Mostrando postagens com marcador Allen Toussaint. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Allen Toussaint. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, maio 21, 2012

JOAN OSBORNE MERGULHA NAS ÁGUAS PROFUNDAS DO BLUES E DO RHYTHM & BLUES



Em 1995, quando Joan Osborne explodiu na cena musical com seu álbum “Relish” e o hit mundial “One Of Us”, pouca gente prestou atenção a uma releitura vigorosa de um blues clássico de Sonny Boy Williamson, “Help Me”, perdida entre as canções que compunham o repertório do disco, que fazia um contraponto curioso ao tom “americana” predominante.

Joan achou por bem manter esse mesmo tom nos dois discos que ela gravou a seguir – tão bons e afirmativos, mas infelizmente, não tão bem sucedidos quanto “Relish”.

Sempre no meio do repertório desses discos, um ou outro blues muito bem escolhido repetia aquela mesma magia de "Help Me", revelando um conhecimento de causa insuspeito e uma maestria impressionante no gênero.

Até que, um belo dia, essa nativa do Kentucky radicada em Nova York percebeu que estava perdendo tempo precioso de sua carreira só molhando o pé na margem e não mergulhando de cabeça no rio.

A partir daí, já na condição de artista independente, começou a focar seus discos no blues e no rhythm & blues. Paralelamente a isso, enveredou pela produção e foi chamada para viabilizar discos de artistas de blues amigos, como os lendários Holmes Brothers. Não sossegou enquanto não encontrou nesses artistas com quem trabalhou as saídas diferenciadas que faltavam para tornar seu trabalho ainda mais especial.


“Bring It On Home” é o disco mais intenso que Joan Osborne grava desde essa tomada de posição mais radical em sua carreira.

É uma coleção de números nada óbvios de blues, rhythm and blues e soul music, onde revela toda a sua versatilidade como cantora, mesclando números clássicos como “Shake Your Hips” de Slim Harpo ou “I Want To Be Loved” de Muddy Waters, com preciosidades soul como “Champagne & Wine” de Otis Redding e “The Same Love That Made Me Laugh” de Bill Withers.

Isso para não mencionar a versão fulminante para “I Don´t Need No Doctor”, do repertório de Ray Charles, que abre o disco de forma retumbante, e a releitura inspiradíssima para “Broken Wing”, de John Mayall, de uma delicadeza à toda prova.

“Bring It On Home” traz participações especialíssimas de amigos como Allen Toussaint e Jimmy Vivino -- além dos Holmes Brothers nos vocais em várias faixas --, contracenando com uma banda de apoio afiada e sempre a postos para estender o tapete para que a voz de Joan revele todas as nuances possíveis em um álbum que prima pelo colorido musical.
São tantos os desafios que Joan Osborne teve que encarar para conseguir seguir adiante com sua carreira após “Relish” que não dá para não se impressionar com a tranquilidade com que faz uso de seu enorme talento como cantora e band leader.

A única falha deste “Bring It On Home” – se é que isso pode ser considerado uma falha -- é não privilegiar o lado compositora de Joan Osborne. Mas isso ela conserta oportunamente. O mais difícil ela já fez -- e fez com maestria -- e é isso o que realmente importa.


INFO:
http://www.allmusic.com/artist/joan-osborne-p143261/discography

DISCOGRAFIA:
http://www.allmusic.com/artist/joan-osborne-p143261/biography

WEBSITE OFICIAL:
http://www.joanosborne.com/

AMOSTRAS GRÁTIS:
 

terça-feira, abril 26, 2011

HUGH LAURIE E MARCIA BALL LEVAM A MÚSICA DE NEW ORLEANS PARA UM PÚBLICO MAIS AMPLO (por Chico Marques)


