sexta-feira, outubro 30, 2015

2 OU 3 COISAS SOBRE "CROSSEYED HEART", NOVO LP SOLO DO SOUL SURVIVOR KEITH RICHARDS

por Chico Marques


Depois de um mês escutando quase diariamente o novo disco de Keith Richards, "Crosseyed Heart", e já sabendo de antemão que seria impossível para mim escrever uma resenha empírica sobre ele, decidi partir para a louvação mesmo. 

A verdade é que eu adorei "Crosseyed Heart". Presumo que todos os que conheçam bem o trabalho de Keith tenham adorado o disco também. Tudo é completamente familiar da primeira à última faixa. O surpreendente aqui não é o conteúdo do disco. E sim a atitude na hora de executar as canções. 

É uma pena que os Rolling Stones não tenham mais saco nem para gravar novos discos de estúdio -- o último, "A Bigger Bang", já tem onze anos de idade --, nem para trabalhar de forma tão francamente descomplicada quanto a escolhida por Keith nesse disco.



Quando Keith Richards brigou feio com Mick Jagger 30 anos atrás, na ocasião da gravação do LP "Dirty Work", alegando que os Stones precisavam urgentemente cair na estrada para continuar sendo relevantes como banda -- e Mick bateu o pé e discordou --, não havia mais futuro possível para os Rolling Stones naquele momento. 

Havia uma clara situação de rompimento entre os dois. Tanto que gravaram suas partes em "Dirty Work" em horários alternados, sem olhar na cara um do outro. Só não se separaram porque a banda é, antes de mais nada, uma empresa muito rentável, e desmontá-la naquele momento seria uma operação muito complicada. 

Foi quando Keith decidiu dar um tapa na cara com luvas de pelica em Mick, reunindo um grupo de artistas que admirava e montando uma banda com eles, The X-Pensive Winos, para em seguida cair na estrada e -- heresia das heresias! -- gravar dois discos -- "Talk Is Cheap" (1988) e "Main Offender" (1992) -- que, apesar de serem tecnicamente discos solo, eram nitidamente discos de banda.

E essa banda não era The Rolling Stones.



Mick Jagger já tinha três discos solo até então. 

Todos eles meio frios, orientados por produtores, e gravados com o apoio de músicos de estúdio altamente profissionais, mas que em momento algum suam a camisa. 

Não havia nesses discos o menor vestígio daquele vigor que só o trabalho de uma banda de verdade pode proporcionar, e Jagger sabia bem disso, tanto que morreu de ciúmes da atitude de Keith. 

No final das contas, teve que dar o braço a torcer. 

E então, os Rolling Stones voltaram com um disco sensacional em 1989 -- "Steel Wheels" -- e uma tournée espetacular a reboque do disco. 

Foi a última com Bill Wyman no baixo, que deixou a banda por ter desenvolvido pânico de aviões, mas preferiu alegar não suportar mais o estilo de vida de seus velhos parceiros.



Apesar de Keith Richards contar com o apoio de vários X-Pensive Winos -- Steve Jordan, Waddy Wachtel, Ivan Neville, Sarah Dash -- na maioria da faixas de "Crosseyed Heart", não estamos diante de um disco de banda como nas duas vezes anteriores. 

De certa forma, esse talvez seja o primeiro disco solo de verdade de Keith. 

Ao invés de uma banda, dessa vez ele está cercado de músicos amigos. 

Os sopros derradeiros de seu velho comparsa Bobby Keys, por exemplo, estão registrados aqui, em "Crosseyed Heart".

A sempre adorável Norah Jones também faz uma participação muito delicada nessas sessões de gravação.



O momento atual é completamente diferente do vivido por Keith Richards nos Anos 80. 

O futuro dos Stones não parece ser mais uma preocupação em sua vida. 

As tournées que antes promoviam discos novos agora promovem o programa de relançamento da discografia original dos Stones, repletas de bonus tracks e com remasterização supervisionada por Keith e Mick. 

Dizem as boas e as más línguas que vários supostos leftovers da banda da década de 1970 incluídos nestes relançamentos foram na verdade compostos recentemente e fajutados como canções clássicas.

