segunda-feira, agosto 27, 2012

OS 4 SHOWS DE ADEUS DE STAN GETZ NO CAFÉ MONTMARTRE, KOPENHAGEN, 1991


Stan Getz foi uma dos maiores galãs da história do jazz. Poucas resistiram aos encantos de seu sax tenor em seus anos de glória. Ele passou o rodo impiedosamente nas mulheres mais interessantes de sua época -- todas elas presas fáceis do ataque manso de seu sopro.

Dono de um estilo sereno e introspectivo demais para a era do bebop, Getz foi um dos pioneiros do cool jazz e foi o maior incentivador da bossa nova nos Estados Unidos através do clássico (e milionário) LP "Getz Gilberto", gravado ao lado de João Gilberto e Tom Jobim, que explodiu nas paradas mundiais com Astrud Gilberto cantando "The Girl From Ipanema".

Mas de sereno e introspectivo, Getz só tinha o sopro. Sua vida era completamente caótica, desde os anos 40, quando se envolveu com heroína. Getz, pouco a pouco, foi virando um junkie pesado. E sempre que tentou controlar sua dependência química pela heroína caiu de cabeça no alcoolismo. Foi parar na cadeia diversas vezes. Sossegou um pouco em 1956, quando casou, virou pai e foi morar em Kopenhagen. Mas poucos anos depois lá estaria ele de volta à estrada, ao álcool, às drogas pesadas e à putaria que ele tanto amava.

O auge de sua carreira foi nos anos sessenta, nos discos impecáveis e nada óbvios que gravou para Norman Granz, da Verve Records, com suas clássicas aventuras bossanovísticas, os duos magistrais com o amigo Bill Evans, e experimentos mainstream com orquestras -- como o belo LP onde interpreta brilhantemente canções de Burt Bacharach, execrado por seus fãs na época, mas considerado hoje um pequeno clássico do jazz crossover.


Em Março de 1991, em Kopenhagen, Getz e seu amigo e pianista Kenny Barron decidiram fazer algumas apresentações em duo no Cafe Montmartre, de cujo palco Getz era habituée há mais de 20 anos.

Tocaram sem baixo e bateria, e se divertiram um bocado em 4 noites bem relaxadas, onde Getz saia completamente sem fôlego após cada número, pois -- só ele sabia disso, então -- estava sofrendo de cancer no fígado e tinha pouco tempo de vida pela frente.

Getz morreu naquele mesmo ano, e logo após sua morte alguns números dessas 4 sessões ao vivo com Kenny Barron foram lançados no álbum duplo "People Time", eleito recentemente pela revista JazzTimes um dos discos mais importantes da história do jazz, e uma despedida emocionante de um dos maiores sax tenores da história do jazz.
Pois bem, a Warner Bros Records decidiu reunir no ano passado a íntegra dessas quatro noites em que Getz e Barron tocaram em duo no Montmartre, e transformou o álbum duplo original de "People Time" em uma caixa com 7 cds, acrescentando às 14 faixas do disco original outras 37.

E essa caixinha preciosa, surpreendentemente, acaba de ser lançada no Brasil.

Além de takes alternativos para o repertório original de "People's Time" foram acrescentadas maravilhas como "Con Alma", "Bouncin' With Bird", "The End Of A Love Affair", "You Stepped Out Of A Dream" e ainda "The Autumn Leaves" and "Wish You Love", em versões nada menos que magníficas. Difícil achar adjetivos menos eloquentes que esses para definir esse grande momento da história do jazz.

Para alguns, essa versão expandida de "People's Time" pode parecer um exagero. E é, com toda a certeza. Mas faz parte das homenagens aos 20 anos de falecimento de Getz -- e, até onde se sabe, nenhum de seus admiradores reclamou desse exagero até agora, muito pelo contrário.


O pessoal da Bossa Nova é muito grato a Stan Getz pelas portas que ele abriu para músicos brasileiros. É sempre bom lembrar que Getz já era um artista consagrado quando aceitou contracenar com todos aqueles ilustres desconhecidos

E mesmo fazendo pequenas cachorradas -- como aumentar o sinal de seu tenor no mix final de "Getz Gilberto", e outros discos gravados em colaboração com outros artistas, sempre sem consultá-los --, Getz conseguiu separar bem o tumulto de sua vida pessoal de sua carreira musical, mantendo sempre um senso de profissionalismo raro no showbiz .

A paz absoluta que emana de "People's Time" é a evidência maior de que Getz estava feliz nessas quatro noites, celebrando a vida e se despedindo dela com galhardia.

E é por essas e outras que "People's Time" funciona como um testamento musical digno desse músico gigantesco e de seu talento assombroso.


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