Pode até parecer exagero, mas certamente não é absurdo dizer que a música da região de New Orleans fez mais amigos pelo mundo afora nos últimos 50 anos do que em território americano. A cena do blues britânico, por exemplo, deve tanto a músicos do Estado da Louisiana -- como o gaitista Slim Harpo e guitarristas como Pee Wee Crayton e Guitar Slim – quanto aos grandes medalhões do gênero em Memphis e Chicago. A cena musical caribenha não seria o que é hoje se jamais tivesse tomado contato num determinado momento com o swing contagiante de Earl King, Snooks Eaglin e Fats Domino. E o jazz eletrificado de Miles Davis e Cia. só escapou dos muitos becos sem saída surgidos na primeira metade da década de 1970 porque bebeu na fonte inesgotável de ritmos e cores musicais que a Crescent City – apelido tradicional de New Orleans -- sempre ostentou.

Como bem notou o saudoso crítico de jazz do The New York Times, Robert Palmer, apesar de New Orleans ficar bem na foz do Rio Mississipi, o blues da Louisiana é um primo meio distante do blues da região do Delta, onde o gênero teria nascido. Sua afinidade maior sempre foi com o blues de Memphis e Kansas City. O fato é que a música que vem do “melting pot” de New Orleans descende do jazz, e é muito marcada tanto pelos ritmos africanos que eram praticados em Congo Square quanto pelo piano sempre afinado com tubas, trombones, trumpetes e saxofones. Na Louisiana -- e só lá -- quem toca guitarra ou harmônica é obrigado a fugir da musicalidade rudimentar do Delta do Mississipi para buscar harmonias mais complexas -- sob o risco de ficar desenturmado musicalmente.


O blues da Louisiana se mesclou muito facilmente com o jazz e o rhythm & blues, e isso sempre atrapalhou a classificação das diversas modalidades musicais da cidade nas paradas de sucesso nacionais. Nos anos áureos do rock and roll, ninguém sabia dizer ao certo se artistas como Earl King e Fats Domino podiam ser classificados como tal. Na dúvida, os dois acabaram preteridos. No auge do sucesso de Aretha Franklin e Otis Redding, ninguém sabia dizer ao certo se Irmã Thomas e Allen Toussaint também eram artistas soul. Na dúvida, também ficaram de lado. Só na explosão funk dos anos 70 não houve dúvidas: os veteranos The Meters e os emergentes The Neville Brothers eram o que havia de melhor e mais representativo no gênero. Daí em diante, nunca mais a música de New Orleans ficou fora do mapa musical pop americano.

Se somarmos isso à consolidação do New Orleans Jazz & Heritage Festival como um grande evento cultural internacional ao longo dos últimos 25 anos, e à desistência do pessoal da revista Billboard em fazer a música da cidade caber em nomenclaturas pouco adequadas e sempre desconfortáveis, podemos entender o prestígio artístico que o Estado da Louisiana ostenta atualmente e o fascínio que desperta em gente no mundo inteiro.

Que o digam alguns forasteiros ilustres, como o inglês Hugh Laurie e a texana Márcia Ball.


Hugh Laurie é um admirador incondicional da música de New Orleans há muitos anos. Todo mundo o conhece como o idiossincrático Dr. Gregory House do seriado de TV “House MD”, mas poucos sabem que ele começou sua carreira como músico e comediante na BBC-TV, onde fez por mais de dez anos um show de muito sucesso ao lado de seu grande amigo e padrinho artístico Stephen Fry. Nascido em Oxford, em 11 de Junho de 1969, Hugh Laurie trocou seu sotaque da Velha Inglaterra pelo da Nova Inglaterra, e foi tentar a sorte no cinema americano, mudando de mala e cuia para Los Angeles. Depois de alguns filmes infantis, e outros que quase ninguém viu, deixou o cinema de lado para tentar a sorte na telinha. Hoje é o ator mais bem pago da TV americana. Mais até que o ruidoso Charlie Sheen.