Mick e Keith não dizem que sim, nem que não.



Enfim, "Crosseyed Heart" é um disco com a cara de Keith Richards. 

Que revela um artista multifacetado em toda a sua plenitude, mas que sempre usou -- e, pelo visto, sempre vai usar --  o blues como via de acesso a todas as linguagens musicais que lhe interessam. 

Melhor indicativo disso do que o repertório absolutamente eclético desse disco, impossível. 

Tem desde uma releitura linda de "Goodnight Irene" de Leadbelly até uma curiosa gravação do reggae "Love Overdue" de Gregory Isaacs, passando por baladas magníficas -- “Suspicious”, “Just a Gift”, “Illusion” -- e por rocks impecáveis -- “Trouble”, “Amnesia”, “Something for Nothing”, “Substantial Damage”, “Heartstopper” --, além de alguns blues e outros números que, de tão híbridos, chegam a ser difíceis de classificar. 

Rola de tudo nas 15 faixas de "Crosseyed Heart". E é tudo um imenso prazer. E não poderia ser diferente em se tratando de um soul survivor como Keith Richards. 

Acreditem: ninguém ostenta um coração vesgo assim, à toa.



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quarta-feira, outubro 28, 2015

2 OU 3 COISAS SOBRE "STILL GOT THAT HUNGER", NOVO LP DOS VETERANÍSSIMOS ZOMBIES

por Chico Marques


Dizer que a música dos Zombies sempre esteve muito à frente do seu tempo equivale a chover no molhado. 

Quando o grupo surgiu num subúrbio londrino em 1961, não havia nada remotamente semelhante a eles em toda a Inglaterra. O piano e o órgão Hammond B-3 bem jazzísticos de Rod Argent pareciam ter sido feitos sob medida para emoldurar a voz intensa e cristalina de Colin Blunstone. E a alquimia resultante disso gerou logo de cara singles curiosos como “She´s Not There” e “Tell Her No” – que, por mais estranhos que fossem para a época, conseguiram pegar carona na British Invasion e acabaram emplacando nas paradas americanas, mesmo tendo passado quase despercebidos nas paradas inglesas. 

A maldição dos Zombies é que eles não conseguiam ser uma banda de singles. Eram arrojados demais para o hit parade britânico. Deram o azar de surgir numa época em que havia a obrigação de emplacar singles nas paradas para só então poder realizar um LP.



Então, depois de uma série de singles que infelizmente não emplacaram nas paradas, os Zombies acabaram descartados pela Decca Records. Rod Argent e Colin Blunstone, desanimados, reuniram os membros da banda e decidiram que gravariam só mais um LP. Assinaram um contrato de um disco só com a Columbia, que repassou para eles uma verba quase ridícula, que os impedia até de contratar músicos adicionais para o projeto -- tanto que Argent teve que emular os arranjos da orquestra num mellotron, algo inédito na época. 

O descaso da Columbia para com eles foi tamanho que ninguém se preocupou em supervisionar o trabalho dos rapazes. Resultado: sem qualquer compromisso em emplacar um LP de sucesso, os Zombies produziram “Odessey & Oracle” (1967), uma pequena obra prima pop psicodélica, que acabou lançada sem publicidade na Inglaterra e por pouco não teve uma edição americana. Se Al Kooper, fã de banda e também contratado da Columbia, insistindo tanto com o pessoal da gravadora, "Odessey & Oracle" jamais teria cruzado o Atlântico.



Então, o inusitado acontece: quase dois anos após o lançamento do LP na Inglaterra, com todos os membros da banda já trabalhando em outros projetos, alguém na Columbia americana decide lançar “Time Of The Season”, uma das canções de “Odessey & Oracle”, no formato single, e a música explode misteriosamente nas paradas do mundo todo. 

A saia justa dos integrantes dos Zombies foi enorme, já que nenhum dos integrantes originais dos Zombies pretendia voltar atrás na decisão de aposentar a banda. Rod Argent já tinha montado o Argent, banda progressiva de muito sucesso nos anos 70, e Colin Blunstone estava lançando seu primeiro disco solo. Pela primeira vez na história da música popular, uma banda chegava ao seu apogeu dois anos depois de ter encerrado carreira.



