de uma nova moldura sonora extremamente arrojada, inquieta e complexa.
Francamente, não acho que valha a pena ficar tentando definir com palavras o que Cat Power realizou aqui. Melhor ouvir "Sun" e tirar suas próprias conclusões. Só não espere nada fácil.
Ou seja: prepare-se para se deixar arrebatar mais uma vez pelo talento de Chan Marshall.
BIO-DISCOGRAFIA
http://www.allmusic.com/artist/cat-power-mn0000803009
WEBSITE PESSOAL
http://www.catpowermusic.com/
AMOSTRAS GRÁTIS
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