Fiel ao espírito que fez dele um artista completo na saudosa dobradinha com Stephen Fry, Hugh Laurie nunca deixou a música sair de sua vida artística. Insistiu com os produtores de “House MD” para que mantivessem num canto do apartamento do turbulento doutor um piano meia cauda e algumas guitarras e violões pendurados na parede. Vez ou outra, quando não está assistindo corridas de Monster Trucks ou seriados médicos de quinta categoria, o Dr. House sai tocando algum dos instrumentos em sua sala de estar. E como essas intervenções musicais sempre tiveram uma boa acolhida do público, não foi difícil convencer os executivos da Warner Bros Records a contratá-lo para gravar.


Daí nasceu “Let Them Talk”, seu LP de estréia, um mergulho fascinante na história do blues e do rhythm & blues de New Orleans. Produzido pelo talentosíssimo Joe Henry com apoio de alguns dos melhores músicos de estúdio do extremo sul dos Estados Unidos, Laurie abre seu recital bluesy com uma versão instrumental ao piano da centenária “St. James Infirmary”, para em seguida dar panorâmicas (não necessariamente cronológicas) na diversidade musical da cidade ao longo de todo o Século 20. "Let Them Talk" lembra um pouco o projeto “Going Back To New Orleans”, de Dr. John, mas não é tão pretensioso quanto. Pretende – e consegue -- ser um trabalho de blues honesto, mas também denso, climático, aventuresco, ainda que sempre em tom menor – recurso que facilita a colocação da voz pouco potente, mas muito expressiva, de Laurie. Uma bela estréia, que conta com participações muito inspiradas de Dr. John, Allen Toussaint, Irmã Thomas e Tom Jones.


Já Márcia Ball é um caso à parte. Nascida em 20 de Março de 1949 na cidade de Orange -- epicentro do chamado “triângulo texano”, que incluí parte do Texas e parte da Louisiana, de onde vieram grandes figuras como Janis Joplin, Johnny & Edgar Winter, Clifton Chenier e Lonnie Brooks --, ela aprendeu a tocar piano ainda menina, e aos poucos foi dominando os principais estilos do blues: o barrelhouse, o stride e, claro, o boogie woogie. Marcia Ball nunca quis ser propriamente uma artista de blues. Sua música é deliciosamente híbrida e tipicamente de New Orleans. Cada um dos LPs que ela gravou ao longo dos últimos 30 anos é uma aventura musical diferente, onde ela sempre exercita suas habilidades como pianista, compositora, cantora e band leader.



Seu novo trabalho para a Alligator Records, “Roadside Attractions”, não é uma exceção à regra. Com uma banda afiada e um repertório cheio de atitude e sem altos e baixos, Márcia Ball não deixa dúvidas de que, aos 63 anos de idade, continua esbanjando jovialidade e se renovando ano após ano. Quem a viu ao vivo em São Paulo com sua banda dois anos atrás sabe exatamente do que estou falando. Podem ter certeza que o Ball de seu sobrenome não está lá à toa.


Felizmente, foi-se o tempo em que grandes artistas de New Orleans e outros centros musicais do sul dos Estados Unidos tinham que se mudar para a Europa para conseguir reconhecimento artístico e cachês decentes. Hoje é possível para uma artista como Márcia Ball, por exemplo, fixar residência em Austin, Texas, e circular boa parte do ano só pelo circuito de nightclubs e roadhouses americanos e canadenses, com casa cheia todas as noites. Assim como também é possível que um grande astro do horário nobre da TV americana como Hugh Laurie possa incorporar seu gênero musical favorito -- ainda que pouco popular -- às preferências pessoais de seu personagem mundialmente famoso, e levar isso ao grande público sem maiores traumas.

Para todos aqueles que ainda hoje acham que blues é música de gueto -- de interesse apenas para folcloristas e arqueólogos musicais --, aí estão Márcia Ball e Hugh Laurie para provar justamente o contrário.


HIGHLIGHTS
HUGH LAURIE - "LET THEM TALK"





ENTREVISTA
HUGH LAURIE



HIGHLIGHTS
MARCIA BALL - "ROADSIDE ATTRACTIONS"