Nos anos 1980 e 1990, Rod Argent e Colin Blunstone voltaram a contracenar em diversas ocasiões. Argent firmou-se como produtor de sucesso, ajudando a viabilizar as carreiras de vários artistas ascendentes, como Tanita Tikaram e Jules Shear, enquanto Blunstone seguiu com LPs solo sempre muito bem recebidos por crítica e público. 

Até que, em 2000, inventaram de gravar um disco juntos. E esse disco fluiu tão bem que os dois, saudosos dos velhos tempos, decidiram ressucitar os Zombies para uma pequena tournée de 6 datas. Que acabou durando mais de 10 anos, num sinal claro de que a sintonia entre os dois velhos parceiros permanecera inabalada depois de tantos anos.



Foi quando Rod Argent e Colin Blunstone tomaram coragem para lançar um LP repleto de canções inéditas , que eles andaram testando ao vivo nos shows. “Breathe Out, Breath In” (2010) foi saudado pela crítica e pelo público cativo da banda como um disco impecável, de altíssimo gabarito artístico, que não pretendia em momento algum atualizar a sonoridade dos Zombies e muito menos recomeçar de onde “Odessey & Oracle” parou. 

Na verdade, funcionava como um registro de como Argent e Blumstone pensam e agem musicalmente nos dias de hoje. Não é nenhum exagero afirmar que desde “Before We Were So Rudely Interrupted” (1977), dos Animals, não se via um LP de retorno de uma banda clássica tão honesto e íntegro quanto este.



Agora, cinco anos mais tarde, a história se repete.

E os Zombies retornam com um novo álbum de canções inéditas chamado apropriadamente "Still Got That Hunger". É um LP menos replexivo que o anterior e mais "straight forward", com muitas guitarras gritando o tempo todo e um repertório menos calcado em baladas. O foco principal aqui é no blues acelerado, que, de certa forma, remete mais à sonoridade do grupo Argent -- que Rod Argent comandou nos Anos 70, com muito sucesso -- , do que propriamente ao som tradicional dos Zombies. 

A capa lembra "Odessey & Oracle", e deixa no ar a idéia de que se os Zombies não tivessem encerrado em 1968, provavelmente teriam seguido em frente com uma levada musical bastante semelhante à essa praticada neste disco. Das dez canções que compõem o disco, apenas uma, "I Want You Back Again", é regravação -- bem original, diga-se de passagem -- de um número clássico da banda de 1965. 

Claro que todas as outras nove são marcantes, cada uma à sua maneira. Eu, pessoalmente, fiquei encantado com as baladas pop jazzísticas "And We Were Young Again", "Chasing The Past", ambas excelentes. "New York" não fica atrás: trata-se de uma saudação à cidade, com um relato curioso da primeira vez em que Rod e Colin visitaram a cidade nos Anos 6O e assistiram a uma apresentação de Aretha Franklin. saindo completamente encantados com tudo o que a cidade lhes proporcionou e, de certa forma, lhes ensinou. 

Todas as outras canções são, acima de tudo, eficientes e bem posicionadas na sequência do disco. São canções do tipo que gruda e não sai mais do ouvido. E o mais curioso é que todas parecem ter sido arranjadas da maneira mais descomplicada possível, para poderem ser tocadas na estrada sem maiores problemas.



Definitivamente, não se faz mais compositores como Rod Argent. Quebraram a forma. Ele permanece um compositor, arranjador e pianista espetacular, sempre imaginativo ao extremo, referência fundamental na formação musical de craques como Donald Fagen (Steely Dan) e Jay Ferguson (Spirit, Jo Jo Gunne). 

Quanto a Colin Blunstone, ele permanece o mesmo grande cantor com voz de veludo de sempre. Pode parecer absurdo o que vou dizer agora, mas ele canta melhor hoje, com meio século de carreira nas costas, do que cantava em 1967, quando gravou "Time Of The Season".

Aliás, é bom frisar que tanto Rod Argent quanto Colin Blunstone acabam de completar 70 anos de idade extremamente bem vividos. Juntos, formam uma das parcerias musicais mais criativas e mais longevas da história do rock and roll. 

