domingo, junho 17, 2012

DIÁRIO DE BORDO - SANTOS JAZZ FESTIVAL - 16/06/2012 - SEGUNDO DIA DA MARATONA DE SHOWS



A expectativa era grande para um sábado de sol maravilhoso na segunda maratona de shows de rua do Santos Jazz Festival.

Desde as primeiras apresentações à tarde, no palco camerístico da Bolsa do Café, havia alguma coisa no ar que indicava que teríamos um dia muito especial.

O astral pacífico das performances vespertinas bem intimistas, e lotadas, do guitarrista Alexandre Birkett e seu Trio, e do pianista Robson Nogueira com o cantor Celso Lago, já indicavam que tudo estava em seu devido lugar, e que dalí para a frente bastaria simplesmente deixar rolar, sem sobressaltos.

Pois foi exatamente o que aconteceu, desde o início da primeira atração do Palco da Rua XV.

Às 6 horas da tarde, a cantora Babi Mendes subiu ao palco acompanhada pelo saxofonista Maurício Fernandes e seu quarteto, e começaram a apresentar canções de seu disco "Short Stories" -- um trabalho extremamente bem produzido e "empacotado" da maneira mais adequada para promover seus talentos como cantora quanto como compositora.

Perfeitamente integrada com seu time de músicos -- todos empenhados em aparecer pouco, e "fazer escada" para Babi --, ela conseguiu realizar um show muito superior ao do lançamento de seu disco no SESC-Santos meses atrás. Na metade do tempo regulmentar, dispensou a banda e chamou o hábil guitarrista Marcos Canduta para um set de duetos voz e guitarra com clássicos do jazz, muito bem recebidos pela platéia.

E então, depois de três números bem intimistas, volta ao palco o poderoso quarteto de Maurício Fernandes para fechar a apresentação em grande estilo com "Grapefruit" e com uma releitura deliciosa para "I Got Rhythm", de George & Ira Gershwin, onde a banda mostrou todo o seu suingue invejável.

Verdade seja dita: Feliz o cantor ou cantora que conta com músicos como esses na retaguarda.



Por volta das 7 e meia da noite, o veterano Filó Machado e sua banda subiram ao palco, com seu approach musical extremamente arrojado, que une um blend personalíssimo de soul bem brasileiro com improvisos jazzísticos sempre surpreendentes.

Filó é um desses caras que sempre teve uma entrada muito mais fácil no mercado estrangeiro do que por aqui.

Veterano, com mais de 30 anos de carreira, muita gente se lembra bem de seus discos do início de carreira, mas a grande maioria não sabia ao certo por onde ele andava desde então.

Pois acabaram descobrindo da melhor maneira possível, numa performance brilhante e vibrante à frente de uma banda impecável.


Mais adiante, às 9 e meia da noite, subiu ao palco o aguardado quinteto gaúcho Delicatessen.

Numa performance de uma elegância musical impressionante, o Delicatessen apresentou prioritariamente clássicos do "Great American Songbook" em arranjos muito originais, sempre sob o comando da cantora Ana Krieger,

Com eles, uma canção como "My Foolish Heart", por exemplo, que já teve centenas de gravações, ganha uma leitura completamente original. Por um lado, ela mantém toda a doçura de seus versos originais enquanto está sob o comando de Ana. Mas assim que ela termina sua parte, a banda assume embarcando num clima musical denso e turbulento, dando a entender que a descoberta do amor pela protagonista da canção não vai ser algo muito harmonioso, nem deve ter um final feliz. 

São sacadas musicais como essa na hora de elaborar seus arranjos que fazem do Delicatessen algo muito especial na cena musical atual, e que justifica todos os prêmios que o grupo vem colecionando ao longo desses últimos anos.

Depois de pouco mais de 45 minutos de show, a platéia do Santos Jazz Festival estava completamente rendida ao encanto e à delicadeza musical do Delicatessen.

Taí um grupo que merece toda a (boa) fama que tem.


Já eram quase 11 da Noite quando o genial Heraldo do Monte e seu filho Luís do Monte subiram ao palco, cada um empunhando uma guitarra, e começaram uma brincadeira longa e deliciosa com a clássica "Fly Me To The Moon", sem banda nenhuma acompanhando.

Nem precisava. Foi como se eles estivessem em casa, tocando em pé para seus convidados.

Tocaram sem parar durante quase uma hora para uma platéia silenciosa e completamente hipnotizada.

Foi simplesmente magnífico.

Uma aula de guitarra que deixou todos os guitarristas que estavam na platéia com um sorriso permanente dos lábios e todos os demais com a certeza de que haviam acabado de presenciar um momento musical único e inesquecível.



E então, à meia-noite, o palco do Santos Jazz Festival recebeu de braços abertos o ótimo trio do bluesman torcedor fanático do Santos Futebol Clube, o guitarrista paulistano André Christovam

André começou manso, com números instrumentais. Mas depois de um breve aquecimento com clássicos de seu repertório como "Dados Chumbados" e "Genuíno Pedaço do Cristo", André chamou seu mestre Heraldo do Monte para voltar ao palco e acompanhá-lo num dueto de guitarras em "Jumping The Blues", de Duke Ellington -- mas não sem antes chamá-lo de "El Presidente" e ressaltar para todos os presentes que Heraldo é um guitarrista único, um craque absolutamente original de seu instrumento, da mesma grandeza de Charlie Christian e Django Reinhardt.


Depois dessa aula de delicadeza e camaradagem musicais, André, ainda não satisfeito, chamou ao palco seu segundo convidado: o lendário guitarrista paulistano Faísca.

Juntos, os dois passearam com suas guitarras fulminantes por clássicos de Junior Wells ("Early In The Morning"), B B King ("Help The Poor" e "Caldonia"), Albert King "Crosscut Saw"), Freddie King ("Someday After Awhile) e Sonny Boy Williamson ("Eyesight To The Blind"), e só pararam quando a voz de André desapareceu por completo.


Por volta de uma da manhã, completamente afônico, pediu desculpas à platéia por ter que encerrar por aí, mas ainda conseguiu dizer, com muita dificuldade, que foi um grande prazer estar de volta a Santos, e a um palco bem aconchegante como esse, repleto de amigos, e em particular a essa edição inaugural do Santos Jazz Festival.

De quebra, sentenciou: "Tudo bem que os Corinthianos merecem respeito, etc e tal, mas não adianta: quarta feira é dia de comer galinha preta SIM!".

Quem viver, verá.






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