terça-feira, março 01, 2016

2 OU 3 COISAS SOBRE "RAINBOW ENDS", LP DE RETORNO DE EMITT RHODES APÓS 43 ANOS DE SUMIÇO

por Chico Marques


Tem artistas que compoem com facilidade, e artistas que compoem pouco -- e, com isso, acabam gravando seus discos com intervalos mais prolongados que aqueles que possuem uma produção mais abundante.

Mas o que dizer de um artista pop muito conceituado, que era extremamente prolífico no final dos Anos 60 e início dos Anos 70, e, de uma hora para outra, decidiu parar e ficar sem gravar um novo disco por nada menos que... 43 anos?

Senhoras e Senhores, este é Emmit Rhodes, que brilhou à frente do grupo pop The Merry Go Round no final dos Anos 60, e que teve logo a seguir uma carreira solo reconhecidamente brilhante em quatro discos hoje considerados antológicos, fortemente influenciados por Paul McCartney tanto na maneira de compor e de cantar quanto na de elaborar seus arranjos e se autoproduzir.


Mr. Rhodes não sabe explicar ao certo porque ficou tanto tempo sem gravar -- até porque, ao longo desse tempo, nunca deixou de compor e prosseguiu trabalhando como engenheiro de som para vários artistas diferentes. Mas lembra que, na ocasião, tinha como obrigação contratual entregar um disco a cada seis meses para a ABC-Dunhill, e não conseguia cumprir os prazos, pois além de cantar e tocar todos os instrumentos nesses discos discos solo do início dos Anos 70, ele era também produtor. E um produtor do tipo perfeccionista.

No final das contas, o que Mr. Rhodes queria mesmo era seguir as pegadas de Paul McCartney em seu primeiro disco solo, onde tocou todos os instrumentos. Mas esqueceu do detalhe que McCartney trabalhou neste disco despreocupadamente, sem ter que cumprir prazos apertados. Ele não. Era constantemente obrigado a pagar multas contratuais para sua gravadora, e mal conseguia ver os royalties que lhe eram devidos pela vendagem dos discos.

Um belo dia ele cansou de perder dinheiro tentando ter uma carreira no showbiz, e se recolheu. Em suas próprias palavras: "a impressão era de que eu nunca estava trabalhando o suficiente para me manter viável como artista."


Incentivado por amigos mais próximos, que mantiveram contato com sua produção musical não-gravada nesses anos todos e nunca deixaram de estimulá-lo a retomar sua carreira, agora parece que Emitt Rhodes voltou finalmente, quebrando um hiato de 43 anos, com esse "Rainbow Ends" (Omnivore Records), um disco arrebatador, de uma simplicidade impressionante, deliciosamente atemporal.

Apesar da barba branca e dos muitos quilos a mais, Mr. Rhodes ressurge com sua voz delicada e quase juvenil praticamente intacta em meio a 11 canções curtas tão intensas e memoráveis que grudam nos ouvidos logo após a primeira audição.

Dessa vez ele não quis se autoproduzir, e entregou a produção a seu amigo Chris Price, e ao invés de tocar todos os instrumentos contou com um time de músicos (admiradores seus) vindos de bandas conhecidas: gente do quilate de Roger Joseph Manning, Jason Faulkner, Nels Cline, Taylor Locke, Joe Seiders, Susanna Hofts e Pat Sansone. E com isso, realizou um disco extremamente orgânico e desencanado. Tão bom que nem vale a pena destacar uma canção ou outra, pois todas são de primeira grandeza.

Consta que, além dessas onze canções, Mr. Rhodes gravou mais uma penca delas, em número suficiente para compor outros dois discos como esse. Se isso é verdade ou não, só poderemos confirmar ao longo dos próximos anos, caso surjam novos discos dele com registros dessa mesma sessão de gravação.


Se Emitt Rhodes tivesse sido menos teimoso e idealista naqueles tempos da ABC-Dunhill e trabalhado nos moldes atuais, com certeza não teria tido tantos problemas em sua carreira.

Mas não adianta colocar as coisas nesses termos. Tem coisas que só o passar do tempo ensina para a gente. A não-necessidade de precisar provar algo para nós mesmos a uma determinada altura da vida é uma delas.

Enfim, "Rainbow Ends" é um retorno vigoroso de um grande artista que fazia muita falta na cena pop americana.

Tomara que o público tenha a grandeza de recebê-lo de volta com a dignidade que ele merece.



AMOSTRAS GRÁTIS