Assim, só nos resta desejar que os Zombies continuem assim por mais quanto tempo ainda for possível. E nunca deixem de eventualmente presentear a si próprios -- e a nós também, claro -- com discos deliciosos como esse "Still Got That Hunger".

Quem viu The Zombies ao vivo este ano no Festival South By Southwest em Austin, Texas, ficou maravilhado com o poder de fogo da banda. 

A foto abaixo foi tirada no show, e, de certa forma, diz tudo. 



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domingo, outubro 25, 2015

2 OU 3 COISAS SOBRE "THE SWEET PRETTY THINGS ARE IN BED NOW, OF COURSE", NOVO LP DOS LENDÁRIOS PRETTY THINGS

por Chico Marques


Não sei se é o caso de dizer que os Pretty Things são uma das bandas mais pé frio da história do rock britânico. Mas é inegável que desde que surgiram em meados dos Anos 60, em discos muito bons gravados para a DECCA Records -- que, diga-se de passagem, os contratou por recomendação de Mick Jagger e Keith Richards --, seus integrantes nunca receberam o reconhecimento merecido e, estranhamente, perderam o bonde da British Invasion, permanecendo ilustres desconhecidos para o público americano enquanto bandas inexpressivas como Gerry and the Pacemakers e The Merseybeats emplacavam um single atrás do outro nas paradas da Billboard e na Cash Box.
  
Sempre sob o comando da dupla Phil May e Dick Taylor, o som dos Pretty Things era meio truculento no início, calcado nos blues mais ou menos como os Rolling Stones, mais muito mais rude e autosuficientes do que Jagger e Richards conseguiam ser então. O marketing pessoal da banda era muito estranho, parecia apostar na contramão de tudo o que dava certo naquele momento. Os cabelos dos integrantes dos Pretty Things tinham que ser obrigatoriamente mais longos que os das bandas concorrentes, e a aparência deles todos nas fotos enviadas para a Imprensa era cuidadosamente desleixada.



Apesar de venderem pouco, os discos dos Pretty Things eram bons demais para ser ignorados. Daí, acabaram abraçados por segmentos do público europeu, o que fez deles uma das primeiras cult-bands de que se tem notícia. Com público cativo, ganharam autonomia artística das gravadoras por onde passaram, que -- talvez por não se interessarem muito no trabalho deles, permitiram que eles apostassem em conceitos complicados em LPs como 'Emotions" -- que trazia canções com uma levada mais R&B, onde a banda vinha acompanhada por uma orquestra --, passando pelo emblemático "S F Sorrow" -- um disco conceitual psicodélico que é considerado por alguns críticos como a "primeira ópera rock", já que foi gravado dois anos antes das investidas dos Kinks e do Who neste sub-gênero -- até chegar á obra-prima "Parachutes", um dosmelhores e mais vitais discos gravados por uma banda de rock britânico em todos os tempos.

A falta de reconhecimento de um público mais amplo, que não incomodava aos Pretty Things até a virada dos Anos 60 para os Anos 70, de repente passou a incomodar. Até os Kinks, que eram a banda mais inglesa de todas da cena da época, conseguira emplacar nos Estados Unidos. Bandas novas de heavy rock como o Led Zeppelin, o Black Sabbath e o Deep Purple saíam do anonimato direto para o estrelato internacional depois de tournées pelos Estados Unidos. Só eles, mais uma vez, estavam de fora da jogada. 

Foi quando começaram a simplificar as coisas e a gravar discos menos conceituais e de apelo mais imediato, como "Freeway Madness". Resultado: acabaram contratados pelo selo Swan Song, do Led Zeppelin, juntamente com a recém-formada superbanda Bad Company, dispondo de todo o poder de fogo promocional da WEA. E então, através dos ótimos "Silk Torpedo" e "Savage Eye", a América -- e de quebra o resto do Planeta Terra --  finalmente tomou conhecimento da existência do ótimo trabalho dos já veteranos -- com dez anos de carreira nas costas -- The Pretty Things.


