sexta-feira, junho 02, 2006

Sidney Magal Conquista A Elite Bem-Pagante do Brasil (por Ivan Marsiglia para TRIP)


“Quero vê-la sorrir,/ quero vê-la cantar,/ quero ver o seu corpo/ dançar sem parar.” Quem nunca se divertiu ao som desses versos não vive no Brasil real. O Brasil que tocava na rádio AM e desfilava na surreal Buzina do Chacrinha, na TV Tupi. Era o fim dos anos 70 e o desbunde era geral — seja na intelectualizada Tropicália, seja na MBPB, a Música Beeem Popular Brasileira, tachada de “brega”.

A ode a “Sandra Rosa Madalena” vinha embalada nos lábios tremulantes de Sidney de Magalhães, vulgo Sidney Magal, homenzarrão de 1,90 metro e então 85 quilos, que se requebrava em trejeitos de salsa e tourada espanhola. Cigano de araque e carioca sem papo-cabeça da zona sul, Magal fez história no showbizz brasuca. Chegava de Landau e pisava em tapete vermelho para entrar no auditório do Velho Guerreiro — que se esbaldava com seu ídolo predileto, repelindo a barrigadas as fãs ensandecidas que invadiam o palco.

A apoteose do cigano durou até 1980, quando Magal foi sumindo da grande mídia. Reapareceu dez anos depois, pegando carona na onda da lambada com a música “Me Chama Que Eu Vou”, tema da novela Rainha da Sucata. Hoje, com declarados 53 anos (56 segundo um RG encontrado pela revista Veja que ele não desmente nem confirma) e 12 quilos mais gordo, Magal mantém a estampa sem ginástica, plástica nem botox, jura. O revival dos 80 e a moda “trash” catapultaram-no para o público A/B, que antes torcia o nariz para suas caras e bocas.

Se rico não está, mantém um bom patrimônio amealhado nos anos de ouro, dá cerca de 6 shows por mês e acaba de emplacar uma canção na trilha da novela Kubanacan.

Casado há 23 anos e pai de três filhos, Sidney Magal conversou com a TRIP em São Paulo.

TRIP Por que Sidney Magal, de cafona nos anos 70, hoje virou cult?

Sidney Magal Finalmente algumas pessoas começam a entender que eu tinha uma coisa superpopular, mas ao mesmo tempo muito criativa e diferente. Quando apareci, não era aquele cantor com violãozinho e calça jeans. Criei um personagem para mim que foi muito forte, com um repertório de músicas simples, despretensiosas, com mensagens de amor. A Jovem Guarda tinha quinhentos artistas que se comportavam da mesma maneira e a Tropicália, aquela filosofia sempre hippie. Fiz uma coisa mais latina e, ao mesmo tempo, americanizada — isso causava um espanto muito grande. Hoje, quando as pessoas perguntam: “Magal, como você sobrevive sem estourar novos sucessos?”, digo que -é porque não conseguiram nada igual. Existem trinta duplas sertanejas e trinta grupos de pagode iguais, mas não outro Ney Matogrosso nem outro Sidney Magal.


No final dos anos 70, Caetano Veloso declarou que sua música “não dizia nada” para ele e você respondeu: “Os pseudo-intelectuais não ouvem meus discos porque acham que gênios são os que eles assim designaram”. É isso mesmo?

Tenho verdadeira admiração pelo Caetano, inclusive ele me adora, a gente sempre se fala em Salvador. Mas isso é verdade. Por exemplo, o que é o Xandy, do Harmonia do Samba? Um pagodeiro, um cara com estampa, adorado pelas mulheres. Quando Caetano disse que ele era o charme da Bahia, a carreira do Xandy fez isso [aponta para cima]. Virou coqueluche. As pessoas gostam de ser os criadores dos outros. No momento em que as coisas surgem independente da vontade deles, começam a colocar defeitos. Na época, estranhei quando Caetano falou isso porque toda música diz alguma coisa. Se você estiver na roça comendo amendoim com uma menina e ouvir Chitãozinho e Xororó, vai se realizar: “Maravilhoso, não quero rock pauleira agora na minha cabeça”. Música é momento.


Dizem que, nos seus shows, alguns rapazes enciumados te xingavam e sua mãe, dona Sônia, chegava neles e dizia: “Viado por quê? Já foi pra cama com ele?”

[Ri] É, isso acontecia quando ela estava presente. Mas nunca me incomodei com esses caras. Não sou de brigar e trabalho na noite desde 16, 17 anos, no meio de travestis, gays, putas. Aprendi a respeitar as pessoas.

Você já transou com homem?

Não. Mas, na época da euforia, poderia até ter rolado, se fosse uma pessoa que me excitasse. Naturalmente, talvez tenha algum bloqueio de formação. Na minha opinião, todo ser humano é bissexual, a gente só é dirigido e educado para A ou B. Fui cantado por milhares de homens.

E drogas? Você experimentou nesses dias?

Não. Comecei a beber. Cervejinha, vinho... Outras coisas, não tenho coragem. Se você me disser: “Magal, agora que já está maduro, criou seus filhos, vamos ali no cantinho dar uma cheiradinha?”, não vou ter coragem. Sempre fui medroso, cocaína nem pensar.

O mago Paulo Coelho, da Academia Brasileira de Letras, é um dos criadores do Sidney Magal!?

É. O Paulo Coelho fazia versões de músicas latinas para mim. Se você olhar meus discos, tem o nome dele escrito em todo lugar, o que pra mim é motivo de orgulho. Reconheço o talento do Paulo como escritor, apesar de não ter lido nenhum livro dele, te confesso... Que ele me desculpe, mas eu o achava mais autêntico naquela época do que hoje... Imagina a loucura: o cara que foi parceiro de Raul Seixas de repente escreve para Sidney Magal e faz o roteiro do filme Amante Latino [estrelado por Magal em 1979, dirigido por Pedro Rovai]. Seria só pelo dinheiro? Não. Ele estava tentando descobrir o caminho dele.

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