  
Mas com o estrelato vieram os desentendimentos cada vez mais intensos e frequentes. Então, na virada para os Anos 80, depois de um disco de triste memória onde tentam se situar na new wave, sem sucesso, os Pretty Things encerraram atividades. Seus integrantes sumiram do mapa e permaneceram distantes da cena musical por mais de 25 anos. 

Só em 2005 eles peitaram um retorno para uma tournée comemorativa de 40 anos de surgimento da banda, que tinha como função inicial apenas dar um reforço no caixa dos integrantes da banda, mas acabou crescendo muito além disso. Foi quando descobriram que o trabalho dos Pretty Things continuava relevante, e que ainda havia fogo sob as cinzas. 

Daí, gravaram um bom disco de retorno, "Balboa Island", mesclando novas canções com covers de favoritos da banda. Não foi exatamente um sucesso -- nem de crítica, nem de público. Agradou aos fãs de sempre. Mas serviu para apresentar o som da banda a um novo público que era jovem demais para tê-los conhecido nos Anos 60 ou nos Anos 70.



Pois bem: este ano os Pretty Things comemoram 50 anos de carreira com uma nova tournée e um novo disco. A tournée vai ser curta, até porque a saúde de Phil May inspira cuidados. Ele sofre de complicações pulmonares seríssimas, consequência de muitos e muitos anos de "heavy smoking" e de uma vida descuidada demais.

Mas no disco novo, os Pretty Things definitivamente não negam fogo em momento algum, e brindam seus admiradores com 10 novas canções gravadas ao vivo no 811 Studios em Londres, usando equipamento analógico desde a gravação até a mixagem, e dispensando overdubs e outros truques de pós-produção cada vez mais comuns e ao alcance do orçamento de qualquer produção fonográfica.



O nome do disco é muito divertido: "The Sweet Pretty Things (Are In Bed Now, Of Course)". 

É o 12º álbum de carreira da banda. 

Soa um pouco como os Pretty Things nos Anos 6O e um pouco como os Pretty Things nos Anos 70. Mas a personalidade musical da banda se impõe no trabalho, fazendo com que o disco soe absolutamente moderno e absolutamente atemporal do início ao fim.

É um disco muito bem concebido e muito bem realizado. Contém 9 inéditas e um ótimo cover dos Byrds, "Renaissance Fair", numa releitura mais suja, mas com vocais tão harmoniosos quanto a versão original. É um prazer ver uma banda veterana tocando e cantando com tanto "gusto". 

A única coisa que realmente incomoda um pouco em "The Sweet Pretty Things (Are In Bed Now, Of Course)" é a sensação de que este é um trabalho de despedida. 

Se isso realmente proceder, vai ser uma pena. 

Mas, por outro lado, ninguém vai poder acusar os Pretty Things de não terem sido relevantes, criativos e cheio de energia até o final.

Desde já, um dos melhores e mais dignos discos lançados este ano



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terça-feira, outubro 06, 2015

2 OU 3 COISAS SOBRE "CRADLE TO THE GRAVE", LP DE RETORNO DO SQUEEZE, COM CHRIS DIFFORD E GLENN TILBROOK DE VOLTA À VELHA FORMA

por Chico Marques


Só quem acompanhou de perto o impacto da separação da dupla de compositores John Lennon & Paul McCartney no final dos anos 60 tem noção do quanto aquilo calou fundo no imaginário da imprensa musical inglesa. 

Nos primeiros anos da década de 70, jornais como o Melody Maker e o New Musical Express não cansavam de tentar encontrar em qualquer nova dupla de compositores que surgisse na cena musical pop inglesa os prováveis sucessores de Lennon & McCartney.

E apesar da dupla Elton John e Bernie Taupin ser a aposta mais óbvia e certeira, havia um problema sério com os dois: eles não faziam parte de uma banda. Para substituir os dois Beatles, a Imprensa Musical da boa e velha Inglaterra fazia questão de dois bandmates com aquele mesmo alto padrão de excelência. Não iria ser nada fácil.

Daí, apostaram as fichas na ótima dupla de compositores Eric Stewart e Graham Gouldman, do grupo 10cc. Com isso, catapultaram o trabalho dos dois -- que era extremamente bom, mas obviamente não tão bom quanto o dos dois Beatles -- a um patamar onde nunca conseguiram se situar direito.


Alguns anos se passaram e a velha obsessão da Imprensa Musical Inglesa apontou para a promissora dupla de compositores Chris Difford e Glenn Tilbrook, que integrava o Squeeze -- sem dúvida, o grupo pop mais importante, mais consistente e mais influenciado pelos Beatles e pelos Kinks da cena post-punk. 

Para o Squeeze, a comparação com Lennon & McCartney foi mais do que oportuna, e ajudou a banda a sedimentar seu caminho através de um mercado que era meio hostil com bandas que não tivessem uma atitude de ruptura. Então, entre 1988 e 1999, o Squeeze gravou nada menos que 14 grandes discos e dezenas de singles de sucesso. Entre eles: "Take Me I'm Yours", "Up the Junction", "Another Nail in My Heart," "Pulling Mussels (From the Shell)," "Tempted" e "Black Coffee In Bed". O hoje famoso pianista e apresentador da BBC2 Jools Holland fez parte da banda enre 1974 e 1980, nos anos iniciais da banda.  

O Squeeze foi uma das bandas precursoras do britpop, e até soube tirar algum proveito de sua influência sobre novas bandas bem-sucedidas, como o Blue e o Oasis. Mas seus integrantes nunca esconderam sua decepção por nunca terem conseguido emplacar nos Estados Unidos o mesmo sucesso que faziam na Inglaterra.


Chris Difford e Glenn Tilbrook vem seguindo carreiras solo relativamente bem-sucedidas desde a virada do milênio. De tempos em tempos, se reunem para fazer tournées juntos. Ou como dupla, ou com o Squeeze reunido. 

Entre 2009 e 2010, parecia que a banda iria voltar de verdade. Reuniram-se para uma longa tournée mundial e até voltaram a compor juntos. Mas não conseguiram produzir canções em número suficiente para um novo disco do Squeeze na ocasião. 

No último inverno, no entanto, Chris Difford e Glenn Tilbrook se reuniram para combinar uma nova tournée para 2015, e, de quebra, trataram de compor mais algumas canções para juntar às outras que estavam prontas há cinco anos.


São essas 12 canções que compõem "Cradle to the Grave" (um lançamento Virgin-EMI, sem previsão para o Brasil), esse grande disco de retorno do Squeeze, que quebra um jejum de 17 anos desde o ultimo álbum de inéditas da banda, "Domino", e não corre o menor risco de decepcionar os fãs do grupo. 

É um disco curto, com 44 minutos de duração, seguindo na mesma medida e no mesmo tom dos LPs que a banda gravava nos Anos 80, provando por A mais B que a alquimia entre eles permanece intacta depois de todos esses anos.

Em suas carreiras solo, tanto Chris Difford quanto Glenn Tilbrook vivem testando saídas musicais bem diferentes do som do Squeeze. Mas sempre que unem forças num projeto em comum, eles fazem questão de simplesmente deixar a velha parceria fluir da mesma maneira como acontecia lá atrás.


Pois em "Cradle to the Grave" eles acertam na mosca com 12 canções atemporais completamente impregnadas com a personalidade musical deliciosa da banda. Produzido por Tilbrook e Laurie Latham, o disco foi gravado em poucos dias no 45 RPM Studios em Charlton, Inglaterra. 

A formação atual do Squeeze traz, além de Tilbrook e Difford nos vocais e nas guitarras, Simon Hanson na bateria, Stephen Large nos teclados e Lucy Shaw e John Bentley se alternando nos contrabaixos, além de alguns músicos convidados.


Todas as canções de "Cradle to the Grave" são deliciosas, o conjunto do álbum é extremamente equilibrado, e não é nenhum exagero afirmar que este talvez seja o melhor disco do Squeeze desde "East Side Story" (1981). Tudo dá certo aqui. E todo o prazer que eles proporcionam ao ouvinte soa absolutamente genuíno o tempo todo. 

2015 tem sido um ano bom para bandas clássicas gravarem discos de retorno relevantes: The Pretty Things, The Zombies e Graham Parker & The Rumour acabam de lançar ótimas coleções de canções inéditas. 

Estava mais do que na hora do Squeeze se juntar a eles.

Pois sejam bem-vindos.




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sábado, outubro 03, 2015

2 OU 3 COISAS SOBRE "FAST FORWARD", NOVO LP DO GENIAL JOE JACKSON

por Chico Marques


Desde o final dos anos 70, o público se acostumou a sempre esperar o inesperado de Joe Jackson.

Pianista, cantor e compositor, esse inglês de Burton-upon-Trent, dono de um background musical invejável, começou a veu companheiros de geração como Elvis Costello e Graham Parker se afirmarem na cena post-punk com blends diversos de pop e rock com muita ironia e uma boa contundência meio raivosa, e se perguntou: "Se eles podem, porque não eu?"

Então, preparou um repertório bem no tom daqueles tempos, montou sua Joe Jackson Band com alguns músicos amigos, levou algumas demos com algumas composições para a A&M Records e rapidamente foi contratado pelo selo, onde gravou logo de cara dois LPs muito divertidos sob a supervisão do produtor David Kershenbaum.


Obteve sucesso internacional imediato, que lhe rendeu uma invejável autonomia de trabalho na gravadora. Graças a isso, Joe deu início a sua longa série de aventuras musicais pelo pop classudo ("Night & Day"), pelo cool jazz ("Body & Soul"), pelo latin jazz ("Beat Crazy") e pela world music ("Big World"), com mergulhos cada vez mais profundos nas mais diversas modalidades da música popular americana e até algumas incursões no território da música erudita.

Toda essa diversidade musical, no entanto, fez de Joe Jackson um artista difícil de classificar, e sua sobrevida no mercado só foi possível graças a um público bastante fiel, que sempre aplaude sem restrições qualquer nova aventura musical que ele se disponha a trilhar. Mas é um público que, infelizmente, não se expande há anos.



"Fast Forward" (um lançamento earMusic, sem previsão para o Brasil) é o primeiro disco de Joe Jackson com material próprio desde "Rain", de 2008, e chega sinalizando claramente que, dessa vez, ele decidiu facilitar as coisas para permitir que suas canções atinjam um público maior que o habitual. 

É um trabalho curioso, com 16 novas canções, todas sobre a vida moderna e com temas ligados aos dias de hoje. Quatro delas foram gravadas gravadas em Nova York, com o suporte de músicos de jazz como Bill Frisell e Brian Blade. Outras quatro foram gravadas em New Orleans, com integrantes do grupo Galactic. Outras quatro em Berlin, ao lado de Greg Cohen e Earl Harvin, e mais quatro em Amsterdam, com Stefan Kruger e Stefan Schmid. 

Cada um desses lugares e cada um desses times de músicos forneceu o setting adequado para que Joe Jackson pudesse desfilar sua ironia implacável e seu bom humor contagiante. É como se para ele, neste momento, fosse necessário olhar para o mundo e para a vida moderna a partir de vários pontos diferentes do globo para poder ver com mais clareza os tempos duvidosos em que vivemos. 

Jackson sempre foi bom nessa brincadeira de "outside looking in". A novidade aqui é o tom da brincadeira, um pouco mais incisivo do que suas abordagens anteriores sobre temas semelhantes. Com certeza, tem gente que não vai gostar de "Junkie Diva", um puxão de orelhas em Amy Winehouse um tanto quanto inoportuno, ou do clima de cabaré de algumas faixas gravadas na Alemanha, meio arrastado e desnecessariamente pretensioso em termos musicais.



Mas, no geral, o que temos em "Fast Forward" é o bom e velho Joe Jackson se renovando e buscando uma espécie de rejuvenecimento em canções um pouco mais verborrágicas que o seu habitual, mas ainda assim muito certeiras.

Em "Fast Forward", Jackson faz o que sabe fazer melhor: canções pop classudas. 

De um tipo que só ele sabe fazer. 

Sem se submeter a nenhum grande desafio artístico que possa afastar seu público de seu trabalho.

Parece que Joe Jackson finalmente entendeu que o mundo atual, que ele contempla tão brilhantemente neste "Fast Forward", exige talento e clareza de intenções. 




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